Siga nas redes
Só para assinantesAssine UOL
Reportagem

Com ajuda de Musk, Trump pode desmontar proteção trabalhista da era Biden

Em menos de dez dias de mandato, Donald Trump já deu provas de que pretende cumprir as promessas linha-dura feitas a seus eleitores sobre a questão migratória.

A expectativa é de que o novo titular da Casa Branca também reveja uma série de políticas de seu antecessor em outro tema que tem tudo para marcar uma guinada e tanto em relação a Joe Biden: direitos trabalhistas.

O democrata costumava se apresentar como o líder mais "pró-sindicatos" da história dos Estados Unidos, e chegou a bater de frente com grandes companhias — como a Amazon — que agiam para dificultar a organização coletiva de trabalhadores.

Agora, com a volta de Trump, algumas regras aprovadas no governo Biden estão na berlinda. Exemplos concretos são a regulamentação para proteger trabalhadores expostos ao calor excessivo e a medida para facilitar o pagamento de horas extras a pelo menos quatro milhões de pessoas com jornadas superiores a 40 horas semanais.

Musk pode esvaziar agências federais voltadas à proteção de trabalhadores

A retórica inflamada do republicano nunca deu margem a dúvidas sobre sua opinião a respeito de questões trabalhistas. Em agosto do ano passado, numa conversa com o bilionário Elon Musk, Trump insinuou que "grevistas" deveriam ser dispensados de suas empresas.

A declaração teve ampla repercussão e embasou um processo por "tentativa de intimidação" movido pelo Sindicato dos Trabalhadores da Indústria Automotiva dos Estados Unidos contra ambos.

A própria nomeação de Musk para a chefia do Departamento de Eficiência Governamental, com a missão de cortar gastos públicos, fornece pistas de possíveis impactos sobre a área trabalhista.

Em resposta a outro questionamento na Justiça, o bilionário sul-africano radicado nos Estados Unidos colocou em xeque a própria constitucionalidade do Conselho Nacional de Relações do Trabalho (o NLRB, na sigla em inglês), um órgão do governo federal. Trump, por sua vez, já ameaçou substituir conselheiros "pró-trabalhadores" do NLRB.

Continua após a publicidade

Além de propor regulamentações, o NLRB também apura irregularidades cometidas por empresas — a Tesla, fábrica de carros elétricos de Musk, já entrou na mira do Conselho após denúncias sobre demissões de funcionários que queriam formar um sindicato.

Dirigentes sindicais também temem que Musk, sob o pretexto de enxugar a máquina pública, esvazie o quadro de funcionários de agências federais voltadas à proteção trabalhista. Trata-se de um processo similar ao que ocorreu com o Ministério do Trabalho, no Brasil: por aqui, desde 2013, o número de fiscais caiu quase pela metade.

Nos Estados Unidos, uma das categorias mais afetadas pode ser a dos inspetores de saúde e segurança do NLRB. Dentre outras atribuições, o núcleo é o responsável justamente pela definição das normas sobre exposição ao calor excessivo que podem ser revistas — ou até mesmo suspensas — pela administração Trump.

Nova secretária do Trabalho é ex-deputada republicana tida como 'moderada'

Apesar de seu histórico e de seus posicionamentos "pró-business", Trump nomeou para o cargo de Secretária de Trabalho a ex-deputada federal Lori Chavez-DeRemer, derrotada nas últimas eleições.

A indicação, que ainda precisa ser confirmada pelo Senado, foi mal digerida por parte da base do presidente. Mesmo pertencendo ao Partido Republicano, Chavez-DeRemer já foi considerada a mais simpática aos sindicatos dentre os parlamentares da sigla.

Continua após a publicidade

O pai de Chavez-DeRemer, por sinal, já foi militante do Teamsters. Uma das maiores do país, a organização representa cerca de 1,4 milhão de trabalhadores de categorias diversas como caminhoneiros, profissionais da saúde e empregados do comércio.

Analistas nos Estados Unidos enxergam a nomeação como um aceno ao movimento sindical, ambiente em que o republicano cresceu em relação a eleições anteriores, apesar de as principais lideranças terem declarado apoio à sua adversária, Kamala Harris.

Segundo pesquisa da CNN, 45% dos eleitores de famílias com membros filiados a sindicatos votaram em Trump. Em 2020, quando foi derrotado por Biden, o índice alcançado pelo republicano chegou a 40%. Como já debatido nesta coluna, a promessa de recuperação de bons empregos pode explicar a adesão de parte da classe trabalhadora sindicalizada a Trump.

Enquanto Chavez-DeRemer não assume o posto, o secretário interino, Vince Micone, anuncia as primeiras medidas da pasta: a extinção dos chamados "programas DEIA", criados na gestão Biden para estimular diversidade, equidade, inclusão e acessibilidade no mercado de trabalho.

A canetada de Micone contra ações afirmativas chamou a atenção da imprensa: gay assumido, ele já fez parte de importantes movimentos LGBTQIA+ e é um ferrenho defensor dos programas de enfrentamento ao HIV. Sinal de que a futura titular do cargo também poderá rever sua trajetória "pró-trabalhador", como se diz na imprensa norte-americana.

Continua após a publicidade

Reportagem

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

8 comentários

O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Leia as Regras de Uso do UOL.