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'Eles dizem para esperar e ligar de novo', afirma desempregada acampada na rua

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Imagem: iStock

Adriana Fernandes

Brasília

16/05/2022 08h02Atualizada em 16/05/2022 08h37

Ao lado da Universidade de Brasília, numa das vias que funcionam como um canal de ligação mais rápido entre a Asa Norte e a Esplanada dos Ministérios, moradores de rua se instalaram com barracas à espera de doação de alimentos e acesso aos programas sociais do governo federal.

O acampamento não é novo, e costumava aumentar sempre na época do Natal. Mas cresceu muito e ficou permanente com a pandemia da covid-19 e o aumento da pobreza, na esteira do fim do pagamento do antigo auxílio emergencial - concedido em 2020 e 2021.

O cenário de pobreza e o acúmulo de lixo contrastam com a paisagem de grandes gramados e espaços abertos arborizados, típicos do centro de Brasília.

O lugar reúne famílias com histórias diversas. Há famílias no acampamento que não recebem o Auxílio Brasil, mas têm outras que já recebem benefícios do governo. Têm em comum a decisão de se instalarem ali, em condições precárias, para ter acesso à doação de comida mais rápido e frequente.

De Planaltina de Goiás, município do entorno do Distrito Federal, a desempregada Elaine Vieira dos Santos, 39 anos, está instalada numa das barracas com a filha mais nova, Isabela, de apenas três anos. Com mais quatro filhos, não recebeu todas as parcelas do auxílio emergencial e está esperando pelo seu substituto, o Auxílio Brasil, o programa social do governo que ficou no lugar do Bolsa Família.

"Eles dizem para esperar e ligar de novo", relata ela à reportagem do jornal O Estado de S. Paulo, que esteve no local no sábado colhendo depoimentos. Elaine conta que assistentes sociais já passaram pelo local, mas ela não conseguiu a habilitação até agora.

O sustento que recebe por mês é R$ 250, que o pai de uma das filhas paga. Ao longo do mês, Elaine passa umas semanas e depois retorna à Planaltina de Goiás. A filha caçula, alheia à situação, brinca no lixo com outras crianças, que também vivem no acampamento.

Cadastramento

O caso dela é comum em todo o Brasil, diz a diretora da Rede Brasileira de Renda Básica (RBRB) Paola Carvalho, que nas redes sociais mantém um canal de ligação com a Defensoria Pública para garantir que as famílias que têm direito ao benefício o consigam via decisão judicial.

"Cada município tem seu método de agendamento do Cadastro Único. Em São Paulo, é feito pelo 156. No entanto, as pessoas ligam e não conseguem agendar. A recomendação sempre é ir ligando até que se libere a agenda novamente. Isso leva meses para que se consiga um horário", diz Paola.

Segundo a Rede, é impossível saber a quantidade de pessoas que estão na "fila da fila" esperando para serem atendidas e dar início ao cadastramento inicial que deveria levar à aprovação para receber o Auxílio Brasil.

Na barraca ao lado da de Elaine, a neta da dona Luzia Paes Landin, Bárbara Felix, 22 anos, também tenta ser aceita no Auxílio. Tem duas filhas pequenas, de três e dois anos, e não consegue.

A avó está ali com netos e bisnetos, mas recebe o Benefício de Prestação Continuada (BPC) de um salário para a filha, de 32 anos, que é cadeirante.

"Vez ou outra eles derrubam tudo (o acampamento), mas voltamos de novo", diz Luzia, uma baiana de 69 anos, enquanto penteia o cabelo da filha na cadeira de rodas, com uma boneca nos braços.

Perto dali, outro neto forma com estaca de madeiras um campo de futebol para jogar com os amigos.