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Análise: "Efeito China" revive México e ofusca Brasil

Pablo Garibian e Krista Hughes

21/09/2012 12h39

CIDADE DO MÉXICO, 20 Set (Reuters) - O México começa a substituir o Brasil como o rei dos mercados latino-americanos pela mesma razão pela qual havia sido relegado a segundo plano na região: a China.

Enquanto a economia mexicana ganha competitividade e cresce lentamente, sob a mão firme da demanda dos Estados Unidos, onde começa a roubar mercado da China, o Brasil desacelera devido a um menor apetite de Pequim por matérias-primas.

Por isso os investidores estrangeiros em carteira continuam aumentando sua exposição ao México e reduzindo suas apostas no Brasil, que é vulnerável ao risco de uma eventual queda mais profunda no ritmo da economia chinesa.

Nos primeiros sete meses do ano, a Bovespa recebeu um fluxo líquido de investimento estrangeiro de US$ 2,9 bilhões, que foi superado pelos US$ 3,4 bilhões que entraram no mercado mexicano, segundo dados dos bancos centrais de ambos os países.

No ano passado, o balanço havia sido muito diferente: o Brasil havia captado US$ 7,1 bilhões, enquanto o México teve que absorver a saída de US$ 6,2 bilhões. E em 2010, o mercado acionário brasileiro atraiu US$ 37,7 bilhões frente aos modestos US$ 640 milhões de seu similar mexicano.

"O investidor estrangeiro, que não tem coração ou emoção, (...) sempre vai onde está a melhor oportunidade econômica e, de repente, o Brasil já não parece ser a melhor oportunidade", disse Luis Maizel, que supervisiona US$ 7 bilhões investidos por fundos da LM Capital Management. 

Desde que a China se juntou à Organização Mundial do Comércio (OMC) em 2001, o crescimento do Brasil disparou, baseado no que parecia uma demanda insaciável da potência asiática por suas matérias-primas, enquanto as indústrias mexicanas lutavam nos Estados Unidos contra produtos baratos chineses.

Com um novo governo que promete reformas para acelerar o crescimento, o México espera consolidar uma tendência favorável em momentos em que a perda de intensidade do Brasil coincide com a menor taxa de expansão da segunda maior economia do mundo.

"O pêndulo oscilou de volta a favor do México", disse o administrador de fundos da Batterymarch Financial Management Inc. Claudio Brocado, cuja firma ajuda a supervisionar US$ 5,9 bilhões investidos em ações de países emergentes. 

"(O pêndulo) Havia oscilado muito na direção contrária", disse.

Muitos esperam que a maior economia latino-americana se recupere nos próximos trimestres pelo arsenal de medidas do governo para reativar o crescimento e pela onda de investimentos em infraestrutura para a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016.

Dados da consultoria EPFR Global, que monitora a atividade dos fundos de investimento, mostraram que, na semana passada, o Brasil teve a maior entrada de fluxo para o mercado de ações em três meses, após a aprovação na China de um plano de infraestrutura de US$ 150 bilhões para reativar sua atividade. 

Saindo da sombra    

O Brasil cresceu a taxas quase duas vezes maiores que as do México na última década, até ganhar o lugar do país como a maior economia latino-americana em 2005, convertendo-se no país de consenso dos mercados.

Mas o México começa a brilhar, e não apenas pelo tempo nublado no Brasil. Enquanto a economia se encaminha a uma expansão maior que a brasileira pelo segundo ano consecutivo --algo que não ocorria desde 1999--, a competitividade de suas indústrias cresce.

A diferença entre custos trabalhistas no México e na China caiu a 7% em 2011, ante 238% registrados em 2002, segundo a Moody's. E seus laços com os EUA, país que está saindo da crise melhor que outros países desenvolvidos, o colocam como uma opção menos vulnerável à tempestade global.

Por isso, seus produtos estão recuperando espaço entre os norte-americanos. A participação de mercado havia caído 9,5% em 2005 por conta China, mas situava-se em 13% no início deste ano. 

O Barclays assegura que, além da proximidade com os Estados Unidos, o México tem a vantagem de uma crescente especialização em setores de muito valor agregado, como o automotivo e de telecomunicações, o que ajuda as montadoras a recuperar terreno frente à China. 

Grandes produtos podem demorar entre quatro e cinco semanas para chegar da China aos EUA.  

Mas a canadense Bombardier Inc , por exemplo, pode mandar por via terrestre um avião Learjet 85 quase concluído a partir de sua fábrica no estado mexicano de Querétaro para ser montado em Kansas em apenas dois dias, segundo o diretor de qualidade da filial mexicana, Norman Thompson.

