Se país não melhorar já, só em 2024, pois eleição para tudo, diz agência
Resumo da notícia
- S&P, uma das principais agências de risco do mundo, diz que nota do Brasil pode demorar a melhorar
- Agenda de reformas e compromisso fiscal precisam ser retomados para atrair investidor estrangeiro
- Ritmo da vacinação e eleições no Congresso são desafios para o governo federal, diz analista principal do Brasil na S&P
Para o Brasil melhorar sua nota de risco e atrair investidores internacionais, precisa dar um jeito na economia neste ano. Se não acontecer isso agora, só terá chance de avançar a partir de 2024. Isso acontece porque a eleição de 2022 deve paralisar o país, e o primeiro ano de um novo mandato, em 2023, deve ser um pouco lento. A opinião é de Livia Honsel, analista da S&P Global Rating, uma das principais agências de classificação de risco do mundo.
A nota de risco de um país é dada por agências globais de avaliação. Uma boa nota (ou rating) significa que um país é bom pagador de suas dívidas, não dá calote e é um lugar seguro para investir. Livia Honsel diz que, para melhorar sua nota, o Brasil precisa controlar seus gastos públicos e ao mesmo tempo crescer. É uma receita difícil porque uma ajuda aos pobres, como auxílio emergencial, por exemplo, movimenta a economia, mas aumenta os gastos do governo.
Será difícil uma melhora do rating do Brasil sem resolver esses pontos. E isso requer mais crescimento ou aprovação de reformas estruturais e medidas de consolidação fiscal mais concretas que possam dar mais confiança ao mercado.
Livia Honsel, analista principal para o rating soberano brasileiro da S&P Global Rating
Com uma melhor classificação de risco, o Brasil se torna mais atraente para investidores e empresários. Quanto mais alta a nota, maior a chance de o país atrair recursos para novos negócios, capazes de gerar emprego e renda.
Na S&P (Standard & Poor's), o melhor rating dado ao Brasil foi um BBB, alcançado em novembro de 2011, uma nota que significa grau de investimento - ou seja, a economia brasileira era considerada segura para investidores estrangeiros de longo prazo por causa do baixo risco de calote do governo.
Em março de 2014, o país começou a passar por revisões negativas. Em setembro de 2015, o Brasil foi rebaixado a BB+, perdendo assim o grau de investimento - nosso governo passou então a ser visto como sujeito a dar calotes. Essa nota seguiu em queda, até chegar à atual BB-, com perspectiva estável, ou seja, sem tendência definida ainda para uma melhora ou piora, dada em dezembro do ano passado.
Este ano será chave para definir a trajetória fiscal do médio prazo, olhando para um período de dois a três anos. Em 2022, com eleições gerais, achamos que estará tudo parado. E o primeiro ano de um governo, em 2023, tradicionalmente é um pouco lento. Então, 2021 é fundamental.
Livia Honsel
Veja os principais trechos da conversa com a analista:
UOL: Neste momento, qual é o maior obstáculo para que o Brasil possa melhorar a classificação de risco?
Livia Honsel: No rating de um país, tem sempre uma combinação de fraquezas e forças. No Brasil, as fraquezas são a elevada dívida e o lento crescimento econômico nos últimos anos, algo que deve continuar mesmo após 2022 e 2023.
Por outro lado, as forças são a solidez do perfil externo, com baixo endividamento externo. Outra força é a credibilidade da política monetária. Com a pandemia, vimos a piora do fiscal e do crescimento, mas o setor externo não piorou.
Para melhorar nos próximos dois anos, o rating do Brasil depende quase exclusivamente da questão da vulnerabilidade fiscal, de haver uma maior visibilidade fiscal.
Será difícil uma melhora do rating do Brasil sem resolver esses pontos. E isso requer mais crescimento ou aprovação de reformas estruturais e medidas de consolidação fiscal mais concretas que possam dar mais confiança ao mercado.
Mas a agência vê algum sinal de que essas fraquezas estejam sendo resolvidas?
Por um lado, o entorno econômico tem sido menos grave que o esperado, graças em parte aos estímulos monetários e fiscais, que tornaram a retração econômica menos forte que o esperado.
Mas o estímulo fiscal tem consequências na trajetória fiscal. Por isso, há dúvidas se essas medidas serão restritas a 2020, ou se poderão ser estendidas para 2021.
O governo brasileiro deve estar acompanhando de perto a recuperação econômica e o emprego, que aumentou de forma importante. Vemos uma redução gradual do desemprego, o que pode fazer com que os estímulos possam ser retirados.
Outro ponto positivo a destacar é que ainda vemos empenho da equipe econômica e de parte do Congresso com o compromisso fiscal e com a agenda de reformas.
Mas ainda há muita incerteza sobre a materialização dessa consolidação fiscal e das reformas. Essas incertezas aumentaram com a pandemia e com a eleição no Congresso.
O ambiente político então está afetando a capacidade de o Brasil evoluir sua nota de crédito?
A avaliação da situação política institucional é um dos itens mais importantes no rating. O entorno político hoje está neutro para o rating. Por um lado, o Brasil é uma democracia, com pesos e contrapesos, informação, imprensa independente.
Mas o sistema como está estabelecido impede que qualquer reforma importante possa ser feita sem alguma demora. E mesmo com o compromisso da equipe econômica, com um consenso no Congresso, há depois discussões, que acabam afetando o andamento desses processos e, por isso, a percepção dos investidores.
A forma com que o Brasil está fazendo a imunização da população contra a covid-19 tem algum peso neste momento para a classificação de risco?
Claro que atraso da imunização também atrasa a recuperação econômica, sendo o principal ponto de risco sobre as projeções de crescimento do país para este ano, além de aumentar o risco da situação fiscal.
Como temos já previsão de déficit para os próximos anos, se não houver a consolidação fiscal, isso se torna mais um risco para o rating.
Levando tudo isso em conta, o que a Standard & Poor's destaca sobre a classificação de risco do Brasil?
No caso do Brasil, costumamos fazer revisões duas vezes por ano, pela importância do país. Então deveremos ter alguma revisão do rating do Brasil no primeiro semestre deste ano.
Este ano será chave para definir a trajetória fiscal do médio prazo, olhando para um período de dois a três anos. Em 2022, com eleições gerais, achamos que estará tudo parado. E o primeiro ano de um governo, em 2023, tradicionalmente é um pouco lento. Então, 2021 é fundamental.
Como no ano que vem tem eleição presidencial, qualquer revisão positiva sobre o rating tende a ficar para depois de 2022.
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