Multa na crise de água era R$ 84, Sabesp cobrou R$ 3.391 e terá de devolver
A Sabesp, companhia de água e saneamento do estado de São Paulo, foi condenada na Justiça a restituir uma multa paga a mais por um prédio da capital durante a crise de abastecimento de água entre 2015 e 2016. Segundo a ação, a multa deveria ter sido de R$ 83,88, mas foram cobrados R$ 3.390,74.
O Tribunal de Justiça de São Paulo determinou que a Sabesp devolva a diferença corrigida. A empresa informou que vai recorrer da decisão.
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Há diversas reclamações de que estaria errado o cálculo da "tarifa de contingência" (espécie de multa) cobrada de quem excedesse os limites de consumo estabelecidos na crise.
Esta foi a primeira decisão relacionada a um desses casos e dá um argumento extra à compreensão de que a metodologia usada pela Sabesp teria sido indevida e os clientes multados teriam sido prejudicados.
A base de cálculo da multa estaria errada
Segundo o condomínio Costa del Sole, que fica na zona sul da cidade, as multas foram aplicadas sobre o valor total da conta de consumo de água do condomínio, quando, no entendimento da decisão, deveriam ter sido aplicadas apenas sobre a parte que ultrapassasse os limites estipulados.
Essa diferença de cálculo, nas contas dos moradores do edifício, fez subir o valor extra dos R$ 83,88 para os R$ 3.390,74, considerados os quatro meses ao longo de 2015 e 2016 em que seu consumo de água aumentou e ficou sujeito à multa.
O Tribunal de Justiça de São Paulo determinou, em primeira instância, que a Sabesp revise as faturas em questão, refaça o cálculo considerando a multa apenas sobre o consumo excedente e realize o reembolso do que foi cobrado além disso --na conta do condomínio, uma diferença de R$ 3.306,86. O valor exato é apurado ao final do processo, encerrados os recursos.
A ação pedia a restituição da diferença em dobro, o que é garantido pelo Código de Defesa do Consumidor em caso de cobranças indevidas que não são feitas por engano justificável. Essa parte do pedido, no entanto, foi negada, e a devolução deverá ser simples, uma vez que, no entendimento do juiz, a interpretação da norma poderia gerar dúvidas e "o engano (...) não se mostrou inescusável".
Um cálculo feito pela Resgata, uma startup de direitos dos consumidores que está assessorando clientes da Sabesp nessa disputa, estima que a metodologia errada de cobrança atingiu centenas de clientes que foram submetidos à multa durante o período de seca. Somadas, as multas teriam gerado R$ 600 milhões indevidos, segundo a Resgata.
Multa por aumento de consumo
Em 2014, após um verão com baixos índices de chuva, os reservatórios que abastecem a capital e boa parte do estado de São Paulo se viram vazios, e várias medidas passaram a ser adotas pelas companhias regionais de saneamento para evitar o desabastecimento das cidades, que incluíram campanhas publicitárias e bônus na conta a quem economizasse.
A partir de janeiro de 2015, a Sabesp passou também a aplicar multas aos clientes que aumentassem o consumo de água, usando como referência a média mensal do ano anterior. A regra valeu até início de 2016. Definida e autorizada pela agência reguladora do setor de água e saneamento do estado, a Arsesp, a chamada tarifa de contingência deveria ser de 40% para aqueles que aumentassem o consumo em até 20% sobre a média, e de 100% para aqueles que excedessem a média mensal em mais de 20%.
O desentendimento, porém, vem por conta de qual deveria ser a base de cálculo para a aplicação da multa. Pelo texto da resolução da Arsesp, a multa seria "aplicável à parte do consumo de água encanada que exceder (...) a média". As cobranças, no entanto, segundo consumidores e entidades que reclamaram, foram feitas sobre o valor total da conta.
Para Sabesp, metodologia está correta
Procurada pelo UOL, a Sabesp informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que "a companhia segue o entendimento da agência reguladora, a Arsesp, que define as tarifas e a forma de aplicação das mesmas". Segundo a Sabesp, "a agência dirimiu eventuais dúvidas sobre a maneira de aplicar a tarifa de contingência por meio de nota de esclarecimento, que se encontra no próprio site da agência."
A nota de esclarecimento mencionada, e anexada pela Sabesp em seu e-mail de resposta ao UOL, é um comunicado de imprensa emitido pela Arsesp à época da regulamentação da multa, em janeiro de 2015, que replica as novas regras para aplicação da multa por aumento. No texto, no entanto, não foi especificada a base de cobrança: "o usuário cujo consumo mensal ultrapassar a média apurada (...) estará sujeito à tarifa de contingência correspondente a 40% [ou 100%] de acréscimo sobre o valor de consumo de água encanada."
É uma redação ligeiramente diferente do texto da resolução original, que foi publicada no "Diário Oficial" do estado de 8 de janeiro de 2015 e acrescentava que a tarifa de contingência deveria ser correspondente "a 40% [ou 100%] de acréscimo sobre o valor da tarifa, aplicável à parte do consumo de água encanada que exceder até 20% [ou a mais de 20%] da média."
Procurada, a Arsesp declarou que a metodologia da Sabesp está correta, uma vez que a tarifa de contingência "foi aplicada apenas sobre a parte do consumo de água, nas hipóteses em que este superou a média estabelecida, e não à conta total que inclui também os serviços de esgotamento sanitário".
"O critério estabelecido na deliberação da Arsesp 545/2015 foi cumprido pela Sabesp", disse a agência, em nota. "O impacto dos valores adicionais recaiu sobre aqueles que consumiram mais água que a média estabelecida."
Mais de R$ 600 mi a devolver
As primeiras reclamações vieram por parte da Resgata, startup que, a partir de um algoritmo, rastreia contas e mapeia cobranças indevidas. "Analisamos mais de 25 mil contas [da Sabesp] e vimos que em cerca de 40% delas havia alguma cobrança indevida", disse Rodrigo Link, um dos sócios da empresa.
"Conseguimos inverter o ônus da prova, e é a Sabesp que terá de provar que a cobrança não foi feita", disse Link. "Como o juiz, agora, deu ganho de causa para o condomínio, ele entendeu que, sim, a Sabesp cobrou erroneamente. Comprova o que vínhamos falando."
A condenação recente da Sabesp não torna a decisão automática para as próximas ações sobre a questão, que continuam tendo que ser julgadas caso a caso. A sentença, no entanto, pode ser usada no processo para reforçar a acusação.
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