Exposição desfavorável

O crescimento da China de mais de 7% anuais ainda dá ao país alguma vantagem sobre Estados Unidos e México, mas caiu quase à metade desde a crise, e provavelmente seguirá nos níveis atuais, porque Pequim busca uma taxa de expansão menos explosiva, embora mais sustentável.

A China reduziu sua demanda de produtos primários: os envios de minério de ferro e petróleo brasileiros a seu parceiro asiático, dois dos seus principais produtos vendidos à China, caíram 21% e 13%, respectivamente, até agora no ano, em comparação com o mesmo período de 2011.

"Os fluxos agora estão sendo impulsionados pela percepção de que o vagão do Brasil está muito dependente da China, que está em desaceleração e mudando sua orientação de uma forma que reduz sua intensidade em matérias-primas e energia", afirmou Frances Hudson, estrategista da Standard Life, que tem cerca de US$ 260 bilhões em ativos investidos pelo mundo. 

A estratégia da presidente Dilma Rousseff aponta, em parte, ao reforço do consumo doméstico com desonerações tributárias e uma agressiva política de redução das taxas de juros para reativar o crédito.

Mas, do ponto de vista do investidor financeiro, a composição do principal índice acionário da Bovespa, o Ibovespa, não ajuda. Cerca de 40% do índice está ligado a empresas que produzem matérias-primas. 

No México, por sua vez, dois terços do principal índice, o IPC, são compostos por papéis vinculados ao consumo, como telecomunicações, varejistas e bebidas. 

Para Claudio Brocado, isso explica em parte o porquê de o índice IPC ter avançado quase 9% neste ano e se encaminhar a um nível recorde frente aos 7% de ganhos do Ibovespa.

"O índice no México é mais defensivo", completou Brocado, fazendo alusão às ações que distribuem dividendos de maneira constante e divulgam lucros estáveis. "A composição do índice favoreceu o México no que diz respeito a desempenho relativo."

Os fundos de investimento com foco no Brasil tiveram retorno médio de 6,74% nos primeiros oito meses do ano, frente a 8,17% dos voltados ao México, de acordo com dados da Lipper, uma empresa da Thomson Reuters.

Os investidores estrangeiros também estão mergulhando nos mercados de bônus e Euan Munro, que supervisiona um portfólio de US$ 27,3 bilhões, disse que está protegendo sua carteira contra os riscos da China e nivelando-a com mais exposição aos EUA e mantendo bônus mexicanos.

"Favorecemos o México dentro dos mercados emergentes por sua avaliação e fundamentos", disse Munro. 

México muito caro

O Brasil ainda representa dois terços dos US$ 4,7 bilhões do fundo latino-americano administrado por William Landers para a BlackRock, mas nos últimos tempos foi elevada a exposição do fundo a ações mais vinculadas ao consumo em vez das que podem ser afetadas pela China.

Landers avaliou que a desaceleração chinesa tem muito peso no mercado brasileiro, em grande parte pela mineradora Vale, maior exportadora de minério de ferro do mundo. O preço das ações da Vale caiu ao ritmo dos preços chineses da matéria-prima. 

No México, a BlackRock escolheu apostar na empresa de bebidas Femsa, proprietária das lojas de conveniência Oxxo, e na gigante da telefonia celular América Móvil, que se beneficiam diretamente dos laços mexicanos com os Estados Unidos. 

Mas a alta das ações mexicanas as deixou caras frente a similares brasileiras. O índice composto MSCI México era cotado na sexta-feira a uma proporção preço/lucro de 16,5 vezes, ante 10,4 vezes do MSCI Brasil.    

Para a administradora de fundos Audry Kaplan, da Federated Investors, que administra um fundo de renda variável de US$ 500 milhões, as ações brasileiras são uma boa compra, tendo em vista os prognósticos de lucro médio entre 18 e 20% para o próximo ano. 

"Isso dá uma oportunidade para entrar quando o mercado está mais em baixa", completou.

Uma das coisas sobre o Brasil que incomoda aos investidores de carteira são os controles sobre o capital especulativo impostos pelo governo para frear a alta do real, como o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).

"Se pudéssemos ter acesso aos mercados brasileiros, e nossos colegas também, acredito que haveria mais dinheiro fluindo ao Brasil porque as taxas são terrivelmente atraentes", avaliou Edwin Gutiérrez, administrador de fundos na Aberdeen Asset Management.

"Há uma grande bandeira (no México) dizendo 'venham', enquanto no Brasil há um sinal de pare", acrescentou.