Ameaças de demissão para forçar volta ao trabalho geram 72 denúncias no RS
Mais de uma centena de denúncias de assédio — em sua maioria, de empresas constrangendo funcionários a retornarem ao serviço — já foram encaminhadas ao MPT (Ministério Público do Trabalho), desde o início das enchentes históricas no Rio Grande do Sul.
Das 121 reclamações compiladas até esta segunda-feira (20) por um gabinete de crise montado pelo órgão federal para monitorar a situação no estado, 72 dizem respeito a convocações para trabalho em área de risco e a ameaças de demissão em caso de não comparecimento. Há casos em investigação até de empregadores exigindo fotografias das casas alagadas de seus empregados.
'Conflito judicial não interessa a ninguém', diz procurador-geral do MPT
A primeira medida do gabinete criado pelo MPT foi orientar as prefeituras sobre como emitir atestados às vítimas das enchentes, para que elas possam comprovar a impossibilidade de voltar ao trabalho. "A emissão é, evidentemente, eletrônica, porque nós sabemos das dificuldades", afirma José de Lima Ramos Pereira, procurador-geral do MPT.
Segundo Pereira, o momento delicado exige "diálogo social" para evitar conflitos judiciais que "não interessam a ninguém". Pereira resalva, no entanto, que profissionais em condição de trabalhar devem comparecer aos seus postos. "Não existe 'fechou geral'. Aí você realmente criaria um caos absoluto", complementa.
Membro do Gatra, coletivo de assessoria jurídica na área trabalhista formado por estudantes de Direito da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), Bernardo Haesbaert vem atuando nos abrigos da capital Porto Alegre e também tem registrado uma série de denúncias.
"Tem pessoas que acabam voltando ao trabalho por medo de serem demitidas", conta Haesbaert. Ele também cita outros relatos de assédio: "No dia a dia, [alguns afirmam que] não estão tendo direito a tomar água, porque o empregador está dizendo que a água é só para os clientes".
Na semana passada, o Gatra divulgou um manifesto pela garantia do emprego no estado. Assinado por 15 entidades da sociedade civil, o documento defende um decreto presidencial para alterar a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) e proibir descontos salariais e a dispensa de trabalhadores, enquanto perdurar a situação de calamidade.
Fecomércio-RS defende benefício emergencial, como na pandemia
Em reunião com o MTE (Ministério do Trabalho e Emprego) no começo do mês, a Fecomércio-RS, entidade que representa empresas do setor de serviços do estado, apresentou ao governo federal um pedido de pagamento do benefício emergencial aos trabalhadores gaúchos, como forma de garantir empregos.
A proposta tem como base a Lei 14.437, de 2022, aprovada em meio à pandemia de covid-19 para flexibilizar regras trabalhistas durante períodos de calamidade pública. "Esse foi o foco do nosso pedido da reunião do dia 6 de maio com o ministro Luiz Marinho", afirma Íris Vidaletti, assessora jurídica da Fecomércio.
Segundo ela, o benefício — no valor do seguro-desemprego — contemplaria trabalhadores em duas situações. Primeiro, os empregados com contrato suspenso, por não terem como se dirigir ao trabalho. Segundo, os funcionários com redução de jornada e de salário, mas com complementação salarial pelo benefício emergencial. O governo hesita em colocar em prática a proposta devido ao alto custo financeiro, estimado em R$ 5 bilhões mensais.
Segundo a assessoria de comunicação do Ministério do Trabalho, a pasta já suspendeu o pagamento por quatro meses do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço) por parte das empresas gaúchas de municípios em situação de calamidade. Além disso, antecipou o pagamento do abono salarial e a liberou duas parcelas adicionais do seguro-desemprego. No total, os recursos desembolsados superam R$ 4 bilhões.
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