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Brasil pede compensações após salvaguarda da UE em aço e abre caminho para taxar leite

18/02/2019 19h19

Por Marcela Ayres

BRASÍLIA (Reuters) - O governo brasileiro pediu nesta segunda-feira compensações à União Europeia pelas salvaguardas às importações de aço impostas pelo bloco no início deste mês, numa medida que abrirá caminho para eventual aumento do imposto de importação sobre o leite em pó europeu, após imbróglio envolvendo a taxação do produto que colocou os ministérios da Economia e da Agricultura em lados opostos.

Segundo fonte ouvida pela Reuters, o pedido é por compensações que somam 180 milhões de euros, montante correspondente ao prejuízo do Brasil com os limites impostos pela UE para importações de aço. Com a investida, a UE buscou minimizar preocupações de produtores locais sobre um eventual excesso de oferta nos mercados europeus por produtos siderúrgicos que não estão mais sendo importados pelos Estados Unidos.

Se a UE concordar com as compensações, ela irá, na prática, aumentar a compra de produtos que o Brasil exporta à região, somando os 180 milhões de euros. Caso contrário, o Brasil poderá lançar mão de medidas de defesa comercial, como aumento de impostos de importação e imposição de cotas --pavimentando, portanto, o caminho para subir o imposto de importação sobre o leite em pó do bloco.

Para tanto, o governo já encaminhou uma notificação à Organização Mundial do Comércio (OMC) de que poderá adotar "adotar medidas de forma a reequilibrar o seu comércio com a União Europeia, ante o impacto das medidas de salvaguarda no setor de aço", conformou assinalou nota conjunta divulgada nesta segunda-feira pelos ministérios das Relações Exteriores, da Economia e da Agricultura.

"O governo brasileiro permanece aberto ao diálogo com a União Europeia, a fim de buscar o melhor encaminhamento para essas questões. Reitera também sua disposição de seguir defendendo com todo o empenho os interesses dos produtores e exportadores brasileiros", trouxe a nota.

Em condição de anonimato, a fonte que falou à Reuters ponderou que o impacto da questão do leite é ínfimo e não acende o sinal amarelo entre a equipe econômica em relação a uma possível ameaça aos produtores do Brasil. Isso porque as importações de leite em pó da UE correspondem a cerca de 500 mil dólares em um ano, volume considerado muito baixo.

Desde que uma tarifa antidumping ao leite europeu caiu, há duas semanas, não houve nenhuma compra de leite em pó da região, acrescentou a fonte. O governo também dispõe de mecanismos para avaliar, numa base diária, se a UE está desovando estoques para o país e pode agir imediatamente, pelo mecanismo de salvaguardas preliminares, para impedir o movimento.

Entidades que representam produtores, por outro lado, defendem que a Europa tem um volume de leite estocado muito grande e que o risco iminente de entrada do produto no país desequilibraria os preços localmente, prejudicando os produtores brasileiros.

O deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), inclusive, apresentou projeto de decreto legislativo para sustar os efeitos do fim da tarifa antidumping sobre a importação do produto, alegando risco de o país receber o excedente produzido pela UE.

"Atualmente, estima-se um estoque de aproximadamente 400 mil toneladas de leite em pó naquela região. Ver um mercado consumidor do tamanho do Brasil para escoar esse excedente seria muito interessante para eles. A partir do momento que há competição internamente com um produto que é subsidiado lá fora, isso traz uma insegurança para o produtor brasileiro", justificou Lopes no projeto.

Ele avaliou ainda que a oferta de leite no país depende de milhares de pequenos produtores e que esses seriam os principais prejudicados.

HISTÓRICO

No início deste mês, o Ministério da Economia suspendeu o antidumping cobrado sobre o leite em pó não fracionado, que não é destinado ao varejo, importado da Nova Zelândia e da União Europeia.

Na prática, a medida tornava mais barata a compra dos produtos dessas localidades e tinha como pano de fundo a avaliação do Ministério da Economia de que não havia motivo para a manutenção da sobretaxa, que era de 3,9 por cento para Nova Zelândia e de 14,8 por cento para a UE.

Em robusto relatório, a Secretaria de Comércio Exterior apontou que não havia base para verificar se de fato Nova Zelândia e UE vinham praticando dumping, prática comercial considerada desleal por implicar a fixação de um preço de exportação inferior ao praticado nas vendas para o mercado interno.

Isso porque o Brasil não comprou o produto da Nova Zelândia no período considerado para análise, de julho de 2016 a junho de 2017. Já as importações originárias da UE responderam por apenas 0,1 por cento do total importado pelo país.

Mesmo assim, a decisão causou forte reação do Ministério da Agricultura, que se viu vitorioso no embate após alegar que a suspensão da tarifa ameaçava a produção local.

Na terça-feira da semana passada, o presidente Jair Bolsonaro sinalizou que o governo havia decidido manter "o nível de competitividade do produto com outros países". E a Frente Parlamentar da Agricultura (FPA) divulgou que uma medida seria publicada para aumentar o imposto de importação para o leite em pó, atualmente de 28 por cento, de modo a compensar integralmente o fim da tarifa antidumping, endurecimento destinado apenas para o produto europeu.

(Com reportagem adicional de Mateus Maia)