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Proposta de Marinho dá R$ 1,4 bi para governo gastar sem furar teto em 2021

O presidente Jair Bolsonaro e o ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho - Mateus Bonomi/Agif/Agência Estado
O presidente Jair Bolsonaro e o ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho Imagem: Mateus Bonomi/Agif/Agência Estado

Antonio Temóteo e Carla Araújo

Do UOL, em Brasília

28/11/2020 04h00Atualizada em 28/11/2020 08h59

Acusado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, de querer furar o teto de gastos, o ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, elaborou uma proposta para o governo deixar de gastar R$ 1,4 bilhão no Orçamento do próximo ano e até R$ 26 bilhões em dez anos. Esse dinheiro poderá ser destinado a outro gasto, escolhido pelo governo, sem desrespeitar a lei do teto. A ideia da equipe de Marinho é usar esses recursos para reformular os fundos de desenvolvimento regional, que passariam a funcionar como estruturadores de projetos e estimulariam investimentos em infraestrutura.

A proposta de Marinho e dos técnicos da sua equipe prevê redução em uma taxa paga pelo governo a três bancos estatais, Banco do Brasil, Banco da Amazônia e Banco do Nordeste. Cairia dos atuais 2,4% para 0,5% a taxa paga para os bancos administrarem os fundos constitucionais que ofertam crédito com juros baixos para empreendimentos no Nordeste, no Norte e no Centro-Oeste.

Outro gasto do governo que diminuiria é o encargo cobrado pelos bancos para ficar com o risco dessas operações de empréstimo, chamado del credere. Hoje, ele é de 3% quando o risco é compartilhado pelo banco com o fundo e de 6% quando o risco fica todo com a instituição financeira.

A ideia é que o dinheiro que deixará de ser gasto seja destinado exclusivamente para bancar a reformulação dos fundos. A decisão final sobre como o dinheiro será gasto, entretanto, é política e será tomada pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Todo o dinheiro pode ser destinado para a criação dos novos fundos ou parte dele pode ser destinado para outros ministérios e projetos do governo.

A proposta de Marinho é semelhante à decisão que o governo tomou de reduzir de 1% para 0,5% a taxa paga à Caixa para administrar o FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço).

Por causa do teto de gastos aprovado na gestão de Michel Temer, em 2016, a despesa do governo a cada ano deve se limitar à do ano anterior, corrigida apenas pela inflação. Por isso, para aumentar ou criar algum gasto, o governo precisa cortar outro de valor equivalente.

MP retira fundos do Orçamento e do teto de gastos

O UOL teve acesso a uma MP (Medida Provisória) elaborada pelo Ministério do Desenvolvimento Regional com essas propostas.

O texto foi enviado para avaliação do Ministério da Economia e ainda não há prazo para que a equipe de Guedes se manifeste. Após essa avaliação, a proposta segue para a Casa Civil e precisa ser assinada pelo presidente da República para ter efeito imediato. Depois, é enviada ao Congresso Nacional.

Além de reduzir o gasto do governo, Marinho propõe mudar a natureza jurídica dos três fundos em questão: de Desenvolvimento do Nordeste (FDNE), da Amazônia (FDA) e do Centro-Oeste (FDCO).

Atualmente, para executar projetos, esses fundos dependem de existir dinheiro separado para eles no Orçamento público. Como o Orçamento é limitado pela regra do teto de gastos, os recursos para os fundos também são.

Hoje, os fundos têm R$ 6,5 bilhões disponíveis na conta única do Tesouro Nacional. Com a MP, Marinho propõe que o governo pegue o dinheiro e faça um aporte nos fundos. Com isso, eles passariam a ter um Orçamento próprio, fora do teto de gastos.

O ministro avalia que a operação dos fundos hoje é burocrática e que essa burocracia diminuirá se eles operarem com recursos próprios.

Nos últimos 14 anos, os fundos de desenvolvimento tiveram recursos de R$ 43 bilhões, mas só emprestaram R$ 15,2 bilhões, para financiar 60 projetos. Na avaliação do governo, a dependência de recursos orçamentários trava a liberação de recursos.

Ministro quer que fundos financiem infraestrutura

Com a mudança nas regras, a ideia de Marinho é que os fundos financiem projetos de infraestrutura da sua pasta no Norte, no Nordeste e no Centro-Oeste, em áreas como saneamento básico e mobilidade urbana. A carteira de projetos do ministério chega a R$ 1 trilhão.

Pelo texto da MP, os fundos de desenvolvimento e as superintendências regionais, como Sudam (Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia), passariam a ser grandes estruturadores de projetos, como fazem atualmente o BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social) e a Caixa.

Usando BNDES e Caixa, o governo estima que levaria 60 anos para estruturar todos os projetos da carteira de R$ 1 trilhão do Ministério da Desenvolvimento Regional.

A proposta também determina que os fundos de desenvolvimento serão administrados e geridos por bancos públicos. Nas contas do governo, para cada R$ 1 bilhão em estruturação de projetos, é possível atrair investimentos de R$ 80 bilhões a R$ 100 bilhões.

País precisa de reformas, diz economista

Na opinião do economista Gabriel Leal de Barros, economista-chefe da RPS Capital e ex-diretor do Instituto Fiscal Independente (IFI), ligado ao Senado Federal, a proposta de Marinho para conseguir R$ 1,4 bilhão é interessante porque não fura o teto de gastos.

"A percepção do mercado deve ser positiva, porque os analistas não entenderão isso como uma goteira no teto de gastos. Como é uma mudança dentro das quatro linhas, que respeita as regras do jogo, o mercado tende a ler positivamente", declarou.

Mas ele afirmou que a medida não diminui o desafio que o governo terá em 2021, quando precisará cortar pelo menos R$ 20 bilhões em despesas para cumprir o teto de gastos.

"São necessárias reformas estruturantes. A proposta de Marinho é interessante, mas outras medidas são necessárias", disse.