Magalu, Casas Bahia e Americanas: cuidado com o risco de endividamento

Neste ano, o varejo brasileiro está com mais força do que o esperado. No entanto, a perspectiva para frente é que o cenário pese sobre o setor, com crédito apertado e economia fraca no Brasil com juros altos, mesmo que com perspectiva de redução.

As vendas do comércio varejista ficaram estáveis em junho na comparação com maio de 2023. No primeiro semestre, porém, o setor cresceu 1,3%, segundo dados da Pesquisa Mensal do Comércio (PMC), divulgada no início do mês de agosto pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). No entanto, ainda há muitos desafios pela frente, principalmente para o chamado consumo cíclico, que está relacionado a produtos classificados como não essenciais.

Além do cenário desafiador, muitas empresas estão enfrentando grandes desafios em seus negócios. O alerta para os riscos de alavancagem financeira excessiva, que atingiu várias empresas do setor, continua pesando sobre as empresas.

Grandes varejistas nacionais, como Lojas Americanas, Tok&Stok, Riachuelo e Marisa, vem enfrentando dificuldades para honrar seus pagamentos aos fornecedores e manter seu capital de giro. Elas estão levantando preocupações sobre a saúde financeira e a competitividade. Muitas empresas ainda enfrentam problemas advindos da pandemia da covid-19 em 2020.

Vale destacar que a necessidade de um equilíbrio financeiro é essencial. As empresas necessitam de recursos para montar seus estoques, principalmente no segundo semestre, período no qual temos as vendas da Black Friday e do Natal.

O que esperar daqui para frente?

Final de ano pode ser melhor para as vendas. Mesmo ainda enfrentando taxas de juros altas, a sazonalidade do período, com a entrada da Black Friday e das vendas de Natal, deve impulsionar o comércio nesse final de ano, já que mais de 40% do total das vendas do setor ocorre nesse período. Nesse sentido, esperamos números mais positivos para as companhias do setor de varejo no segundo semestre, principalmente para aquelas que tenham suas operações diversificadas em comércio físico e eletrônicos, além do varejo de consumo essencial, como é o caso das varejistas alimentícias.

Mas ainda há desafios. A forte concorrência e a pressão sobre a renda disponível dos consumidores, especialmente para a classe média baixa, historicamente base de clientes da Via e do Magazine Luiza, além dos efeitos negativos ligados à tributação, devem continuar pesando nos números das empresas.

Vale lembrar que houve a volta do Difal, o diferencial de alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Isso fez com que as mercadorias vendidas passassem a ser tributadas tanto na origem quanto no destino e, assim, aumentou o imposto pago pelas empresas de e-commerce. Essa mudança veio com a reforma tributária aprovada na Câmara dos Deputados no primeiro semestre, que visou a simplificação do sistema tributário brasileiro.

Continua após a publicidade

Outro problema para o varejo, desta vez afetando mais o varejo de vestuário, foi o novo modelo de importação de remessas postais, implementado desde 1º de agosto. As empresas podem pedir isenção da tarifa de importação de 60% para produtos importados de até US$ 50. Para isso, precisam aderir ao plano de remessa, após fornecer várias informações à Receita Federal. Este regime, que deve beneficiar plataformas estrangeiras, segundo visão das varejistas locais, vem causando protestos, principalmente em um ano em que as vendas das empresas têm sido bem fracas, por conta da queda da receita e dos altos estoques.

Veja quem está melhor

Magazine Luiza (MGLU3) apresentou números fracos neste primeiro semestre. Teve um prejuízo líquido de R$ 693 milhões no primeiro semestre, 133,9% a mais que as perdas líquidas do ano anterior, que somaram R$ 296 milhões.

A sua receita líquida foi de R$ 17,6 bilhões ao final do primeiro semestre de 2023, um aumento de 1,8% se comparado ao mesmo período de 2022. A Magalu encerrou o trimestre com uma posição de caixa total de R$ 8 bilhões, cerca de R$ 1 bilhão maior que em março deste ano, em função da geração de caixa operacional de R$ 847 milhões no trimestre, reflexo principalmente da evolução do capital de giro e do montante recebido de R$ 850 milhões com a renovação do contrato de exclusividade com a BNP Paribas Cardif Brasil.

A Casas Bahia (BHIA3), antiga Via (VIIA3), teve prejuízo líquido de R$ 492 milhões no segundo trimestre do ano, ante lucro de de R$ 6 milhões no mesmo período de 2022. Segundo a companhia, os ajustes não recorrentes relacionados à atualização dos processos trabalhistas continuam contribuindo para o prejuízo do período.

A sua receita líquida, diferentemente do desempenho da Magalu, apresentou queda de 2,1% sobre um ano antes, estando em R$ 7,48 bilhões. A Via atingiu no segundo trimestre uma posição de caixa, incluindo recebíveis, de R$ 2,8 bilhões. No período, houve consumo no capital de giro de R$ 169 milhões e gastos com demandas judiciais trabalhistas de R$ 341 milhões. De R$ 3,6 bilhões da dívida, a companhia possui R$ 2,4 bilhões (66%) com vencimentos no longo prazo.

Continua após a publicidade

Já em relação a Americanas (AMER3), o escândalo do rombo bilionário, divulgado no começo do ano, vem afetando as ações da empresa. Além disso, a não divulgação dos balanços corporativos demonstra as incertezas quanto aos seus números. A Americanas já teve 43 lojas fechadas, ou seja, uma redução de cerca de 2,3% do total de suas lojas. Já no final de maio, a Americanas reunia 1.842 lojas no total. O número de funcionários também enfrentou grande queda. Foram reduzidos cerca de 8,5% (3.455) nos últimos meses, indo de 40.426 em março para 36.971 em junho deste ano.

