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Mudanças climáticas levam Museu da Vinha a mudar de lugar na França

26/01/2015 14h06

Gruissan, França, 26 Jan 2016 (AFP) - A elevação do nível do mar fez na França uma vítima particular: o banco genético mundial, o Museu da Vinha, uma incrível coleção de plantas de 54 países que deverá ser transferida de lugar para preservar o passado e preparar o futuro.

Ao pé de um penhasco de calcário branco, dominado por uma imponente torre de vigia de incêndio, pinheiros e mato se estendem por centenas de hectares de terras áridas, onde o cascalho é misturado com a argila seca e a areia se sobrepõe ao azul do Mar Mediterrâneo.

Aqui, em 16 hectares de terreno localizados em Gruissan, perto da cidade francesa de Narbonne (sul), será recriado o banco genético mundial da videira, cujas 7.500 mostras - estirpes, vinha selvagem e novas criações -, procedentes de 54 países diferentes, chegarão da famosa coleção de Vassal, cerca de 70 quilômetros ao norte.

Plantas ancestrais já esquecidas ou quase, como a Oeillade, o Verdabel ou Chatus; estirpes exóticas como o Mavrud e Melnik búlgaro; variedades clássicas, com o eterno Cabernet e inclusive criações, como as estirpes resistentes a doenças, fazem parte desta coleção.

O acervo representa "cerca de metade das variedades existentes" no mundo, destacou Thierry Lacombe, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisa Agronômica (Inra, na sigla em francês) de Montpellier (sul).

A coleção, batizada de "Louvre de la Vigne" (Louvre da Vinha), foi criada em 1949 em Vassal, um estreito litoral escolhido por suas areias, uma barreira natural contra a filoxera (doença causada por insetos), que dizimou as vinhas francesas no final do século XIX.

Com o passar do tempo, este banco de dados foi enriquecido "com aproximadamente 80 novas mostras a cada ano, procedentes da França e do exterior", acrescentou Lacombe, cientista entusiasta da coleção de Vassal.

"Isto funciona como a Biblioteca (Nacional) da França. Cada um deposita sua estirpe, mas de forma voluntária", declarou à AFP Hernan Ojeda, diretor de unidades experimentais do Inra em Gruissan e Vassal.

Mas uma ameaça cerca este tesouro genético. "Vassal está localizada a somente um metro acima do mar. Uma elevação do nível das águas, consequente do aquecimento glocal, pode nos submergir", aponta o responsável.

Um tesouro genéticoSob esta ameaça, tomaram a decisão de transferir o banco de Vassal ao espaço do Inra em Gruissan, que "abarca 163 hectares a 30 metros acima do mar", explica o diretor.

Contudo, o projeto de transferência, estudado desde os anos 2000, teve que lidar com uma série de obstáculos, como a petição assinada por milhares de pessoas para denunciar os o possíveis danos para a coleção durante a transferência.

Atualmente, o projeto começa a ganhar vida, com a assinatura do primeiro cheque de 750 mil euros dos "dois a três milhões de euros" que constituem o custo total, explica à AFP Laurent Bruckler, presidente do centro do Inra de Montpellier.

"Neste ano, será feito um estudo sobre o impacto ambiental e, em 2017, capinaremos o terreno, antes do início das plantações em abril de 2018, que serão concluídas em 2023", segundo Ojeda.

Este conservatório vitícola tem como objetivo preservar as estirpes da destruição, mas não só isso. "É um lugar vivo que se transformará em nossa fonte" para inúmeros estudos, especialmente sobre a mudança climática, destaca seu diretor.

Neste tesouro genético, foi identificada a criação de uma variedade, inativa desde os anos 1970, e cujas uvas "amadurecem naturalmente em 10 graus, contra os 14 normais". Uma variedade que poderia conter o aumento do nível de álcool que a videira sofre devido às mudanças climáticas, explica Jean-Louis Escudier, pesquisador do Inra de Gruissan.

Para Escudier, não é possível saber com "muita antecedência para o que pode servir uma coleção. Em 20 anos, necessitaremos, talvez, dessa ou aquela estirpe".