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Estudos apontam perda de R$ 1 tri em renúncia fiscal após leilão do pré-sal

Navio Pioneiro de Libra: campo obteve em leilão o equivalente às seis áreas arrematadas na última sexta-feira (27) - Felipe Kateb/Divulgação/Petrobras
Navio Pioneiro de Libra: campo obteve em leilão o equivalente às seis áreas arrematadas na última sexta-feira (27) Imagem: Felipe Kateb/Divulgação/Petrobras

Eduardo Militão

Colaboração para o UOL, em Brasília

31/10/2017 04h00Atualizada em 31/10/2017 11h25

Um conjunto de estudos elaborados pelas Consultorias Legislativa e de Orçamento da Câmara dos Deputados mostra que as regras previstas no leilão da Agência Nacional do Petróleo (ANP), realizado na sexta-feira (27), farão o governo reduzir o retorno na exploração do petróleo em relação à disputa no campo de Libra, ocorrida há quatro anos.

Parte desses recursos ajuda a financiar a educação e a saúde. Paralelamente, uma Medida Provisória já em vigor e prestes a ser votada pelo plenário da Câmara reduz impostos para as petrolíferas até 2040 e geraria renúncia fiscal de R$ 40 bilhões anuais, ou R$ 1 trilhão em 25 anos.

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No caso dos leilões do dia 27, o bônus de assinatura de todos os poços juntos foi menor do que o de Libra, há quatro anos. Ao terminar a disputa, a ANP anunciou ter leiloado seis áreas e arrecadado R$ 6 bilhões, menos da metade do obtido em Libra: R$ 15 bilhões. 

Além disso, o excedente de produção em óleo que deve ser repartido com a União ---e fomentar políticas de educação e saúde-- foi de 41% em Libra. Nos novos leilões, a previsão da ANP variava de 10% a 22%, criticava um dos estudos, produzido pelos consultores legislativos Pedro Garrido e Paulo César Lima, este último ex-engenheiro de exploração da Petrobras. Nas rodadas da última sexta-feira, esse excedente variou de 11%, pago pela Shell e a Total no campo Gato de Mato, em Santos (SP), mas também chegou a 80%, pago pela Petrobras em consórcio com a Repsol e a Shell, no campo no entorno de Sapinhoá, maior do que em Libra.

O deputado André Figueiredo (PDT-CE) foi um dos que foram, sem sucesso, à Justiça tentar barrar o leilão. Uma decisão da Justiça Federal de Manaus até conseguiu suspender a disputa por algumas horas. Para Figueiredo, as condições determinadas pela ANP prejudicam o Fundo Social usado, inclusive, para injetar dinheiro na educação e na saúde. “A minoração do excedente em óleo tem impacto direto sobre as políticas públicas da União”, afirmou o deputado na ação popular. Ele afirmou que vai apelar agora ao STF (Supremo Tribunal Federal).

Afora os leilões, a Câmara se prepara para votar nos próximos dias a Medida Provisória 795, que reduziu o imposto de renda e a CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido) das petrolíferas. Nas contas de outros dois estudos, a redução tributária é questionável. O consultor de orçamentos Bruno Rocha verificou que, em três anos, serão perdidos R$ 30 bilhões em três anos, mais do que previa o Ministério da Fazenda em época de arrocho fiscal.

Já outro estudo, de Paulo Lima, calcula que, se forem considerados todos os campos do pré-sal, a perda seria maior, da ordem de R$ 40 bilhões por ano, ou R$ 1 trilhão em 25 anos. O relator da Medida Provisória na Câmara, Júlio Lopes (PP-RJ), ampliou o prazo para os benefícios serem usados até o ano de 2040 --originalmente, eram só cinco anos, até 2022.

Qual o tamanho dos novos campos de pré-sal?

Segundo o estudo dos consultores Garrido e Lima, o governo deveria furar ao menos um poço de petróleo em cada bloco para saber quanto de óleo existe. Assim, poderia ter uma informação mais confiável da produtividade e exigir mais percentual de excedente em óleo para a União, como aconteceu em Libra.

O potencial de exploração, para eles, está sendo subestimado nos novos leilões. “Algumas áreas como Aram, Uirapuru, Três Marias, Saturno e Alto de Cabo Frio-Central chegam a ter áreas maiores que Libra”, afirmam os consultores. Além disso, eles se baseiam em uma cotação de petróleo de US$ 60 (R$ 195, na cotação de sexta-feira) com viés de alta, porque julgam mais condizente com a realidade. A ANP considera US$ 50 (ou R$ 162).

Mas o diretor-geral da ANP, Décio Fabrício Odonne, outro ex-engenheiro da Petrobras, rejeita a ideia de redução de ganhos para o país. Ele afirma que as riquezas nacionais --e os repasses futuros à saúde e à educação-- não estão em risco. Ele disse ao UOL que 75% da receita total de um campo de petróleo vai parar nas mãos do Estado para distribuição em excedentes, bônus e tributos. Nas contas de Paulo Lima, esse percentual é de apenas 56%, inferior aos 63% da Inglaterra, aos 67% dos EUA, aos 74% da China e aos 76% da Noruega.

