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Inflação é maior desafio no fim do governo Bolsonaro, dizem economistas

Alta de preços exige ação do BC no último ano do atual mandato de Bolsonaro, dizem especialistas - Luis Alvarez/Getty Images
Alta de preços exige ação do BC no último ano do atual mandato de Bolsonaro, dizem especialistas Imagem: Luis Alvarez/Getty Images

Fabrício de Castro

Do UOL, em Brasília

01/01/2022 04h00

O controle da inflação no Brasil será o principal desafio do último ano do atual mandato do presidente Jair Bolsonaro (PL), avaliam economistas ouvidos pelo UOL. Apesar das necessidades em outras áreas, como a geração de emprego e renda, eles afirmam que a disputa eleitoral em 2022 não deixará espaço para reformas estruturais na economia.

O sentimento geral é que, no ano em que Bolsonaro tentará a reeleição, o governo não conseguirá fazer avançar no Congresso as reformas administrativa e tributária —duas das prioridades na lista do ministro da Economia, Paulo Guedes. O espaço para uma nova reforma trabalhista, que vem sendo negada pelo governo, também é restrito.

Desta forma, na visão dos economistas, restará ao governo controlar a inflação no último ano de Bolsonaro —uma tarefa, aliás, que diz mais respeito ao Banco Central, que possui autonomia para decidir o nível da Selic (a taxa básica de juros), que ao Ministério da Economia.

A questão inflacionária é importante, mas é agenda do Banco Central. Obviamente, poderia ter uma mãozinha no sentido de conta pública, mas isso não vai acontecer. Desconheço qual seja a agenda do Ministério da Economia para 2022 nesse contexto. Porque, se não vai fazer reforma, vai fazer o quê? Vai ficar um ano parado.
Alexandre Schwartsman, economista e sócio da Schwartsman & Associados

Por que a inflação é um desafio?

Desde o segundo semestre de 2020, o IPCA, o índice oficial de preços, vem acelerando no Brasil. Por trás do movimento, estão fatores como a procura maior em todo mundo por alimentos, a alta nos preços internacionais do petróleo e a estiagem que afeta a geração de energia elétrica.

Isso tem feito com que o brasileiro pague preços mais elevados no supermercado, no posto de gasolina e em casa, na conta de luz.

Os números do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostram o movimento mais recente da inflação:

IPCA acumulado em 12 meses:

  • Dezembro de 2020: 4,52%
  • Janeiro de 2021: 4,56%
  • Fevereiro de 2021: 5,2%
  • Março de 2021: 6,1%
  • Abril de 2021: 6,76%
  • Maio de 2021: 8,06%
  • Junho de 2021: 8,35%
  • Julho de 2021: 8,99%
  • Agosto de 2021: 9,68%
  • Setembro de 2021: 10,25%
  • Outubro de 2021: 10,67%
  • Novembro de 2021: 10,74%

A inflação no Brasil caminha para fechar 2021 acima dos 10%, sendo que a meta perseguida pelo Banco Central é metade disso, de 5,25%. Para 2022, o mercado financeiro projeta atualmente inflação próxima de 5%, mas alguns economistas afirmam que o resultado pode ficar bem acima desse valor. A meta do BC é de no máximo 5%.

Controle da inflação é o "desafio possível"

Os economistas ouvidos pelo UOL afirmaram que há várias dificuldades a serem superadas no campo econômico. Mas como 2022 é ano eleitoral, o controle da inflação é o "desafio possível".

O economista Mauro Schneider, da MCM Consultores, afirma que as reformas defendidas pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, terão poucas chances de avançar em 2022.

Acho que nada disso [reformas] vai avançar em 2022. Do ponto de vista mais real, o grande desafio está nas mãos do Banco Central em particular, no sentido de recuperar a confiança do mercado em uma coerência no controle da inflação. Estamos falando de um ano no qual apenas o BC vai atuar.
Mauro Schneider, economista da MCM Consultores

Schneider afirma que, ao conter a inflação, o BC vai contribuir para melhorar as expectativas sobre a economia brasileira. O controle da alta de preços pode tornar o ambiente econômico mais positivo —algo fundamental para a recuperação do emprego e dos investimentos produtivos.

Governo ajuda se não gastar demais

"Se o governo conseguir ajudar nesse processo de recuperação de credibilidade, isso vai ser muito positivo", completa Schneider. Essa ajuda do governo passa pelos gastos públicos.

Se em 2022 o governo não gastar mais do já está planejado no Orçamento, dizem os especialistas, isso já representará uma contribuição ao controle do IPCA.

Para José Faria Júnior, sócio da consultoria Wagner Investimentos, a melhora do ambiente de negócios também depende do combate à inflação.

O desafio do governo é melhorar o mal-estar com a economia. Essa é, aliás, a única chance de Bolsonaro ser reeleito. Isso passa por tentar derrubar a inflação e amenizar o desemprego por meio do pagamento de bolsas, como o Auxílio Brasil.
José Faria Júnior, sócio Wagner Investimentos

BC já sinalizou que vai agir

Em entrevistas recentes, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, sinalizou que a instituição subirá os juros o quanto for necessário para conter a inflação.

Desde março de 2021, o BC vem elevando a Selic (a taxa básica de juros) para segurar a alta de preços. Após ter chegado a 2% ao ano, a taxa de juros está hoje em 9,25%. No mercado financeiro, já há quem projete a Selic em 14,25% ao ano em 2022.

Com a recém-conquistada autonomia, o BC tende a continuar o processo em 2022, ainda que subir juros seja algo impopular para o governo Bolsonaro em ano eleitoral.

É muito importante avançar nesse processo [de alta de juros]. Vamos perseguir a meta [de inflação], e o processo vai se estender até que as expectativas fiquem ancoradas. Nós entendemos que isso é bastante importante.
Roberto Campos Neto, presidente do BC

Crescimento baixo e inflação alta

Para Ricardo Leite, líder da área de Renda Variável da Diagrama Investimentos, o Brasil vive atualmente sob a ameaça da estagflação —um misto de estagnação da economia com inflação alta.

"O desafio para 2022 é mesmo trazer a inflação de volta para a meta. Apesar de que eu não acredito que o IPCA fique abaixo de 6% no ano que vem", disse Leite. A meta do BC é de um IPCA de até 5%.

O economista também tem dúvidas sobre a capacidade de o BC controlar os preços apenas aumentando os juros.

Estamos falando de uma inflação causada na cadeia de suprimentos, e não no consumo. Ao mesmo tempo, o crescimento da economia está aquém do imaginado. O Banco Central terá que balancear a alta de juros para não matar o crescimento.
Ricardo Leite, da Diagrama Investimentos