ANÁLISE-O que leva a elite empresarial a acenar para Bolsonaro
Por Tatiana Bautzer, Marcela Ayres e Christian Plumb
SÃO PAULO/BRASÍLIA, 1 Out (Reuters) - O empresariado no Brasil está silenciosamente torcendo para que o candidato presidencial de extrema-direita Jair Bolsonaro (PSL) conquiste o cargo mais alto do país neste mês, temendo um retorno de um governo de esquerda na maior economia da América Latina.
Os mercados de câmbio e de ações do país têm reagido positivamente a pesquisas de intenção de voto favoráveis a Bolsonaro, um parlamentar mais conhecido por suas declarações contra gays e negros do que pela defesa do livre mercado. Ao longo de uma carreira legislativa de 27 anos, Bolsonaro votou repetidamente para preservar os monopólios estatais e contra reformar o sistema previdenciário.
Mas sua escolha por um respeitado economista que estudou na Universidade de Chicago, Paulo Guedes, como seu assessor econômico, foi encarada como suficiente para muitos investidores e empresários. Alguns vêem Bolsonaro como uma alternativa menos pior em uma corrida que está se consolidando como um confronto entre extremos à direita e à esquerda.
Pesquisas estão prevendo um segundo turno entre Bolsonaro e o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad, candidato do PT que vem sistematicamente subindo nas pesquisas. Muitos economistas culpam a política econômica do PT, que governou o Brasil por boa parte dos últimos 15 anos, de ter lançado o país em uma recessão profunda, cujos vestígios ainda pesam sobre a economia.
Luciano Hang, proprietário da rede de lojas de departamentos Havan, é um dos poucos executivos a apoiar abertamente Bolsonaro, cuja admiração já expressa pelo período de ditadura militar no Brasil e declarações polêmicas sobre mulheres e minorias afastaram grandes faixas do eleitorado.
Ainda assim, Hang estima que "mais de 80 por cento" das pessoas em um grupo de empresários de 300 membros ao qual ele pertence estão apoiando Bolsonaro, agora que candidatos mais moderados parecem estar se desidratando.
"Empresários e empreendedores de todo o Brasil, em todos os segmentos, são Bolsonaro e vão trabalhar para ele (ganhar)", afirmou.
A crescente aceitação de Bolsonaro entre as elites empresariais do Brasil ressalta como uma paisagem política polarizada está levando os moderados a extremos, e como os mercados seguem instáveis, afetados por uma corrida aberta e imprevisível.
Os nervos acirrados já desaceleraram significativamente os mercados de fusões e aquisições e de aberturas de capital no país, tendo também levado o dólar a um novo recorde contra o real no mês passado.
Bolsonaro é o atual líder nas pesquisas entre os 13 candidatos à Presidência para o primeiro turno das eleições, no dia 7 de outubro, com 28 por cento da intenção de voto, de acordo com uma pesquisa divulgada na última sexta-feira pelo Datafolha.
Resta saber se essa predileção irá prevalecer. Se nenhum candidato obtiver a maioria no primeiro turno, como previsto, os dois primeiros colocados se enfrentarão em 28 de outubro, sendo que, nesse embate, a mesma pesquisa mostra Bolsonaro perdendo para Haddad por 6 pontos percentuais.
O petista tem se reunido com grandes investidores para acalmar temores de um retorno do PT ao poder. Haddad já manifestou posições ortodoxas em relação à inflação, taxa de câmbio e déficit fiscal.
Ainda assim, Haddad reconheceu que revogaria a reforma trabalhista e o teto de gastos implementado pelo impopular presidente Michel Temer. O petista também deixou claro que seu governo administraria a Petrobras
Recentemente, ele tuitou que o mercado "virou uma entidade abstrata que aterroriza o povo".
SUPERMINISTRO
Os admiradores de Bolsonaro no mundo corporativo, por sua vez, apontam a escolha de Guedes como um contraponto à retórica polarizadora de seu candidato, suas inclinações autoritárias e visões inconstantes sobre a economia brasileira. Bolsonaro, por exemplo, certa vez sugeriu que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso fosse fuzilado por privatizar antigas empresas do governo, incluindo a mineradora Vale
Em contraste, Guedes, que atualmente integra o comitê executivo da empresa de gestão de ativos Bozano Investimentos, é um feroz defensor da privatização da Petrobras e do Banco do Brasil
Se eleito, Bolsonaro prometeu fazer de Guedes uma espécie de superministro encarregado da Fazenda, do Planejamento e da Indústria e Comércio, com ampla liberdade para definir a política econômica.
Guedes realizou uma série de reuniões com bancos de investimento, executivos empresariais e investidores internacionais para persuadi-los a apoiar Bolsonaro. O banqueiro também se reuniu com membros do Ministério da Fazenda pelo menos três vezes em um esforço para sinalizar continuidade com a agenda de reformas de Temer, incluindo mudanças no insolvente sistema da Previdência.
"Paulo Guedes de fato dá muita credibilidade à candidatura de Bolsonaro", disse Claudio Pacini, chefe da negociação de ações brasileiras na corretora norte-americana INTL FCStone, em Miami. "Juntamente com o medo de ascensão da esquerda, as duas coisas trabalham a favor de Bolsonaro."
ALIANÇA EQUILIBRADA?
Alguns questionam, contudo, quanto tempo duraria a parceria Bolsonaro-Guedes, mesmo que o candidato seja eleito.
"Bolsonaro é um recém-convertido ao liberalismo pró-mercado --isso não é coisa dele, nunca foi coisa dele", disse Monica de Bolle, diretora do Programa de Estudos Latino-Americanos e Mercados Emergentes da Escola de Estudos Internacionais Avançados (Sais, na sigla em inglês), da Universidade Johns Hopkins, em Washington.
Essas dúvidas aumentaram, quando Guedes propôs reviver um imposto nos moldes da impopular CPMF, no âmbito de uma reforma tributária. A ideia foi rapidamente rechaçada por Bolsonaro, do hospital onde estava se recuperando de uma facada sofrida em um comício no mês passado.
Depois da polêmica, Guedes cancelou uma série de aparições públicas que teria, alimentando especulações de que havia sido, por ora, silenciado pela campanha.
Guedes se recusou a comentar o desacordo. Mas Monica de Bolle vê turbulência à frente.
"Parece óbvio que Paulo Guedes não duraria em um governo de Bolsonaro", disse a economista.
Muitos também se perguntam com que eficácia Bolsonaro pode governar se eleito. Em quase três décadas no Congresso, seu trabalho pouco apareceu. Seu Partido Social Liberal tem poucos deputados na Câmara. Ele precisaria articular alianças com outros partidos para fazer qualquer coisa, tarefa para a qual possui pouca experiência.
"O governo está falido, e Bolsonaro não tem aliados para pressionar por cortes orçamentários e nem mesmo um histórico de persegui-los", disse um executivo sênior de um dos maiores bancos do Brasil.
Para o empresariado, disse o executivo, o voto em Bolsonaro é uma escolha entre "o terrível e o extremamente terrível".
(Reportagem adicional de Iuri Dantas, Brad Brooks e Paula Arend Laier)
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