Odonne diz que, com a cotação mais baixa e a falta de certeza sobre a produtividade dos novos campos, não é possível cobrar bônus e participações em óleo tão altas como as de Libra. As companhias petrolíferas --como Shell, Exxon, Repson, BP, Total, Statoil, Petrobras e outras vencedoras dos leilões de sexta-feira-- estariam correndo riscos maiores agora e deveriam pagar menos porque se trata de uma outra situação. “É a mesma coisa que pegar um Volkswagen e uma Mercedes-Benz”, comparou o diretor da agência. “Os dois são carros. Um vale um preço e outro vale outro.”

No mundo todo, a taxa de poços perfurados que dão sucesso é de 20%, mas, no pré-sal, esse índice é de 50%, mais que o dobro, portanto. Mas Odonne afirma não ser possível nem sequer saber se existe petróleo nesses locais leiloados. “Nesses campos a gente não sabe nem se tem petróleo”, afirmou o diretor-geral da ANP.

Odonne disse que não seria possível perfurar um poço em cada local, como sugerem os consultores da Câmara porque o custo seria muito alto, de R$ 700 milhões --outro especialista ouvido pela reportagem disse que a despesa seria de R$ 200 milhões. Para o diretor da ANP, “não vale a pena” a União gastar milhões para abrir poços e só depois licitar. “É a União que tem que fazer essa aposta? Ou é o mercado, que já vai pagar 75% para a União?”

MP tenta evitar as disputas judiciais

A MP 795, que está em vigor desde agosto a fim de beneficiar as empresas nos leilões, permite que as companhias de petróleo calculem quanto gastaram com pesquisa e desenvolvimento dos poços para tirar petróleo do chão ou do mar. Esse valor será abatido do Imposto de Renda e da CSLL a pagar. Para o consultor Paulo Lima, isso significa praticamente zerar o imposto a ser pago.

Para não perder a validade, porém, a Medida Provisória precisa ser aprovada pela Câmara e pelo Senado até 15 de dezembro. O relator, deputado Júlio Lopes (PP-RJ), afirmou que a proposta é positiva porque beneficia as companhias privadas com um benefício já obtido pela Petrobras e evita disputas judiciais por causa de questões tributárias. 

O deputado endossa a versão do Ministério da Fazenda, que editou a norma com apoio técnico do Ministério de Minas e Energia, segundo apurou a reportagem. Em seu relatório à Comissão Mista para analisar o tema, Lopes frisou a importância dos investimentos do setor na economia. “Os nove leilões de blocos de petróleo previstos para ocorrerem até 2019 têm potencial para movimentar US$ 80 bilhões (cerca de R$ 260 bilhões) em investimentos em 300 novos poços marítimos, com capacidade de produzir 2 milhões de barris por dia até o ano de 2027, e US$ 100 bilhões (por volta de R$ 325 bilhões) em royalties”, afirmou.

Outro lado

No parecer, Lopes foi favorável à aprovação da regra por entender que ela dá segurança para os empresários investirem no Brasil. Mas o consultor Bruno Rocha considerou a pressa em apresentar a proposta antes mesmo de o orçamento ser enviado “no mínimo questionável” e lembrou que era preciso “encontrar espaço” para o governo renunciar mais receitas na contabilidade. O deputado disse que isso não seria problema e seria corrigido com a votação da lei orçamentária.

O UOL procurou o deputado em seu gabinete e em seu celular desde quinta-feira (26), mas ele não retornou os contatos. A assessoria do Ministério da Fazenda repassou o caso à Receita Federal. A Receita afirmou que o pagamento de impostos não vai mudar. “As medidas tributárias concebidas para a área do imposto de renda levam em conta as especificidades do setor do petróleo, como o alto risco na fase de prospecção e a necessidade de grandes investimentos por parte das empresas, bem assim o longo tempo entre a prospecção da jazida e a sua efetiva exploração.”

O Ministério da Fazenda e a Receita não informaram quais empresas petrolíferas pediram mudança na forma de cobrança de impostos e se as reuniões foram registradas em agendas públicas e atas. “Ressalte-se que é normal o diálogo dos órgãos públicos com representantes dos setores envolvidos para compreender as dificuldades e especificidades do setor econômico com o intuito de aprimorar a legislação buscando-se maior segurança jurídica e previsibilidade para as regras a serem cumpridas pelos contribuintes”, afirmou a Receita quando questionada sobre quais companhias e eventuais lobistas participaram das negociações.

A Receita afirmou que nos últimos anos fez “vultuosos lançamentos tributários” contra as companhias petrolíferas. No entanto, disputas judiciais e no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) necessitariam ser resolvidas em nome da “segurança jurídica”. Sem isso, os leilões de petróleo ficariam comprometidos, argumentou. “A MP 795 tem o objetivo de corrigir problemas da legislação tributária sobre petróleo e gás natural que ocasionaram um desempenho ruim da arrecadação destes tributos”, afirmou a assessoria do Fisco.

Os estudos foram feitos por cinco consultores da Câmara. Quatro analisaram a MP 795 e produziram três trabalhos técnicos sobre ela. Adilson Nunes de Lima e Marcelo Sobreiro Maciel “dissecaram” detalhadamente a proposta. Paulo Lima observou os aspectos tributários sob o ponto de vista da produção petrolífera. Bruno Rocha avaliou-a segundo a situação do orçamento e a adequação financeira. Os leilões do pré-sal de sexta-feira (27) foram analisados em um estudo dos consultores Pedro Garrido e Paulo Lima.

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