IPCA
0,83 Mar.2024
Topo

Viúva de Mandela diz que Brasil lembra África e pede fim da desigualdade

A moçambicana Graça Machel, ativista de direitos humanos e viúva de Nelson Mandela - Divulgação Experience Club/Marcos Mesquita
A moçambicana Graça Machel, ativista de direitos humanos e viúva de Nelson Mandela Imagem: Divulgação Experience Club/Marcos Mesquita

Armando Pereira Filho

Do UOL, em Mata de São João (BA)

08/09/2017 09h53

O Brasil e a África são muito parecidos, para o bem e para o mal, em sua gente amável e também em seus graves problemas sociais de pobreza e violência.

A visão é da moçambicana Graça Machel, 71, ativista de direitos humanos e viúva de dois ex-presidentes africanos: Samora Machel (Moçambique) e Nelson Mandela (África do Sul). É a única mulher a ter sido primeira-dama em dois países diferentes.

"Vim de tão longe, atravessei o Atlântico, mas quando mergulhei na periferia de Salvador, fiquei pensando: 'Será que eu saí mesmo da África, saí de Moçambique?' Os cenários que eu vi são exatamente iguais aos do meu próprio país", disse na quinta-feira (7), durante a conferência de abertura do Fórum CEO Brasil, do Experience Club, na Praia do Forte, município de Mata de São João (BA). Participam do evento cerca de cem presidentes de empresas brasileiras e multinacionais.

Graça pediu que empresários brasileiros façam sua parte para reduzir as diferenças entre ricos e pobres. "É uma responsabilidade histórica de vocês". A ativista também defendeu igualdade de salários e de oportunidade para as mulheres e criticou o fato de haver tão pouca representação feminina na direção de empresas, não só no Brasil, mas no mundo todo.

Ela também falou sobre discriminação contra negros e disse que o Brasil precisa de mais negros no poder, não só na cultura.

Empresários devem reduzir fosso entre ricos e pobres

"O Brasil é uma sociedade muito vibrante, pela mistura da imigração. Mas a desigualdade social aqui é como na África. Há muitos ricos, mas também tem os níveis de pobreza mais degradantes, como em muitos países africanos", declarou Graça.

Ela propôs aos executivos que atuem para mudar essa situação. "Quero sugerir aos homens de negócios do Brasil que voltem o olhar para a realidade em que vocês são agentes de transformação e redução desses altíssimos níveis de desigualdade. Precisa reduzir o fosso entre os que têm muito e os que não têm."

Ela não apresentou uma solução. "Não sei como fazer. Quero deixá-los com essa pergunta."

A ativista defendeu seu ponto dizendo que se trata de dar mais segurança às pessoas e aos negócios, vinculando o crime à injustiça social.

"Com desigualdade social, nem seus negócios serão seguros. Não dá para andar nas ruas sem medo de ser assaltado. Essa violência em grande parte é resultado da desigualdade social."

Para ela, trata-se de um compromisso dos empresários. "Vocês produzem milhões, mas também devem ajudar milhões de pessoas. É uma responsabilidade histórica da qual não podem se escusar. Há que se reverter a situação em que poucos têm muito e muitos têm pouco."

Negros no poder, não só na cultura

Graça apontou que, no Brasil, os negros se destacam bastante na cultura, mas não no poder. Pediu mudanças nisso.

Ela pediu também aos empresários que tenham maior presença nos rumos da política. "Muitos empresários acham que não têm relação com política. Mas eles têm de dialogar com o governo e usar sua força para mudar a sociedade."

Lula e a ajuda para a África

A ativista mencionou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sua relação com a África, destacando a importância de países emergentes se unirem para ter mais força na relação com nações desenvolvidas.

"O Brasil, no tempo de Lula, abriu-se muito para a África, não só no interesse de negócios, mas para quebrar a hegemonia do Norte [países desenvolvidos] sobre o Sul [países emergentes] e fazer uma relação Sul-Sul. O Norte vai ter de baixar um bocadinho a crista e olhar de frente para nós."