Logo Pagbenk Seu dinheiro rende mais
Topo

João Branco

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Lições de marketing com o coelho da Páscoa

Colunista do UOL

14/04/2022 04h00

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

O coelhinho da Páscoa está trabalhando pesado esse ano. O retorno das reuniões familiares maiores e do trabalho no escritório está aquecendo o mercado de presentes e a indústria doceira está surfando a onda - essa ocasião de consumo chega a representar 40% de tudo que o brasileiro consome de chocolate no ano. A gente gosta tanto de ovo de Páscoa que tem a impressão de que esse é um hábito do mundo todo. Mas não se engane: poucos países além do Brasil têm essa cultura (Argentina e Itália são alguns deles). Quem está nos Estados Unidos nesse momento, por exemplo, praticamente não vai encontrar nenhum supermercado com os ovos doces pendurados pelos corredores (coisa que os varejistas daqui chamam de "parreiras").

Eu já trabalhei em uma das maiores fabricantes de chocolates do mundo, por 5 anos. E lembro as inúmeras vezes que discutimos sobre como criar esse mesmo hábito em outros países. Há locais onde as pessoas presenteiam itens de decoração, em outros as pessoas comem pães pascais e ainda há as sociedades onde esse feriado não é celebrado. Cada um tem o seu hábito, as suas crenças, as suas manias, a sua cultura.

Mudar hábitos talvez seja uma das coisas mais difíceis de fazer no marketing. Há quantos anos a indústria de cereais matinais tenta te convencer a trocar o pão com manteiga no café da manhã por um prato de leite com milho? Há quanto tempo as fabricantes de produtos para higiene bucal tentam te ensinar a usar enxaguatório como parte do processo de escovação? Talvez você até tenha adotado alguma dessas coisas na sua rotina. Mas esse processo de convencimento massivo é caro e demorado. E pode até ser que nunca consiga emplacar.

Quanto mais diferente for o hábito que você tentar mudar em um cliente, mais dificuldade terá. Se uma pessoa hoje compra uma pizza por telefone e paga com cartão de crédito, é mais fácil convencê-la a comprar a mesma pizza pelo aplicativo e pagar com o mesmo cartão de crédito do que tentar mudar direto seu hábito para compra de tacos mexicanos através do chatbot do Telegram pagando com bitcoin. Você pode até achar que seria melhor, mas o cliente sempre quer ter menos esforço.

Em outras palavras: surfar ondas que já existem é mais fácil, rápido e barato do que criar ondas.

Mas não me entenda mal: não é impossível mudar rotinas. E empresas que conseguem fazer isso, em geral, colhem frutos interessantes no longo prazo. Um dia alguém nos convenceu a lavar o cabelo uma segunda vez depois do xampu com um produto chamado "condicionador" e colhe resultados positivos até hoje. Mas isso só é possível se houver um benefício claríssimo (superlativo porque tem que ser assim mesmo) para os clientes. Repetindo: um benefício claríssimo.

Você quer me convencer a começar a passar um creme entre os dedos dos pés todos os dias antes de dormir? Vai ter que gastar saliva, porque eu não vejo necessidade. Você quer que eu instale um aplicativo para fazer compras que eu já estou acostumado a fazer de outra forma? Prepare-se para me dar um bom benefício em troca, senão meu cérebro não vai deixar. É assim que somos.

Muitas empresas de tecnologia estão amargurando prejuízos há anos, porque dizem estar investindo nesse processo de criação de um novo hábito em seus clientes. O tempo dirá quais dessas ondas foram realmente criadas.

Se você quer tentar vender mais do seu produto, não esqueça de observar primeiro as oportunidades mais fáceis: você já está surfando a onda inteira? É possível aumentar a onda?

O coelhinho da Páscoa não passa no Natal. Ele passa na Páscoa.

coelho - Felipe Tomazelli - Felipe Tomazelli
Imagem: Felipe Tomazelli