Governo precisa ampliar receita em até R$ 150 bi para nova regra ficar de pé, diz Haddad
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou hoje que precisa ampliar a receita do governo em R$ 110 bilhões a R$ 150 bilhões para viabilizar as metas do arcabouço fiscal, a nova regra divulgada na semana passada em substituição ao teto de gastos. Segundo ele, o projeto pode ser enviado ao Congresso apenas na próxima semana.
Para ampliar a arrecadação, o governo vai apresentar inicialmente três medidas para reforçar os cofres: taxação de apostas eletrônicas, com objetivo de arrecadar de R$ 12 bilhões a R$ 15 bilhões por ano; taxação de e-commerces que driblam as regras da Receita Federal, não pagando impostos (o que o ministro chamou de "contrabando", com perdas estimadas de R$ 7 bilhões a R$ 8 bilhões), e não permitir que subvenção a Estados para investimento seja equiparada a custeio - medida que pode render de R$ 85 bilhões a R$ 90 bilhões.
"Entre R$ 110 e 150 bilhões você zera o déficit no ano que vem", afirmou Haddad à GloboNews.
Segundo ele, não é preciso "aumentar e nem criar imposto para atingir esse objetivo". "Basta cobrar de quem não paga", disse.
A proposta de arcabouço fiscal apresentada pelo governo prevê zerar o rombo das contas públicas em 2024 e passar a ter superávits primários (receitas maiores que despesas, sem contar o pagamento dos juros da dívida) a partir de 2025.
Apesar de as equipes técnicas dos ministérios da Fazenda, Planejamento e Orçamento e Casa Civil terem trabalhado durante todo o fim de semana na formatação do texto final da proposta de novo arcabouço fiscal, ele pode ser enviado ao Congresso apenas na próxima semana, segundo Haddad.
O ministro garantiu que a proposta chegará aos parlamentares com medidas para a recuperação das receitas federais.
"As equipes estão por conta disso desde sexta-feira, 31, trabalharam no fim de semana. Como não tem sessão do Congresso nesta semana, vão aproveitar esses dias para calibrar a proposta. Se ficar pronto antes, enviamos até quarta-feira. Se não, mandamos na segunda-feira da semana que vem", afirmou ele.
'Jabutis tributários'
Como antecipou o jornal O Estado de S. Paulo, a caçada do ministro aos "jabutis tributários" para aumentar em até R$ 150 bilhões a arrecadação do governo envolve o fechamento de brechas na legislação usadas pelas empresas e pessoas físicas para pagar menos imposto e um esforço concentrado na defesa das grandes causas no Judiciário que podem reforçar o caixa do governo em caso de vitória da União.
Entre as medidas, o governo considera propor uma mudança na tributação dos fundos exclusivos usados pelos super-ricos para aplicar o seu dinheiro. Nos governos passados, já houve três tentativas frustradas de mudar essa tributação. A Receita Federal é a maior defensora dessa mudança.
Haddad afirmou que o governo já sabia desde seu início que teria que enfrentar "jabutis tributários", que vem trazendo "efeitos desastrosos" à economia brasileira.
Segundo ele, o governo tem sofrido problemas de natureza tributária, e além das derrotas da Receita no Supremo Tribunal - a exemplo da exclusão ICMS da base de cálculo do PIS/Cofins -, há também normas que geram questionamento antes mesmo do Supremo se manifestar.
O ministro listou que, dos R$ 100 bilhões perdidos com a exclusão de ICMS da base de cálculo do PIS/Cofins, R$ 30 bilhões já foram recuperados com medida provisória publicada pelo governo no início do ano. Haddad afirmou que um segundo conjunto de medidas será feito e deve recuperar as perdas com Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido (CSLL).
Outras medidas para correção de distorções foram elencadas pelo ministro, como a arrecadação com tributação sobre jogos de apostas, que deve gerar uma receita de R$ 12 bilhões, ante estimativa preliminar de R$ 6 bilhões.
"Não é justo não tributar atividade que muitas pessoas nem concordam que exista no Brasil", acrescentou. O combate ao "contrabando oficial" também foi citado por Haddad, em referência ao "comércio eletrônico que escamoteia, que se faz passar de remessa de pessoa para pessoa".
O ministro argumenta que a reforma tributária deve trazer para dentro do sistema quem hoje consegue sonegar. "O IVA é muito mais à prova de sonegação do que os impostos de hoje."
De acordo com Haddad, a reforma está prevista para ser votada na Câmara até julho e no Senado até outubro. O ministro defende que o objetivo do texto é sanear um sistema tributário altamente desorganizado, no qual a receita vem sofrendo com reveses multimilionários e não um aumento de alíquota ou criação de novos tributos.
Segundo ele, há outras seis medidas saneadoras que podem entrar em discussão após a reforma. "O arcabouço sugere que dilua um pouco no tempo", disse. "O mais importante é dar um sinal do rumo do que fazer tudo agora e descompensar algo na economia. Se o rumo estiver claro e a autoridade monetária harmonizar com a fiscal, a sociedade brasileira vai crescer mais, pagar menos juros e o Estado estará menos endividado."
Carga tributária
Haddad disse também não ver espaço para o discurso de que será necessário aumentar brutalmente a carga tributária, em resposta à entrevista do ex-presidente do Banco Central, Affonso Celso Pastore, ao Estadão. "Ninguém está pensando nisso, não há espaço nem para discutir isso politicamente", disse.
"Corrigir distorções do sistema tributário deveria ser saudado por um liberal. Um liberal deveria aplaudir acabar com o patrimonialismo", afirmou o ministro.
Haddad ainda citou a MP do Carf. " Brasil é o único país do mundo em que o processo administrativo é contra a Receita, isso é um escândalo. Por que os liberais defendem o que está acontecendo no Carf, no subfaturamento de exportações e paraísos fiscais dentro e fora do Brasil?"
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