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Mulheres gastam R$ 6.000 ao longo da vida com absorventes, diz entidade

Presidente Jair Bolsonaro vetou a distribuição gratuita de absorventes - Anderson Riedel/PR
Presidente Jair Bolsonaro vetou a distribuição gratuita de absorventes Imagem: Anderson Riedel/PR

Nicole D'Almeida

Colaboração para o UOL, em São Paulo

08/10/2021 21h17

O presidente Jair Bolsonaro, vetou, na quinta-feira (7), a distribuição gratuita de absorventes íntimos, aprovada em setembro pelo Congresso Nacional.

A medida fazia parte do projeto Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual, sancionado pelo presidente. Foram vetados os artigo 1º e 3º, que previam a entrega do item de higiene para estudantes de baixa renda de escolas públicas, pessoas em situação de rua ou vulnerabilidade social extrema e presidiárias foram vetados.

Bolsonaro também vetou o trecho que incluía absorventes nas cestas básicas distribuídas pelo Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional.

O presidente argumentou, entre outros motivos, que não há dinheiro para o custeio dessa medida. O texto aprovado previa que a fonte seriam recursos destinados pela União ao SUS (Sistema Único de Saúde) e, no caso das detentas, do Fundo Penitenciário Nacional.

Mas, afinal, o que isso impacta na vida das meninas e mulheres?

Quanto custa menstruar

De acordo com levantamento do Fluxo Sem Tabu, uma iniciativa que fornece itens de higiene íntima para vulneráveis, "uma mulher tem cerca de 450 ciclos menstruais durante a vida e necessita de, em média, 20 absorventes por ciclo. Considerando esses números, estima-se que sejam usados 10 mil absorventes durante toda a idade fértil. Se considerarmos um custo médio de R$ 0,60 por absorvente, chegamos ao valor de R$ 6.000".

Atualmente, o salário mínimo é de R$ R$ 1.100, e o valor de uma cesta básica paulistana, em julho, chegou a R$ 1.064,79.

Uma mulher que ganha um salário mínimo, compra uma cesta básica e ainda precisa desembolsar mais R$ 12 por mês na compra de absorventes fica só com R$ 23,21 no final do mês para aluguel e outras contas.

A iniciativa #AmeSeusCiclos, do movimento Tributo a Elas, criado por Procuradoras da Fazenda Nacional, apoia e divulga projetos de lei para a inclusão de absorventes, coletores menstruais e demais itens semelhantes e necessários à saúde e higiene da mulher na "cesta/bolsa básica da mulher" e propostas de redução dos tributos incidentes sobre os itens que compõe a bolsa.

Em setembro de 2021, as advogadas montaram essa cesta com marcas de menor preço em um supermercado de Salvador, na Bahia. Ela continha: dois pacotes de absorventes com aproximadamente oito unidades, duas pastas de dente, três sabonetes, um fio dental, um desodorante, um xampu, um condicionador, um enxaguante, um álcool em gel e uma escova de dentes. O valor total foi de R$ 73,46, sendo 17% composto de tributos estaduais e 33% de tributos federais.

Com isso, as procuradoras criaram o projeto de lei Bolsa Básica da Mulher, que parte do pressuposto de que a menstruação é um processo biológico e acompanha mulheres cerca de 30 anos, além de muitas delas não terem acesso a itens de higiene íntima.

Pobreza menstrual

A pobreza menstrual é a falta de produtos básicos de higiene durante a menstruação. De acordo com campanha #MeninaAjudaMenina, realizada pela Always, está ligada à desigualdade de gênero e à evasão escolar causada pela falta de absorventes.

O relatório Livre para Menstruar, do movimento Girl Up Brasil, indica que cerca de 30% do Brasil menstrua, ou seja, 60 milhões de mulheres e meninas. Contudo, milhões delas acabam enfrentando diversos desafios com implicações sérias para a educação e a saúde a cada ciclo menstrual.

Segundo a ONU (Organização das Nações Unidas), 12% da população feminina mundial vivencia a pobreza menstrual, sobretudo as em situação de rua, refugiadas e presidiárias.

O levantamento Pobreza Menstrual no Brasil: desigualdade e violações de direitos, realizado pelo Unicef, mostra que 713 mil meninas vivem sem banheiro ou chuveiro em casa; 900 mil meninas não têm acesso a água canalizada em seus domicílios; 6,5 milhões vivem em casas sem ligação à rede de esgoto.

O que torna a higiene do próprio corpo, sobretudo durante o período menstrual, inadequada.

Outro problema é a falta de informação. "Muitas desconhecem o próprio corpo, seus órgãos, a tecnologia que cada corpo tem, as fases e períodos férteis. Além disso, como meninas menstruam por volta dos 12 anos, elas ficam dependentes de familiares para adquirir absorventes ou outras maneiras de conter o sangue menstrual", explica Herta Rani Teles, procuradora da Fazenda Nacional, mestre e doutoranda em Direitos Humanos pela Universidade de Coimbra e coidealizadora do Tributos a Elas.

"E quando a família passa por necessidade financeira, o assunto passa longe de ser prioridade. Então muitas recorrem a meios inapropriados para conter o sangue menstrual", completa.

Acesso precário

O acesso precário a absorventes faz com que mulheres em situação de vulnerabilidade recorram a métodos inseguros, como folhas de jornais, pedaços de pano, folhas de árvores e até mesmo miolo de pão. A utilização de itens inadequados pode causar infecções e até lesões nos órgãos reprodutores femininos.

Outro ponto é que, segundo o Livre para Menstruar, 1,5 milhões de brasileiras vivem em residência sem banheiro. O que impacta muito na saúde da mulher.

Menstruação e educação

Uma estudante brasileira perde até 45 dias de aula devido à menstruação, segundo pesquisa feita pela Sempre Livre. Os motivos são variados, entre eles a falta de acesso a absorventes e de saneamento nas escolas.

Uma em cada quatro meninas já faltou à aula por não conseguir comprar absorvente, relata pesquisa feita pela Always.

"Note-se que o direito à educação é um direito humano, amparado por normas nacionais e internacionais, pois é parte integrante da dignidade humana e contribui para ampliá-la em conhecimento, saber e discernimento. E a educação é a mais valiosa forma de crescimento e desenvolvimento humano, inclusive, profissional, do que a ausência dessas meninas das aulas por aproximadamente 45 dias por ano pode prejudicar a aprendizagem delas e no final das contas o seu desenvolvimento e sua inserção no mercado de trabalho", explica Teles.