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PIB de 2021 animou governo, mas analistas estão pessimistas com este ano

Depois de avanço de 4,6% do PIB em 2021, economistas projetam resultado próximo de zero este ano - Getty Images/iStockphoto
Depois de avanço de 4,6% do PIB em 2021, economistas projetam resultado próximo de zero este ano Imagem: Getty Images/iStockphoto

Fabrício de Castro

Do UOL, em Brasília

15/03/2022 04h00

Mesmo após o crescimento de 4,6% no ano passado, economistas mantêm uma postura cautelosa em relação ao PIB (Produto Interno Bruto) do Brasil em 2022. Enquanto o Ministério da Economia demonstra otimismo com a retomada pós-pandemia, analistas de fora do governo falam em estagnação (PIB próximo de zero) ou mesmo recessão (resultado negativo) neste ano.

Por trás disso estão as preocupações com os efeitos da guerra entre Rússia e Ucrânia sobre a economia global e, especificamente, brasileira. Inflação acelerada, juros mais altos, combustíveis caros —estes são alguns dos fatores que podem impactar de forma negativa o PIB.

Professor da UnB (Universidade de Brasília), o economista José Luis Oreiro afirma que já estava pessimista com a economia brasileira em 2022 antes mesmo da guerra no leste europeu.

Agora, as coisas ficaram piores com a guerra. Há um sentimento de incerteza, e a incerteza leva à postergação dos gastos com investimentos. Além disso, teremos um aumento considerável dos preços dos alimentos e da energia, em especial do petróleo.
José Luis Oreiro, economista

Impulso para 2022

Na sexta-feira (4), o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) informou que o PIB brasileiro cresceu 4,6% em 2021. O resultado foi comemorado pelo governo, que viu nele um sinal de recuperação após a queda de 3,9% em 2020, no auge da pandemia.

Mais do que isso, o governo calcula que o desempenho já traz um "carregamento" positivo de 0,3% para o PIB em 2022. Este "carregamento" é uma espécie de impulso para a economia no ano seguinte.

Oreiro afirma, porém, que o crescimento de 4,6% em 2021 veio dentro das expectativas. "Além disso, boa parte deste PIB se deve ao carregamento estatístico de 2020. A economia cedeu em 2020, e isso deixava um carregamento estatístico de 3% para 2021."

Em outras palavras, como o tombo foi grande em 2020, era de se esperar uma recuperação forte em 2021.

A visão no mercado financeiro é de que esta recuperação forte não vai continuar. Os dados abaixo mostram os resultados do PIB nos últimos anos (medidos pelo IBGE) e as projeções do mercado financeiro para os anos de 2022 e 2023 (conforme o boletim Focus do Banco Central):

PIB do Brasil

  • 2014: +0,5%
  • 2015: -3,5%
  • 2016: -3,3%
  • 2017: +1,3%
  • 2018: +1,8%
  • 2019: +1,2%
  • 2020: -3,9%
  • 2021: +4,6%
  • 2022: +0,42% (projeção)
  • 2023: +1,5% (projeção)

Apesar das projeções mais recentes, Oreiro afirma que o PIB brasileiro ainda tende a encerrar 2022 no território negativo, com baixa de 0,2% ou 0,3%.

Oficialmente, o Banco Central projeta crescimento de 1% em 2022, enquanto o Ministério da Economia espera por 2,1%. Estes cálculos, no entanto, são anteriores à divulgação do PIB de 2021 e à guerra na Ucrânia. Os porcentuais serão atualizados nas próximas semanas.

Um pouco melhor, mas nem tanto

Economistas ouvidos pelo UOL afirmam que o PIB deste ano, considerando o resultado de 2021, pode ser um pouco melhor, mas é improvável que surpreenda positivamente.

O economista chefe da Greenbay Investimentos, Flavio Serrano, vinha trabalhando com a perspectiva de retração de 0,5% do PIB este ano. Agora, ele vê um resultado mais próximo de zero.

"Na verdade, estamos estagnados. Não acho que estamos caminhando para um cenário de retração muito forte", afirma Serrano. "Teremos um resultado um pouco melhor para 2022, mas não houve mudança muito grande."

O economista lista três fatores que pressionam o PIB brasileiro: a alta de juros para combater a inflação, a guerra na Ucrânia e a incerteza em ano eleitoral.

Desde março do ano passado, o BC vem elevando a Selic (a taxa básica de juros) para segurar a inflação. Atualmente em 10,75% ao ano, a taxa deve chegar pelo menos a 12,25% em maio, pelos cálculos do mercado. De acordo com Serrano, os juros mais elevados vão impactar negativamente o crescimento no segundo e no terceiro trimestre de 2022.

A guerra na Ucrânia, por sua vez, tem o efeito de elevar os preços de commodities no mercado internacional, como os alimentos. No curto prazo, isso serve de estímulo ao PIB do Brasil, que é grande exportador de alimentos.

O problema é que o petróleo no patamar atual, de US$ 120 ou US$ 130 o barril, tem um potencial de desaceleração da economia global muito forte. A partir de US$ 90 ou US$ 100, o petróleo começa a ser recessivo. As empresas começam a diminuir a produção, porque o custo não compensa
Flavio Serrano, economista da Greenbay Investimentos

Internamente, a escalada nos preços do petróleo afeta diretamente o valor do diesel e da gasolina, por exemplo. Isso representa mais custos de transporte.

Incerteza sobre a guerra

O economista chefe do C6 Bank, Felipe Salles, projetava crescimento de apenas 0,5% para o PIB em 2022. Com o resultado de 2021 divulgado pelo IBGE, aliado a outros indicadores econômicos mais positivos, a instituição está reavaliando o cenário.

"Nossos modelos já começam a dar algo em torno de 1% para o PIB este ano. Vamos revisar a projeção para 1%? Os modelos servem para ajudar a gente pensar", afirma Salles, demonstrando cautela.

Segundo ele, uma das dificuldades para calcular o PIB é a incerteza sobre a guerra na Ucrânia.

Não sabemos qual será a duração da guerra, nem seus efeitos. Mas já sabemos a direção que o conflito tem no PIB, que é para baixo. É direção de menos crescimento. Há dois fatores que já podemos colocar na conta: o crescimento global menor e o impacto no PIB agrícola
Felipe Salles, economista chefe do C6 Bank

Salles lembra que o agronegócio brasileiro é dependente da importação de fertilizantes da Rússia. Com as compras dificultadas, toda uma cadeia de valor pode ser prejudicada. "Há efeitos diretos e indiretos, sobre a produção agrícola e sobre a indústria de máquinas", exemplifica.

Eleição também pesa

Além da pressão vinda do exterior, o Brasil possui suas questões internas. Flavio Serrano, da Greenbay Investimentos, lembra que em anos eleitorais há dúvidas sobre o futuro, o que impacta a economia.

"Os preços de mercado estão apontando para um crescimento não muito bom. Em um ambiente recheado de incertezas, as empresas estão caminhando para uma postura defensiva", afirma.

Para Felipe Salles, do C6 Bank, os riscos para o PIB ligados ao exterior possuem maior peso, este ano, que a questão eleitoral.

"Isso por conta dos dois candidatos mais bem colocados nas pesquisas. Um deles é o atual chefe do Executivo [presidente Jair Bolsonaro]. O outro já foi presidente [Luiz Inácio Lula da Silva]", afirma Salles. "Já vimos como eles pensam, como operam, o que diminui a incerteza."