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Adotar meta de inflação muito menor em 2019, de 4%, seria arriscado, dizem analistas

23/06/2017 12h01

Por Luiz Guilherme Gerbelli

SÃO PAULO (Reuters) - O Banco Central correrá menos riscos para conduzir a política monetária se o Conselho Monetário Nacional (CMN) decidir adotar a meta de inflação de 4,25 por cento para 2019, e não de 4 por cento, segundo analistas consultados pela Reuters.

O principal argumento é que a fraqueza política enfrentada pelo governo desde que o presidente Michel Temer foi citado em delações de executivos do grupo J&F pode afetar o andamento de reformas importantes, como a da Previdência, considerada fundamental para colocar as contas públicas em ordem.

"Indiscutivelmente há mais dificuldade para fazer o ajuste fiscal. Eu não sei a médio e longo prazo como vai ficar a cara da política fiscal, e a boa política monetária precisa ter um respaldo do campo fiscal", afirmou o chefe do Centro de Estudos Monetários do Ibre/FGV e ex-diretor do BC, José Júlio Senna.

Na próxima semana, o CMN define a meta de inflação para 2019 e, dentro da equipe econômica, já há consenso de que ela será menor do que nos anos anteriores. Desde 2005, o centro do objetivo está em 4,5 por cento pelo IPCA, variando apenas a banda de oscilação, que já foi de 2,5 pontos percentuais e passou a ser de 1,5 ponto para 2017 e 2018.

A discussão pela redução da meta tem sido justificada pelos bons números colhidos pela equipe econômica nos índices e nas expectativas de inflação. Neste ano, por exemplo, os analistas consultados pelo relatório Focus, do BC, esperam que o IPCA suba 3,64 por cento, bem abaixo da meta do governo. Para 2018, a projeção é de 4,33 por cento e de 4,25 por cento no ano seguinte.

Os economistas também projetam que a taxa básica de juros encerre em 8,50 por cento tanto neste como no próximo ano. Hoje, ela está em 10,25 por cento e o BC tem sido claro que o rumo da política monetária dependerá de diversos fatores, inclusive o político, após a crise envolvendo o atual governo.

Se as reformas não forem adiante ou forem aprovadas de maneira ainda mais desidratadas, o Brasil pode ver uma deterioração nos preços dos ativos diante da percepção de aumento de risco com a piora fiscal. A principal consequência desse quadro seria o avanço do dólar ante o real, com impacto inflacionário e, portanto, obrigaria o BC a subir ou reduzir menos os juros para cumprir a meta de inflação. Esse cenário teria impacto também na atividade econômica, com juros atrapalhando o consumo e os investimentos.

A opção pelo movimento mais gradual na meta também tem como base a conjuntura atual de inflação que pode não se repetir no futuro. Essa combinação favorável tem sido composta pela forte recessão que se arrasta desde o fim de 2014, pela queda nos preços dos alimentos e pela elevada credibilidade do BC liderado por Ilan Goldfajn.

"A queda da inflação está relacionada com alguns fatores pontuais, então seria interessante se o Brasil conseguisse reduzir a meta de inflação de uma forma consistente. Eu acho que o famoso devagar e sempre é melhor", afirmou a economista e sócia da consultoria Tendências, Alessandra Ribeiro, para quem o centro da meta poderia ser de 4 por cento apenas para 2020.

A incerteza política não está restrita apenas ao quadro atual, ressaltaram os especialistas que veem a adoção de uma meta de inflação de 4 por cento arriscada. A eleição presidencial do ano que vem também traz dúvidas porque, por ora, as pesquisas de intenção de voto não apontam a vitória de possíveis candidatos com discursos reformistas.

"Trabalhar com uma meta de 4,25 por cento me parece razoável nesse novo contexto e é uma sinalização importante de agenda, mesmo que seja possível que tudo seja revertido em 2019 se algum candidato populista vencer a eleição", disse o economista-chefe de consultoria MB Associados, Sergio Vale.

Mas há quem ache que uma ousadia maior do CMN --formado pelos ministros da Fazenda e do Planejamento, além do presidente do BC-- seria bem vinda, diante da fraqueza da inflação.

"O cenário de inflação é benigno e não há tantos motivos para segurar o passo", afirma o economista do banco BNP Paribas Gustavo Arruda. "Se o CMN decidir reduzir a meta para 4 por cento, muito provavelmente o mercado ancoraria as suas expectativas ao redor desse número em pouco tempo dada a credibilidade do BC", acrescentou.