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Brasil exporta etanol para os EUA em meio à queda do real ante o dólar

18/03/2015 16h14

Por Chris Prentice e Marcelo Teixeira

SÃO PAULO/NOVA YORK (Reuters) - A Royal Dutch Shell Plc encomendou um grande carregamento de etanol brasileiro para ser enviado aos Estados Unidos, o sinal mais forte até agora de que as grandes oscilações nos valores do dólar e do real começam a ter reflexo nos fluxos de comercialização do biocombustível, disseram fontes.

Os grandes estoques do produto nos dois maiores produtores mundiais de etanol também influenciam nos negócios.

A Raízen Energia, uma joint venture entre a Cosan e a Shell, e a Biosev, unidade de açúcar e etanol controlada pela Louis Dreyfus Commodities, venderam um carregamento de aproximadamente 30 mil toneladas de etanol com destino à Flórida, segundo cinco fontes no setor de comercialização no Brasil e nos Estados Unidos.

O carregamento ficou apenas um pouco abaixo da soma de todas as importações de etanol brasileiro feitas pelos Estados Unidos em dezembro, que foram os maiores volumes desde maio de 2014, de acordo com os mais recentes dados do governo dos EUA.

A Biosev confirmou ter negociado cerca da metade do carregamento, informando que a entrega está prevista para o final de março. A Shell e a Raízen não quiseram comentar.

Operadores dizem que a forte queda do real ante o dólar tornou o etanol brasileiro mais competitivo nos EUA, mesmo com os estoques norte-americanos situados em níveis elevados, proporcionando uma oportunidade de curto prazo para a Shell.

O real chegou a ser negociado a 3,283 por dólar nesta semana, o ponto mais fraco ante a moeda norte-americana em 12 anos, ante 2,86 reais por dólar há um mês, em meio à deterioração da economia brasileira.

Tarsillo Rodrigues, diretor-executivo da corretora Bioagencia, de São Paulo, diz que o negócio pode funcionar como uma "válvula de escape" para grupos que buscam reduzir estoques de etanol no Brasil, mas que esse tipo de negócio vai depender muito da estratégia de cada companhia.

"Do ponto de vista de preço não faria muito sentido, porque em tese o mercado local ainda paga um pouco melhor. Mas cada empresa tem que avaliar sua posição de estoque, suas metas acertadas com o conselho, existem vários fatores", afirmou.

Alguns grupos de açúcar e álcool no Brasil admitiram ter carregado um pouco mais de estoques durante o período da entressafra ante anos anteriores, aguardando por condições melhores de comercialização e também pelo aumento da mistura de etanol na gasolina, que demorou a se concretizar.

Agora, com a aproximação da nova safra de cana, produtores de etanol tentam reduzir esses estoques.

"As distribuidoras estão pressionando usinas para vender um pouco mais barato. Aproveitam o nível alto armazenado e também a situação financeira apertada de algumas empresas para pagar menos (pelo etanol)", disse Rodrigo Teixeira Bombig, diretor comercial da Usina Alta Mogiana.

Nos Estados Unidos, que foi o maior exportador mundial de etanol no ano passado, volumes maiores de importações brasileiras colocariam em alerta os produtores locais que se digladiam com margens apertadas e se esforçam para buscar mercados externos para um volume excedente do produto estimado em 3 milhões de toneladas.

"Está todo mundo agarrando as migalhas do que resta de demanda por derivados de milho", afirmou Steve Nicholson, analista do Rabobank AgriFinance in Saint Louis (o etanol é feito a partir do milho nos EUA).

Os preços de referência para o etanol no mercado físico no Meio-Oeste norte-americano estão 15 por cento menores do início do ano até agora, em cerca de 1,40 dólar o galão (3,78 litros), sob pressão dos baixos preços da gasolina. O produto é negociado na Flórida com um prêmio de cerca de 30 centavos de dólar por galão.

O preço em dólar do etanol anidro na usina no Estado de São Paulo já caiu mais de 15 por cento nas últimas semanas, para 1,60 dólar o galão, menor valor em dólar em mais de um ano. Em reais, a queda foi menor, de pouco mais de 7 por cento desde o pico da entressafra, há cerca de um mês.

Apesar desse negócio pontual, há dúvidas sobre a possibilidade de mais exportações, tanto para os EUA como para outros destinos.

"O atual cenário é bem diferente daquele observado em 2008, quando as exportações brasileiras superaram 5 bilhões de litros", diz Bruno Freitas, economista da consultoria Datagro.

"Além de contar com uma maior produção interna, a União Europeia e os EUA diminuíram as importações também em virtude das revisões dos programas de uso de biocombustíveis", afirmou.