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Plano econômico citado em briga Gagliasso x Collor teve poupança confiscada

Capa da Folha de S.Paulo no dia seguinte ao anúncio do "Plano Collor", que confiscou a poupança - Acervo Folha de S.Paulo/Reprodução
Capa da Folha de S.Paulo no dia seguinte ao anúncio do "Plano Collor", que confiscou a poupança Imagem: Acervo Folha de S.Paulo/Reprodução

Do UOL, em São Paulo

12/02/2021 04h00

Resumo da notícia

  • Entenda o que o foi o plano econômico que abalou o país há 30 anos
  • Assunto ganhou Internet após bate-boca entre Bruno Gagliasso e Fernando Collor em rede social
  • Na tentativa de controlar a inflação que chegou a superar 80% em um único mês, Collor congelou dinheiro dos brasileiros nos bancos

Uma discussão em redes sociais envolvendo o ator global Bruno Gagliasso e o senador Fernando Collor (Pros-AL), ex-presidente da República que sofreu impeachment em 1992 trouxe do fundo do baú as políticas econômicas do primeiro presidente eleito pelo voto após a ditadura militar.

Gagliasso criticou uma suposta intenção de Jair Bolsonaro de recorrer a Collor como conselheiro, lembrando que o ex-presidente seria responsável por fazer "tantas famílias sofrerem com sua política econômica". O plano econômico de Collor foi famoso por ter confiscado dinheiro da poupança de todos os brasileiros. Collor rebateu as críticas.

Collor foi 1º presidente eleito após ditadura militar

Fernando Affonso Collor de Mello nasceu no Rio de Janeiro, mas fez carreira política em Alagoas, onde ocupou cargos públicos, como prefeito da capital Maceió, deputado federal e governador. Em 1989, foi eleito presidente da República por um partido recém-criado, o PRN (Partido da Reconstrução Nacional), derrotando em segundo turno o petista Luiz Inácio Lula da Silva.

Vitorioso com o discurso do combate às mordomias e privilégios do setor público, Collor, o "Caçador de Marajás", foi o primeiro presidente eleito diretamente o golpe militar de 1964.

Em 1992, por acusações de participar de um esquema de corrupção que envolvia o tesoureiro de campanha, Paulo César Farias, foi aberto um processo de impeachment. Antes de ser considerado culpado no Congresso, Collor renunciou à Presidência. Mesmo assim teve os direitos políticos suspensos por oito anos. O então vice-presidente Itamar Franco assumiu seu lugar.

Plano contra inflação de mais de 1.000% ao ano

Quando assumiu, Collor herdou do antecessor José Sarney uma economia marcada pela hiper inflação. Em 1989, ano das eleições presidenciais, a inflação anual foi de 1.149%. Em dezembro daquele ano, os preços subiram apenas 51% apenas.

Era padrão da família brasileira correr aos supermercados assim que recebia o salário para conseguir comprar as coisas antes de a inflação corroer o valor dos produtos. As pessoas que não tinham conta bancária e não podiam depositar o dinheiro em contas remuneradas - que ao menos faziam a renda acompanhar a inflação - viam seu poder de compra cair pela metade em poucos dias.

Vários planos econômicos foram tentados antes - o Plano Cruzado I e II em 1986, que congelou preços e mudou a moeda do país, foi o mais famoso. Mas também foram tentados o Plano Bresser, em 1987, e o Plano Verão, em 1989. Durante esses três anos, a inflação só crescia. Entre 1986 e o fim de 1989, o IPCA acumulou quase 110.000% de alta.

A bala de prata contra o tigre da inflação

Durante a campanha, Collor dizia que usaria uma bala de prata que mataria o tigre da inflação. No dia seguinte à posse, a então ministra da Economia, Zélia Cardoso de Mello, prima do presidente Fernando Collor de Mello e professora da USP, anunciou o novo pacote, oficialmente chamado de Plano Brasil Novo, mas que ganhou a marca mesmo de Plano Collor.

Uma série de medidas buscava três grandes objetivos: reduzir os gastos do governo, aumentar a arrecadação pública e diminuir a quantidade de dinheiro em circulação na economia.

  • Troca da moeda, que deixou de ser cruzado novo e passou a se chamar cruzeiro
  • Novo imposto sobre operações financeiras para elevar a arrecadação pública e desestimular a circulação de dinheiro;
  • Congelamento de preços e salários por 45 dias
  • Aumento de tarifas de serviços públicos, como energia elétrica, telefone e gás - lembrando que naquela época todas essas empresas eram públicas.
  • Fechamento de diversas empresas estatais, com corte de mais de 80 mil funcionários públicos.

Confisco da poupança

Mas a medida que provocou maior impacto na vida das pessoas foi mesmo o bloqueio das contas bancárias e cadernetas de poupança.

Quem tinha dinheiro em conta ou aplicado só tinha direito a sacar 50 mil cruzados novos (algo como R$ 8 mil em valores atuais).

O restante seria devolvido, mas ao longo de 12 meses e só a partir setembro de 1991. A medida valia também para pessoas jurídicas. Então muitas empresas simplesmente não tinham dinheiro para pagar funcionários e fornecedores.

A economia travou. Pessoas se desesperaram. Houve casos de suicídio.

Esse dinheiro seria devolvido com correção monetária e juros de 6% ao ano, mas a inflação voltou. Em 1990, o IPCA subiu 1.600%. E o poder de compra das pessoas e empresas só diminuía com aquele dinheiro todo congelado.

Qual a lógica dessas medidas? O plano Collor partia da tese de que era preciso atacar a inflação cortando o combustível que alimentava os reajustes de preços, ao menos por um tempo, para que a economia se arrumasse. Em teoria, sem dinheiro em circulação, os preços não seriam reajustados simplesmente porque não haveria compradores.

Do lado do governo, com menos gastos, o avanço da dívida pública seria desacelerado, reduzindo a necessidade de emitir títulos públicos.

Troca de ministros

Mas na prática a teoria não funcionou. Bastava o dinheiro voltar a circular que os preços voltavam a ser reajustados. Ainda mais em meio ao receio que as pessoas passsaram a ter depois do confisco de suas contas, Ninguém queria ficar com dinheiro na mão.

A inflação caiu de 82,4%, em março, para 7,6%, em maio, mas voltou a subir e fechou dezembro com uma variação mensal de 18,4%.

Em maio de 1991, Zélia Cardoso de Mello deixa o governo. Em setembro do ano seguinte é a vez de Collor sair de cena.

Até 2006, quando Fernando Collor foi eleito senador por Alagoas.

Abertura da economia

Além do combate à inflação, o governo Collor foi marcado por uma postura liberal, que buscava reduzir o tamanho do Estado na economia e abrir o país para produtos de fora.

Fechar ou vender estatais foi um marco no governo Collor, por meio do Programa Nacional de Desestatização, iniciado com a venda de empresas siderúrgicas.

Além disso, Collor também deu prioridade à abertura do mercado brasileiro a produtos importados a partir da redução de taxas de importação ou eliminação de barreiras comerciais.

De uísque a computadores e carros, os brasileiros puderam começar a comprar produtos importados. A intenção do governo com essa política era aumentar a concorrência e, com isso, segurar preços e fomentar o desenvolvimento.