Analistas do mercado desaprovam falas de Lula sobre BC e juros
As declarações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) - principalmente as críticas ao Banco Central - não agradaram ao mercado. O presidente deu nesta terça-feira uma entrevista à rádio CBN em que classificou a conduta da instituição como "a única coisa desajustada" do Brasil. Para Lula, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, trabalha "muito mais para prejudicar o país". "Não tem explicação a taxa de juros do jeito que está."
Como especialistas reagiram
Para economistas e analistas do mercado, as declarações podem piorar ainda mais a situação. "Criticar o Banco Central só traz mais instabilidade para um mercado que já está ruim", diz o economista da Fami Capital, Gustavo Bertotti.
Apesar das críticas, entretanto, por volta das 13h30, o Ibovespa operava no azul. O índice estava nesse horário em alta de 0,42%, a 119.662,34 pontos. O dólar caía 0,33% para R$ 5,403.
Vários governos ao redor do mundo criticam o Banco Central quando ele é independente, como no Brasil. É o que diz Beto Saadia, economista e diretor de investimentos da Nomos. "Mas o que Lula está fazendo é colocar no BC a culpa de problemas gerados pelo próprio governo e pelo Congresso Nacional", afirma.
Para os especialistas, a conduta do BC tem sido técnica - e não política. Os juros estão altos porque o governo gasta mais do que arrecada e não tem controle sobre a situação fiscal do país.
Cortes de gastos e subsídios
Na entrevista, Lula se disse "perplexo" com subsídios que chegaram a 6% do PIB (Produto Interno Bruto) em 2023. Ao todo, segundo a ministra do planejamento, Simone Tebet, são R$ 646 bilhões somando renúncia fiscal tributária, renúncias de benefícios financeiros e creditícios.
As mesmas pessoas que falam que é preciso parar de gastar são as pessoas que têm R$ 546 (sic) bilhões em isenção, desoneração de folha. São os ricos que se apoderam de uma parte do orçamento do país e eles se queixam com o que está gastando com o povo pobre.
Lula, em entrevista à CBN
Para os analistas, esse percentual é realmente muito alto e deve ser trabalhado. Mas a narrativa de ricos contra pobres já está desgastada, segundo Bertotti. Para ele, colocar lenha na fogueira agora e não atacar os gastos do governo efetivamente é o que prejudica a economia do Brasil como um todo, atingindo todas as classes sociais.
Na verdade o presidente repetiu o que ele vem falando nos últimos tempos. É o que diz Alvaro Bandeira, coordenador da comissão de economia da Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais do Brasil (APIMEC Brasil). "Na verdade o presidente repetiu o que ele vem falando nos últimos tempos sobre rico, sobre pobre, sobre tributação. Nenhuma grande novidade. Por enquanto a gente não sabe ainda que tipo de corte de gasto pode haver."
Reflexos da disputa no mercado
Essa guerra de narrativas, meses antes de o comando do Banco Central ser mudado, só traz mais incertezas para o mercado. Essa essa é a opinião de Gabriel Meira, economista da Valor Investimentos, no Rio de Janeiro. No dia 31 de dezembro, termina o mandato de Campos Neto.
As incertezas fazem os investidores se afastarem do Brasil e isso provoca a alta do dólar, segundo Meira. A saída de investiores estrangeiros do pais somou R$ 7,3 bilhões no acumulado do mês e R$ 43,2 bilhões no ano.
Menos dólares no Brasil pressionam a situação dos juros. "As curvas de juros, que mostram uma previsão de como as taxas devem se comportar no futuro, já estão em tendência de alta", diz Bertotti.
O Comitê de Política Monetária já está reunido nesta terça-feira. O Copom deve se pronunciar sobre a Selic nesta quarta-feira (19) e a expectativa do mercado é que a taxa fique estável em 10,50%, interrompendo o ciclo de cortes que vem ocorrendo desde agosto do ano passado. "Então foi um aviso muito forte do presidente e certamente os agentes do mercado não gostam dessa postura, dessa pressão realizada pelo governo no BC", diz Bandeira.
Deixe seu comentário