Quanto à dívida, em maio de 2023, o último relatório divulgado pela empresa mostrou uma dívida de R$ 20,6 bilhões. Esse número não inclui o endividamento bancário que é relativo às operações de risco sacado, que estão por volta de R$ 40 bilhões (mas esse valor ainda é incerto, podendo ser elevado). A companhia também apresentou queda no valor de caixa disponível, que no final de maio fechou em R$ 1,2 bilhão, cifra que é cerca de 38% menor do que o saldo inicial registrado no início de junho de 2022.

Empresas estão endividadas

Conforme comentado acima, a empresa que mais está alavancada é a Via, seguida pela Americanas. No entanto, vale destacar que os números da Americanas estão defasados, já que a empresa não apresentou seus números do segundo trimestre de 2023. Além disso, ainda não estavam embutidos na dívida os valores quanto aos problemas do risco sacado.

Abaixo apresento a situação de dívida líquida sobre Ebitda das três empresas. Vale ressaltar que a dívida líquida/Ebitda é uma métrica importante porque ajuda a avaliar a capacidade de uma empresa de pagar suas dívidas. Quanto menor o valor da dívida líquida/Ebitda, melhor a situação financeira da empresa, pois indica que ela possui uma boa capacidade de gerar lucros para pagar suas dívidas.

Div. Líq/ Ebitda

Continua após a publicidade

AMER3: 4,9x

MGLU3: 4,7x

BHIA3: 7,0x

Fonte: Site de RI - MGLU3(2T23), Casas Bahia (BHIA3) (2T23) e AMER3(1T23) / Elaboração: PagBank

Claramente conseguimos verificar que a Via é a empresa que mais está mostrando uma situação financeira complicada. No entanto, mesmo estando em segundo lugar, a Americanas poderá despontar em primeiro lugar quando tiver seus números divulgados.

Vale destacar que um caixa robusto é essencial para operações de varejo que demandam alto investimento em capital de giro. Diante de crises econômicas, é importante uma empresa ter um caixa confortável, para enfrentar as adversidades do período. Além disso, o setor de varejo é bastante concorrencial e, para ganhar espaço no mercado, é essencial realizar investimentos em expansão em lojas próprias ou aquisições de lojas de terceiros.

Continua após a publicidade

Olhando para o desempenho das empresas na Bolsa nos últimos trimestres, todas, sem exceção, vêm apresentando desvalorização, conforme apresentado na tabela abaixo. Com as perspectivas do mercado para a continuidade dos fracos desempenhos para o próximo trimestre, tendendo a melhorar no último trimestre do mês, devemos seguir vendo no curto prazo um desempenho das ações abaixo do mercado. Veja a variação em um mês, três meses, seis meses, desde o começo do ano e nos últimos 12 meses.

TICKER / 1M / 3M / 6M / ANO / 1 ANO

AMER3: -11,3% / -19,0% / -10,5% / -90,2% / -94,6%

MGLU3: -11,5% / -35,6% / -25,0% / -7,0% / -46,6%

BHIA3: -36,2% / -54,0% / -35,2% / -50,8% / -65,5%

Fonte: Bloomberg - Variação do preço da ação / Elaboração: PagBank

Continua após a publicidade

Conclusão

Verificamos que o cenário macroeconômico ainda apresenta muitos desafios, principalmente para o chamado consumo cíclico, que está relacionado a produtos classificados como não essenciais.

Além do cenário desafiador, muitas empresas estão enfrentando grandes desafios em seus negócios. O alerta para os riscos de alavancagem financeira excessiva, que atingiu várias empresas do setor, continua pesando sobre elas.

A sazonalidade do período, com a entrada da Black Friday e das vendas de Natal, deve impulsionar o comércio neste final de ano, já que mais de 40% do total das vendas do setor ocorre nesse período. Nesse sentido, esperamos números mais positivos para as companhias do setor de varejo no quarto trimestre, principalmente para aquelas que têm suas operações diversificadas em comércio físico e eletrônico, além do varejo de consumo essencial, como é o caso das varejistas alimentícias.

No entanto, a taxa de juros, mesmo com perspectiva de queda, continua em patamares elevados e poderá continuar corroendo o poder de compra dos consumidores, consequentemente, levando a um menor consumo. Além disso, a forte concorrência deverá continuar pressionando as margens das empresas.

Desta forma, continuamos reticentes em relação ao setor de varejo no curto prazo. Portanto, nossa recomendação é apenas de manutenção para o setor.

Errata:

o conteúdo foi alterado

  • O período do resultado do Magazine Luiza estava dado como segundo semestre. O correto é primeiro semestre. A informação foi ajustada.

O UOL Economia é de propriedade do Universo Online S.A., sociedade que controla as empresas do Grupo UOL. O Grupo UOL tem em sua composição empresas que exercem atividades reguladas no setor financeiro. Apesar de o Grupo UOL estar sob controle comum, os executivos responsáveis pelo Banco Seguro S.A. são totalmente independentes e as notícias, matérias e opiniões veiculadas no portal tem como único objetivo fornecer ao público elementos a título educacional e informativo sobre o mercado e produtos financeiros, sendo baseadas em dados de conhecimento público na data de sua divulgação, conforme fontes devidamente indicadas, e condições mercadológicas externas ao Grupo UOL que podem ser alteradas a qualquer momento, mas sem constituir qualquer tipo de relatório de análise, recomendação, oferta ou solicitação de compra e/ou venda de qualquer produto.

Deixe seu comentário

Só para assinantes