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Análise: Inflação deve desacelerar em 2022, mas seguir acima da meta do BC

Juros elevados e economia desaquecida vão reduzir ritmo da inflação, mas outros fatores atrapalham -  Emil Kalibradov/Unsplash
Juros elevados e economia desaquecida vão reduzir ritmo da inflação, mas outros fatores atrapalham Imagem: Emil Kalibradov/Unsplash

João José Oliveira

Do UOL, em São Paulo

03/01/2022 04h00

Resumo da notícia

  • IPCA fica entre 5% e 6% ano que vem, abaixo dos quase 11% de 2021, dizem economistas
  • Juros mais elevados e economia fraca devem segurar reajustes de preços
  • Mas inflação segue acima da meta estabelecida pelo Banco Central

O IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), indicador oficial de inflação, deve fechar 2022 entre 5% e 6%, menos da metade dos quase 11% atingidos em 2021, dizem economistas. Ainda assim estará acima do centro da meta do Banco Central, que é de 3,5% em 2022.

Os juros mais elevados e a economia desaquecida vão ajudar a reduzir o ritmo da inflação. Mas como essa trajetória de queda será mais forte só a partir do segundo semestre, e o dólar vai continuar acima dos R$ 5,50, o IPCA deve estourar a meta.

Especialistas destacam que a redução da inflação esperada para o ano que vem não significa que haverá uma queda generalizada dos preços de produtos e serviços na economia, mas sim que a intensidade e frequência dos reajustes serão menores.

A inflação ainda está elevada, mas já com indicações de menor pressão, como a retração dos preços no atacado. Em 2022, a elevação dos juros pelo Banco Central e o impacto desse movimento sobre a economia devem levar o IPCA à casa dos 6%.
André Roncaglia, economista e professor da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo)

IPCA acumulado em 12 meses (Fonte IBGE)

  • nov.2021: 10,74%
  • out.2021: 10,67%
  • set.2021: 10,25%
  • ago.2021: 9,68%
  • jul.2021: 8,99%
  • jun.2021: 8,35%
  • mai.2021: 8,06%
  • abr.2021: 6,76%
  • mar.2021: 6,10%
  • fev.2021: 5,20%
  • jan.2021: 4,56%
  • dez.2020: 4,52%
  • dez.2019: 4,31
  • dez.2018: 3,75%
  • dez.2017: 2,95%
  • dez.2016: 6,29%
  • dez.2015: 10,67%

O que pode desacelerar a inflação

Há economistas que traçam um cenário de inflação menor em 2022. Eles dizem que não devem se repetir fatores que pressionaram os preços em 2021. Pelo menos não acontecerão com a mesma intensidade.

Questão matemática: Como os reajustes em 2022 serão menores em relação aos preços de 2021, a inflação deve ser menor, afirmam economistas. Isso valeria para combustíveis e alimentos, por exemplo.

Juros altos e economia fraca: Para combater a inflação, o Banco Central acelerou o processo de aumento da taxa básica de juros, que fechou 2021 em 9,25%. O mercado já está projetando a Selic em 11,75% no primeiro trimestre de 2022.

Juros mais elevados prejudicam o consumo porque encarecem o crediário e os empréstimos. Além disso, a Selic maior aumenta o ganho das aplicações em renda fixa, o que estimula famílias e empresas a aplicarem no mercado financeiro em vez de gastarem.

De acordo com as projeções de mercado, o PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro vai crescer apenas 0,5% em 2022, bem abaixo dos quase 5% de expansão esperada em 2021.

Juros elevados desaquecem a economia e, com menos gente comprando, há menos espaço para as empresas repassarem reajustes de preços.
Felipe Sichel, estrategista-chefe do banco digital Modalmais

Dólar mais estável: O dólar vai continuar valorizado, acima dos R$ 5,50, conforme projeções de economistas. Mas a alta da Selic deve atrair dólares de investidores estrangeiros interessados em ganhar no Brasil com os rendimentos maiores que os ganhos nos Estados Unidos, por exemplo.

Esse movimento deve ajudar a conter novos picos de valorização da moeda americana, fator que tem sido o principal combustível da inflação no Brasil.

Muito dos choques de oferta já está sendo absorvido ao longo da cadeia de produção, então a inflação pode ficar entre 5,5% e 6% no ano que vem.
Antonio Corrêa de Lacerda, professor da Faculdade de Economia da PUC-SP e presidente do Cofecon (Conselho Federal de Economia)

Normalização da produção: Outro fator que alimentou a alta de preços, principalmente de produtos industrializados, foi a falta de matérias-primas em diferentes setores, como o de veículos e eletrodomésticos. Isso aconteceu por causa da pandemia, que interrompeu o fornecimento desses itens e a logística de entregas.

Segundo economistas do setor industrial, o funcionamento na cadeia de suprimentos está sendo normalizado, o que deve ajudar a segurar reajustes.

Nossas pesquisas apontam a expectativa de que no meio de 2022 a cadeia de suprimentos esteja totalmente normalizada. Esse é um dos fatores que nos levam a projetar uma inflação de 5% no ano.
Mário Sérgio Carraro Telles, gerente executivo de economia da CNI (Confederação Nacional da Indústria)

De fato, o índice de inflação que acompanha os preços no atacado e na indústria, o IGP-M, segue elevado, com 17,89% acumulados em 12 meses até novembro, mas vem recuando desde julho, quando bateu 37,06%.

O que pode realimentar a inflação

O economista da CNI tem uma das projeções mais baixas para a inflação em 2022 e admite que seu cenário considera apostas otimistas para alguns fatores que podem atrapalhar a desaceleração dos preços.

Petróleo: Entre esses fatores, Telles aposta na estabilidade nos preços do petróleo. Isso quer dizer que, se a cotação do barril do petróleo subir e levar a Petrobras a reajustar para cima os preços de gasolina e diesel, a inflação no Brasil deve se mostrar mais persistente.

Dólar: Se a moeda americana voltar a registrar picos que aproximem a cotação dos R$ 6,00, o impacto dessa valorização nos preços do atacado pode reacender o ciclo de reajustes no atacado, o que pode contaminar os índices de preços aos consumidores.

O governo nada tem feito para garantir algum tipo de estoque regulador para impedir a alta dos preços dos alimentos e muito menos gerencia de forma eficiente a crise hídrica, que deve manter o custo da energia elevado. Ao mesmo tempo, não pretende alterar a política de preços da Petrobras e, por isso, os preços dos combustíveis tendem a continuar nas alturas.
Fausto Augusto Junior, diretor técnico do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos)