Cade pode encerrar alguns processos da Lava Jato apenas com acordos, diz superintendente
Por Iuri Dantas
SÃO PAULO (Reuters) - A agência antitruste brasileira não concluiu nenhuma investigação contra as empresas envolvidas na Lava Jato, e não descarta encerrar processos apenas por meio de acordos ainda em negociação, disse à Reuters o superintendente-geral do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), Alexandre Cordeiro.
O Cade apura mais de 14 diferentes cartéis da Lava Jato e assinou em cada um deles acordos de leniência, por meio dos quais as empresas escapam de sanções por colaborar com as investigações. Uma modalidade diferente de acordo permite pagar multas mais baixas.
"É bem possível que se possa encerrar um caso ou outro por acordo ... desde que se enquadre na conveniência e oportunidade da administração pública", afirmou Cordeiro em entrevista na segunda-feira.
O primeiro acordo do Cade na Lava Jato foi assinado em março de 2015 e, de lá para cá, nenhum processo foi remetido ao tribunal para julgamento e aplicação de multas, que podem chegar a 20 por cento do faturamento bruto anual das empresas. Os processos em que houve acordo de leniência continuam sob investigação.
"Os casos da Lava Jato envolvem uma série de questões, os acordos são feitos não só em um caso e têm relação com outro, tem que negociar ao mesmo tempo três, quatro processos ... precisa de mais qualidade do que pressa", apontou Cordeiro.
Integrante da força-tarefa da Lava Jato, em conjunto com o Ministério Público e a Receita Federal, o superintendente nega demora nas investigações e avalia que os acordos encaminham uma solução parcial, uma vez que retira parte dos investigados do processo.
"Na verdade não demora, muitos acordos já subiram para o tribunal. Evidentemente o caso não está encerrado", argumentou. "Existem ainda casos em que acordos estão sendo feitos e não estão maduros para serem levados ao tribunal", apontou.
Cordeiro chegou ao Cade em julho de 2015 como conselheiro do tribunal administrativo, e em novembro do ano passado assumiu a Superintendência-Geral com uma proposta de continuidade do trabalho. Desde a publicação de uma nova lei com regras sobre fusões e condutas anticompetitivas, a agência enfatiza a solução negociada dos casos.
No ano passado, foram assinados 31 acordos de leniência, ante 23 no ano anterior, ao mesmo tempo em que o tribunal administrativo homologou 70 Termos de Compromisso de Cessação (TCC), contra 54 em 2016, nos quais as companhias têm multas reduzidas.
Se por um lado a administração pública deixa de recolher multas das empresas que assinam acordos de leniência, por outro produz um número maior de provas contra outros participantes de cartel, que firmam acordos e pagam contribuições imediatamente ou são punidos com multas pelo tribunal administrativo.
Até o momento, o Cade já assinou leniência com os grupos Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa e Setal/SOG. Odebrecht, OAS e Carioca Engenharia assinaram duas leniências cada uma.
"A quantidade de acordos demonstra a capacidade de enforcement (fazer cumprir a legislação)", afirmou o superintendente-geral. "O enforcement do Cade é dado pela capacidade de investigação, seja pelo instrumento da leniência, seja por outros instrumentos que faz com que as pessoas se preocupem com o resultado final e corram para fazer acordo, se ninguém se preocupasse com decisão final, ninguém faria acordo."
FUSÕES E AQUISIÇÕES
As grandes operações societárias, nas quais ao menos uma das empresas faturou mais que 30 milhões de reais, caíram 5,14 por cento em 2017, para 369 ante 389 transações, variação que representa "equilíbrio" na avaliação do superintendente-geral da autarquia e não guarda relação com as incertezas políticas do país.
"Uma instabilidade política gera incerteza e insegurança por parte do investidor, que prefere que as coisas acalmem e isso por óbvio vai se refletir em investimentos que querem fazer no Brasil", assinalou.
"A despeito disso, a gente não percebe uma mudança ou um arrefecimento do numero de operações ... têm caminhado num certo equilíbrio, mesmo com a crise."
A indefinição do período eleitoral tampouco deve representar um fator negativo para compras e vendas de ativos, segundo o superintendente, que traça um cenário positivo com base em contatos que mantém constantemente com o setor privado. "As perspectivas são muito boas para este ano de 2018", afirmou.
"Os advogados estão com bastante demanda, pela perspectiva do desenvolvimento da economia, muito embora seja ano de eleição. Isso preocupa um pouco, mas o país voltou a crescer, estamos saindo da recessão, várias reformas importantes com perspectivas de serem aprovadas."
Após as grandes operações no setor bancário, com a aquisição das atividades brasileiras do HSBC pelo Bradesco e de unidades do Citi pelo Itaú Unibanco, Cordeiro aposta no setor de tecnologia aplicada e agroindústria como possíveis destaques neste ano.
Questionado sobre operações como a que envolveu a compra do controle da brasileira 99 pela chinesa Didi e a aquisição da rede social LinkedIn pela Microsoft, Cordeiro disse que não comenta casos específicos. Apesar disso, ele afirmou que o Cade mantém contato permanente com agências dos EUA e da Europa e, da mesma forma que no exterior, enfrenta desafios na análise de fusões envolvendo startups e empresas disruptivas, que também prometem fôlego em 2018.
"É uma tendência mundial de autoridades antitruste se preocupar com isso, economia digital, aplicativos de compartilhamento, economia disruptiva."
Uma das principais preocupações do Cade é avaliar a concorrência potencial que empresas recém-abertas podem oferecer a grandes grupos que tentam comprá-las, por exemplo, citou Cordeiro.
Um setor que deve experimentar mudanças na análise antitruste será o sistema financeiro, regulado pelo Banco Central. A autoridade monetária e o Cade têm um grupo de trabalho conjunto que apontará diretrizes após conclusão de estudos que estão em andamento, disse o superintendente.
Depois de aprovar a venda de ativos no programa de desinvestimento da Petrobras, é possível que o Cade também avalie as operações relacionadas ao setor elétrico, com a privatização da Eletrobras, sinalizou Cordeiro.
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