De favorita a pária: América Latina lidera perdas entre emergentes passado "boom" das commodities
Por Victor Borges
BRASÍLIA (Reuters) - Após um rali patrocinado pela íngreme escalada das commodities, a América Latina agora sofre a maior correção de preços de ativos dentre os mercados emergentes, sentindo mais a desaceleração chinesa num cenário já delicado pelo aperto monetário global e por incertezas políticas locais, disseram analistas.
Muitos países da região são exportadores líquidos de matérias-primas e, por isso, tiveram impulso com o forte aumento dos preços de produtos básicos por causa da guerra na Ucrânia, iniciada no fim de fevereiro.
Mas nas últimas várias semanas as matérias-primas entraram em rota descendente, à medida que aumentaram temores de demanda diante de riscos elevados de recessão global. A depreciação dessa classe de ativos tem pressionado os chamados termos de troca --razão entre preços de exportação e importação--, sugerindo declínio no fluxo de dólares.
A menor oferta de moeda é piorada pelo encarecimento do custo do dólar, conforme os Estados Unidos elevam os juros de forma expressiva e contínua.
Além disso, a China recorreu a novos lockdowns para conter surtos de Covid-19, o que nublou mais o cenário para a segunda maior economia do mundo, principal compradora dos insumos vendidos pela América Latina.
"Nossa visão é que uma recessão global deve significar que a América Latina provavelmente continuará com desempenho inferior", disseram Claudio Irigoyen e Christian Gonzalez Rojas, do Bank of America.
"Como tal, não é de surpreender que (as moedas de) países com grande exposição ao fator oferta de commodities --nomeadamente Chile, Colômbia e Brasil-- tenham experimentado as perdas mais expressivas, mesmo com um retorno significativo ajustado à volatilidade", completaram.
Apenas em julho, o dólar sobe 7,5% ante o peso colombiano, 5,1% frente ao real e 3,8% contra o peso chileno. As moedas da Colômbia e do Chile caíram a mínimas recordes recentemente, e o real está no menor valor em seis meses.
Desde o fim de maio, quando as commodities começaram a cair, as baixas das moedas e das ações latino-americanas são ainda mais acentuadas.
Para estrategistas do banco francês Société Générale, a depreciação das moedas regionais não deve parar, pelo menos no curto prazo, mesmo após as divisas de Chile, Colômbia e Brasil registrarem os piores desempenhos nos meses recentes.
"Enquanto a China luta para recuperar uma base econômica mais forte, as moedas dos importadores de commodities provavelmente superarão as dos exportadores de commodities", afirmam os especialistas.
O Goldman Sachs destaca que grande parte da desvalorização cambial é resultado de liquidações nos preços do cobre e petróleo, entre outras importantes matérias-primas, em meio a um cenário de ampla força do dólar.
Os analistas avaliaram que os bancos centrais da América Latina podem ter de recorrer a outras ferramentas além dos juros para defender suas divisas e citaram o programa de intervenção cambial do BC chileno no valor de 25 bilhões de dólares.
"Não descartamos que outros bancos centrais regionais também possam eventualmente anunciar programas de intervenção no mercado de câmbio se suas respectivas moedas continuarem a cair e se desviarem ainda mais do vetor de fundamentos macroeconômicos."
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