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Lula diz bobagens, mas é melhor que Bolsonaro, diz Maílson da Nóbrega

Do UOL, em São Paulo

07/10/2022 04h00

O economista Maílson da Nóbrega, ex-ministro da Fazenda (1988-90) do governo José Sarney, declarou apoio à candidatura de Simone Tebet (MDB) no primeiro turno das eleições presidenciais. Agora, diz ainda não saber qual será seu voto, mas afirma que decidiu não votar em Jair Bolsonaro (PL).

Em entrevista ao UOL, ele critica as ideias de Lula para a economia e concorda com as propostas de Paulo Guedes, ministro da Economia de Bolsonaro. Ainda assim, diz que Lula tem mais condições de governar o país. "Uma das contribuições de Bolsonaro ao ambiente político brasileiro é mostrar que a figura relevante em questões econômicas para o país é o presidente, e não o ministro da Economia".

Leia os principais trechos da entrevista.

UOL - O senhor apoiou a candidata Simone Tebet no primeiro turno. E no segundo turno?

Maílson da Nóbrega - Eu ainda não sei o que vou fazer, mas sei que não vou votar no Bolsonaro.

Não sabe se vai votar nulo ou no Lula?

Isso. O Lula precisa mudar muito o discurso para me conquistar. Ele está dizendo muita bobagem. Quer acabar com o teto de gastos, interferir no mercado de exportação de carne para direcionar uma parte para o mercado interno.

O Brasil é um grande exportador de commodities, e isso pressupõe um país que cumpre contratos, que observa as regras do jogo, você não pode interferir no mercado de exportação obrigando algumas empresas a violar contratos. É inacreditável que a essa altura do campeonato o Lula tenha uma ideia dessas.

Outra ideia que eu acho que ele vai ter que abandonar é a de abrasileirar os preços do petróleo. Em algum momento ele vai ter que dizer que abandona isso, como fez em 2002.

O programa do PT em 2002 era um horror, as ideias eram as mais antigas e inadequadas possíveis. O que o Lula fez? Jogou aquilo no lixo e continuou a política econômica do FHC, com tripé macroeconômico, câmbio flutuante e autonomia do Banco Central.

Grande parte do êxito do Lula foi isso, porque a gestão macroeconômica é responsável por parte relevante de qualquer administração bem-sucedida.

Os economistas ligados a Lula criticam o teto de gastos e querem buscar outra âncora fiscal, que permita ter responsabilidade fiscal, com aumento do investimento público e programas sociais. Isso é viável?

Não. Pode ser desejável. Mas você não faz o que quer quando tem um país em crise fiscal. O teto de gastos foi na minha opinião uma decisão heroica para interromper uma trajetória rumo ao desastre.

Se você olhar a Constituição de 1988, havia uma preocupação dos constituintes de resolver o problema da desigualdade, mas ninguém fez conta.

A Constituição se tornou uma grande conquista do ponto de vista de direitos e garantias individuais, mas ela foi um desastre fiscal. E se tornou uma fonte de inibição do potencial de crescimento do país na medida em que piorou a alocação de recursos e exigiu um esforço fiscal que não era compatível com o estágio de desenvolvimento do Brasil.

Qual a sua avaliação da política econômica do governo Bolsonaro e quais na sua visão são as perspectivas de um possível segundo mandato?

Uma coisa é você ter ideias, outra coisa é ter as condições de aprová-las e de implementá-las. Uma das contribuições do Bolsonaro ao ambiente político brasileiro é mostrar que a figura relevante em questões econômicas para o país é o presidente, e não o ministro da Economia.

Se o presidente não sabe articular, não sabe mobilizar a sociedade, não sabe negociar com o Congresso... Aliás, ele acha que o seu papel é enviar o projeto. Não basta mandar para o Congresso, você tem que lutar pela agenda.

Todas as ideias grandiosas do Paulo Guedes ou quase todas se frustraram. Alguma coisa que avançou em parte se deve ao trabalho anterior do Temer, como é o caso da reforma da Previdência, do Pix.

Então eu acho que, a não ser que o Bolsonaro se transforme num verdadeiro líder político, vai ser mais do mesmo. Ele não defende a sua agenda, e o Paulo Guedes continua falando nos auditórios em um mundo paralelo.

Suas críticas são mais duras às propostas de Lula do que à gestão Bolsonaro. Por que então diz que vai votar nulo ou em Lula?

Acho que o ingrediente fundamental para o êxito de gestão econômica no Brasil é o presidente. Tenho minhas restrições a Lula, tenho críticas, mas eu acho que o Lula reúne melhores condições de articulação e de formação de maiorias do que o Bolsonaro.

O Lula já provou que, como operador político, é melhor que Bolsonaro. Eu diria que nenhum dos dois reúne as condições neste momento de enfrentar a crise que está vindo aí, mas acho que Lula tem condições melhores.

O Bolsonaro tem as boas ideias econômicas do Paulo Guedes, que dificilmente vai sugerir controlar a exportação de carne, mas há outros problemas, porque o Guedes se tornou submisso à vontade de Bolsonaro.

O mercado financeiro e o empresariado estão mais pró-Lula ou pró-Bolsonaro?

Acho que estão tendendo mais para o Bolsonaro. Se você olhar a reação da Bolsa de Valores isso é claro. A Bolsa mostrou que tem uma opção pelo Bolsonaro, que é uma visão de curto prazo.

Nesse mercado é impressionante o número das pessoas que acha que o que resolve é um bom ministro da Economia. Mas o presidente é o timoneiro, é ele que orienta o navio, as outras partes têm que ser boas também, mas não são fundamentais.

Acho que o Lula não tem alternativa senão caminhar para o centro. Voltar a ideias que já se mostraram equivocadas no passado, foram testadas no governo Dilma e deram errado não é uma boa saída para ele.

O que Lula precisa fazer para atrair essa parcela do eleitorado e inclusive para convencer o senhor?

Ele deveria parar de falar as besteiras que ele vem falando, esses erros conceituais que está cometendo. Tem muita gente dizendo que ele tem que indicar quem vai ser o ministro da Fazenda antes das eleições. Acho muito pouco provável que ele faça isso.

Porque isso atende a uma parcela diminuta do eleitorado, que são jornalistas, economistas, empresários. Esse povo todo junto não dá 10% do eleitorado.

O objetivo dele agora não é contentar, em três semanas, uma parcela do eleitorado mais bem informada. Ele vai expor as ideias dele e o ministro da Economia se ganhar a eleição.