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Coronavírus, crise global, eleições: o que pode afetar a economia em 2020

Carla Araújo

Colaboração para o UOL, em Brasília

04/03/2020 10h03

A aprovação da reforma da Previdência em 2019 não foi suficiente para que a economia brasileira entrasse em uma rota mais acelerada de crescimento. O PIB cresceu 1,1%, menos que em 2017 e 2018. O que esperar para este ano?

A agenda econômica para 2020 é repleta de desafios, na avaliação de especialistas. No âmbito interno, o governo precisa superar o suposto risco de uma ruptura institucional e também lutar para a manutenção do ministro da Economia, Paulo Guedes, no cargo. Na esfera internacional, o cenário prevê dificuldades na exportação por conta da desaceleração generalizada do crescimento econômico mundial. Veja abaixo fatores que podem afetar o crescimento brasileiro neste ano.

Reformas lentas, ano de eleições

O fato de o governo ainda não ter se posicionado em relação à reforma tributária e criar uma verdadeira novela para o envio da reforma administrativa —justamente em um ano eleitoral, que prevê uma menor produtividade do Congresso— amplia o pessimismo em relação ao crescimento da economia brasileira neste ano.

Tensão política e Guedes em xeque

Guedes teve que fazer um esforço retórico após a aprovação da reforma da Previdência e, agora, a atual tensão institucional, acirrada pelo apoio do presidente Jair Bolsonaro a manifestações contra o Congresso, gera inclusive o debate sobre a permanência ou não do "posto Ipiranga" do governo. É o que aponta o cientista político da Tendências Consultoria Integrada Rafael Cortez.

"A tensão institucional joga incertezas, mesmo que a política econômica esteja na direção certa", disse Cortez. "Uma eventual saída do ministro Guedes teria um preço muito alto, já que o monopólio da origem da credibilidade da economia está na mão da equipe de Guedes. E já há uma percepção de fragilidades quando se discute uma possibilidade de saída do cargo."

Desaceleração global e crise na Argentina

O professor da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA-USP) Simão Davi Silber minimiza o atraso das reformas que ainda não foram enviadas para o Congresso e afirma que o setor externo é a parte mais complicada para garantir um crescimento em 2020.

"Com a economia mundial crescendo abaixo de 2,5%, o comércio internacional sente muito e, de uma maneira geral, vai ser mais difícil exportar em 2020, pela desaceleração generalizada do crescimento", afirmou. "Em particular a Argentina vai ter mais um ano de recessão, e uma parcela importante de manufaturados exportados pelo Brasil tem como mercado os nossos vizinhos."

Coronavírus

Cortez concorda que, para este ano, efeitos internacionais serão bastante relevantes e destaca a extensão que o coronavírus pode ter.

"Dependendo de como o vírus se espalhar e continuar preocupando o mundo, pode reforçar ainda mais a decepção econômica em pelo menos duas variáveis: a redução do preço das commodities [matérias-primas, que o Brasil exporta muito] e integração das cadeias produtivas, já que boa parte da indústria depende da importação de bens intermediários chineses", disse.

Eleições nos EUA

Outro fator que deve impactar a economia brasileira neste ano é a eleição norte-americana. "Há uma percepção de risco elevado sobretudo se um candidato democrata de esquerda ganhar para disputar com Donald Trump. Acaba que pode influenciar um ciclo econômico menos ambicioso", destaca o cientista político.

Falta de investimento público

O professor da FEA-USP acredita ainda que as frustrações econômicas em 2020 também devem vir de um aspecto fiscal, já que os tempos do estado como condutor do crescimento acabaram. Ele pondera, porém, que haveria um caminho que poderia estimular o crescimento.

"Se o governo conseguir acelerar os programas de concessão e resolver entraves do setor de saneamento há chances de algum impacto positivo. Mas a restrição para isso é beligerância política", apontou Silber.