Argentina estende negociações com credores, mas entrará em moratória
A Argentina vai entrar em moratória da sua dívida externa no final do pregão de Nova York hoje ao não pagar um vencimento de US$ 503 milhões. O governo pretende que o calote seja apenas transitório, até chegar a um acordo de reestruturação da sua dívida com credores externos cujo prazo estendeu até o dia 2 de junho.
O montante está incluído nos US$ 66,3 bilhões que o governo argentino tenta, sem sucesso, reestruturar desde 16 de abril, quando fez a primeira oferta, amplamente rejeitada pelos três grupos de credores, detentores de 70% da dívida argentina em reestruturação.
No dia 22 de abril, o país não pagou o atual vencimento, fazendo disparar os 30 dias de carência para regularizar a situação, antes de ser oficialmente confirmada a moratória da dívida. O período que vence nesta sexta-feira também foi estabelecido como o limite para um acordo financeiro com os credores.
Sem entendimento, no entanto, o governo argentino anunciou uma nova extensão das negociações por mais onze dias, até 2 de junho. "A Argentina e os seus assessores pretendem aproveitar esta extensão para continuarem as discussões e permitir aos investidores continuarem a contribuir para uma bem-sucedida reestruturação da dívida", anunciou o Ministério da Economia da Argentina no final da noite desta quinta-feira (21).
Fracasso da postura argentina
Foi a segunda extensão do prazo de negociações, depois que, em 8 de maio, perante o fracasso do processo, o governo saiu da posição de intransigência nas negociações e passou a aceitar contra-ofertas dos credores, desde que atendessem a premissa da "sustentabilidade", isto é, que a Argentina possa pagar sem comprometer a sua capacidade de crescimento econômico.
A partir de então, a Argentina recebeu três contra-propostas, sendo uma delas a considerada mais próxima dos parâmetros pretendidos pelo governo argentino. Apesar dessa aproximação, as diferenças ainda persistem.
Pela proposta inicial argentina, rejeitada pelos credores, o país reconheceria em torno de US$ 0,40 de cada dólar de dívida. Pela melhor contra-proposta dos credores, esse reconhecimento deveria estar em torno de US$ 0,55 por dólar.
Calote e pandemia
O moratória à qual o país ingressa vem acompanhada de um compromisso de negociação entre as partes, implicando que, enquanto durarem as negociações, os credores não entrem com ações legais que ativem as cláusulas que executam o default.
"A Argentina tem pouco tempo para fechar um acordo. O prazo que o país impôs, na verdade, corre contra si próprio porque, se este cenário de negociações terminar mal e a Argentina entrar em moratória, a saída da pandemia e a recuperação da economia argentina serão muito mais difíceis", explica à RFI o economista Marcelo Elizondo, diretor da consultoria Desenvolvimento de Negócios Internacionais (DNI).
Para o governo argentino, trata-se de uma "moratória suave" sem maiores consequências na prática. Os economistas concordam que ainda há uma margem para negociar antes de procurar os tribunais.
"Se o default durar pouco, não haverá maiores implicâncias. Mesmo que alguma agência classificadora de risco defina a Argentina em moratória, se houver um acordo nos próximos dias, não deveria haver maiores problemas. Porém, se não houver um acordo com os credores, o calote vai agravar uma economia já complicada pela profunda recessão combinada com elevadíssima inflação", avalia Daniel Artana, economista chefe da Fundação de Investigações Económicas Latino-americanas (FIEL).
"Esse último trecho das negociações não é fácil, mas nenhuma das duas partes quer que um 'default' se concretize", confia Artana.
"Tecnicamente, é uma moratória. O nome é 'default técnico' ou 'default seletivo'. Teoricamente, os credores poderiam entrar com ações legais, mas enquanto houver intensas negociações, o mais provável é que não haja sanções", coincide o analista Claudio Loser, ex-diretor do Fundo Monetário Internacional. "Mas é uma pressão maior sobre o governo porque, se for intransigente nas negociações, os credores terão essa carta na manga para pressionar", adverte.
O governo procura evitar a nona moratória da dívida ao longo da história argentina cujos efeitos nocivos, desta vez, aprofundariam a crise econômica do país, já agravada pela pandemia. "O grande desafio que o governo argentino enfrenta é que abriria duas frentes simultâneas de batalha: a da saúde e a da economia. Ou seja: o coronavírus e o risco de moratória", aponta à RFI o analista político Rosendo Fraga.
Negociações contra o tempo
A Argentina quer reestruturar US$ 66,3 bilhões da dívida emitida sob legislação estrangeira. Pelo lado dos juros, a redução é de 62% equivalentes a US$ 37,9 bilhões. Pelo lado do capital, a redução é de 5,4% equivalente a US$ 3,6 bilhões.
Além dessas reduções, o governo quer um período de três anos - até 2023 - sem pagar nem juros nem capital. Os novos títulos, com prazos de 2030 e 2047, terão taxa de juros média de 2,33%, bem abaixo a atual média de 7%.
Os credores querem reduzir esse prazo de carência e capitalizar os juros durante esse período, além de eliminarem a redução sobre o capital.
Depois dos credores privados, a Argentina enfrentará negociações com o Fundo Monetário Internacional (FMI) para também reestruturar outros US$ 44 bilhões. Essa negociação, no entanto, não envolve nenhuma redução. Apenas um alargamento dos prazos. A dívida pública argentina total chega a US$ 323 bilhões.
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