Senadoras se unem por sanção de PL que pune discriminação salarial contra mulher
Líder da bancada feminina, a senadora Simone Tebet (MDB-MS) disse que o argumento de que a luta pela igualdade no mercado de trabalho prejudica a empregabilidade das mulheres reforça essa desigualdade. "Queremos justiça e respeito", escreveu nas redes sociais, junto com outras hashtags: #trabalhoigualsalarioigual e #desigualdadesalarialtemmulta. Para a senadora, é "economicamente eficiente" que as mulheres tenham direito à igualdade salarial.
Ontem, em sua live semanal, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) sugeriu que arranjar emprego pode se tornar "quase impossível" para as mulheres, caso ele sancione um projeto de lei que amplia a multa contra empresas que praticam discriminação salarial contra trabalhadoras. "Pode ser que o pessoal não contrate, ou contrate menos mulheres, vai ter mais dificuldade ainda", disse ele, sem apresentar dados ou estudos que corroborem essa visão.
O texto foi aprovado pelo Senado no fim de março, após a bancada feminina na Casa ter articulado a votação em defesa da igualdade salarial. Trata-se de uma mudança em relação à regra atual, vigente desde 1999, que condena explicitamente a discriminação por gênero, raça, idade ou situação familiar nas contratações e políticas de remuneração, formação e oportunidades de ascensão profissional, mas prevê punições brandas, entre R$ 547,45 e R$ 805,07. Além disso, o pagamento é devido ao governo, não à trabalhadora lesada pela prática da empresa.
Defensores da igualdade salarial argumentam que a aprovação do projeto é um passo importante para melhorar a representatividade das mulheres no mercado de trabalho. Na pandemia, a taxa de participação das trabalhadoras, que já era inferior à dos homens, caiu a 45,8%. Isso significa que menos da metade das mulheres estão em atividade, seja trabalhando, seja buscando emprego.
A mobilização de hoje também já ganhou adesões das senadoras Kátia Abreu (PP-TO), Eliziane Gama (Cidadania-MA) e Mara Gabrilli (PSDB-SP), e também de senadores, como Paulo Paim (PT-RS). "Mulheres estão cansadas de falta de equidade. Não precisamos de um presidente para perpetuar desigualdades", escreveu Mara Gabrilli. Eliziane, por sua vez, classificou o eventual veto de "retrocesso".
Ontem, Bolsonaro evitou antecipar sua decisão sobre vetar ou sancionar o projeto e pediu que seus espectadores na internet comentassem sobre o que ele deveria fazer. O presidente ressaltou o custo que a iniciativa pode gerar aos empresários se for sancionada e insinuou que as trabalhadoras podem exigir pagamento igual em situações em que "supostamente é a mesma atividade". Por outro lado, ele também disse que pode virar alvo de uma "campanha das mulheres" contra ele e ser "massacrado" caso decida pelo veto.
O presidente ainda lançou o argumento de que "tem lugar em que mulher ganha mais do que homem", apesar de estudos mostrarem que a situação contrária - homens ganhando mais do que mulheres na mesma função - ser comprovadamente mais comum.
Desigualdade
Uma pesquisa publicada no ano passado pelos economistas Beatriz Caroline Ribeiro, Bruno Kawaoka Komatsu e Naercio Menezes Filho, do Insper, comparou a remuneração de trabalhadores segundo gênero, raça, escolaridade e tipo de instituição de ensino frequentada (público ou privada). Um homem branco que concluiu o ensino superior em instituição pública teve média salarial de R$ 7.891,78 entre 2016 e 2019, contra R$ 4.739,64 no caso de mulheres brancas na mesma situação, R$ 4.750,58 de homens pretos e pardos e R$ 3.047,01 de mulheres pretas e pardas.
Em uma análise por ocupação, a equipe do Insper detectou que médicos brancos ganhavam mais que o dobro de médicas brancas. O padrão se repetiu, com diferentes proporções, em outras áreas, como engenharia e arquitetura, professores, administração e ciências sociais. Em geral, a situação da mulher negra é ainda pior em termos de remuneração.
"Se eu veto o projeto, imagina como é que vai ser a campanha das mulheres contra mim. 'Ah machista, eu sabia, ele é contra a mulher, quer que mulher ganhe menos', etecetera, etecetera, etecetera... Se eu sanciono, os empresários vão falar o seguinte: Poxa, pode o que eu estou pagando aqui ser questionado judicialmente, na justiça trabalhista dificilmente o patrão ganha, quase sempre o empregado ou a empregada, no caso, ganha, então... Eu acho que é função diferente, a justiça do trabalho achou que não, é igual. Posso ter uma multa de R$ 200 (mil), R$ 300 (mil), R$ 400 (mil), R$ 1 milhão. Vai quebrar a empresa", disse Bolsonaro na live, ao lado do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles.
Na avaliação do presidente, a sanção do projeto que assegura igualdade salarial pode piorar a condição das mulheres no mercado de trabalho. "É difícil para a mulher arranjar emprego? Sim, é difícil para todo mundo, para a mulher é um pouco mais difícil. Se o emprego (para a mulher) vai ser quase impossível ou não, ou você vai dizer o patrão tem que tomar vergonha na cara e pagar o salário justo... Pode ser que o pessoal não contrate, ou contrate menos mulheres, vai ter mais dificuldade ainda", afirmou.
Ao final de sua fala, Bolsonaro lançou a "enquete" virtual para seus seguidores e pediu respostas até segunda-feira, 26, quando termina o prazo para sanção ou veto do projeto.
A maior igualdade entre homens e mulheres faz parte inclusive do conjunto de boas práticas internacionais reunidas sob o selo ESG, sigla em inglês para ambiente, social e governança. Recentemente, o Tesouro Nacional tornou público seus planos de fazer emissões soberanas com o selo ESG, atraindo dinheiro mais barato de investidores estrangeiros para o País. Entre os indicadores-chave para essa pauta estão participação das mulheres no parlamento (no qual o Brasil tem desempenho pior do que a média de países) e razão entre mulheres e homens na força de trabalho (em que o País se sai melhor, mas ainda abaixo das nações avançadas).
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