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Coreia do Norte ante a promessa de um futuro econômico radiante

26/02/2019 12h30

Sinuiju, Coreia do Norte, 26 Fev 2019 (AFP) - Kim Hye Yong, gerente de uma fábrica de cosméticos em Sinuiju, noroeste da Coreia do Norte, não se incomoda quando é informado sobre uma fábrica rival em Pyongyang. "É a concorrência", constata pura e simplesmente.

Neste país isolado, liderado por uma dinastia autocrática, a abertura econômica é discretamente encorajada.

Diante da segunda cúpula com o líder norte-coreano Kim Jong Un, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, falou sobre a possibilidade de a Coreia do Norte, um país pobre, isolado e dotado da bomba atômica, se torne uma "potência econômica".

Mas a realidade é mais complexa e a Coreia do Norte tenta de tudo para superar suas dificuldades. Por ocasião do último congresso do partido único no poder, Kim havia denunciado "o vento imundo da liberdade burguesa, da 'reforma' e da 'abertura' que sopra em nossa vizinhança".

Era uma referência óbvia à China, que se tornou a segunda economia mundial com a liberação das forças de mercado, uma política apelidada de "socialismo com características chinesas".

A imprensa oficial norte-coreana critica regularmente os males do capitalismo, um sistema que, segundo eles, inevitavelmente cairá.

Mas, na prática, há alguns anos, o regime faz reformas de maneira silenciosa e o controle do Estado é menor.

Vendedores privados são autorizados em mercados paralelos, empresas públicas são mais livres e as autoridades fecham os olhos às operações de empresas privadas.

A concorrência entre fábricas, a diversificação e a integração vertical são bem-vindas.

- Resposta à demanda -Na fábrica de Sinuiju, cosméticos, cremes e loções são feitos com ginseng, uma raiz com virtudes medicinais.

A embalagem às vezes lembra algumas marcas ocidentais como Pantene ou Head and Shoulders.

"Tem muitas pessoas que preferem nossos produtos", diz Kim, 54 anos.

Quando Kim Jong Un visitou a fábrica com sua esposa, Ri Sol Ju, ele elogiou seu caráter inovador e atraente para o consumidor, de acordo com a agência oficial KCNA.

O líder autorizou a fábrica a abrir empresas em todo o país, conta Kim.

Os efeitos das reformas são mais visíveis em Pyongyang, onde uma classe média freqüenta cafés, academias e está cada vez mais equipada com telefones celulares.

Mas os habitantes da capital são uma elite privilegiada, não representativa do país.

A Coreia do Norte sofreu várias sanções por seu programa nuclear e balístico, de modo que os resultados dessa política econômica são moderados.

De acordo com o Banco Central da Coreia do Sul, o PIB norte-coreano contraiu 3,5% em 2017, último dado disponível.

- Vietnã, um modelo -Depois da Guerra da Coreia (1950-1953), o norte era mais rico que o sul, por causa do apoio soviético e da decisão do colonizador japonês de concentrar a indústria no norte por seus recursos de mineração e potencial hidrelétrico.

Mas a situação mudou. A economia norte-coreana, considerada por muito tempo a mais controlada do mundo, sofria de má gestão, agravada pelo desaparecimento da União Soviética.

Segundo os dados disponíveis em Seul, a renda média do Norte é equivalente a menos de 1/20 da do Sul. Pyongyang quase não publica estatísticas.

Pequim, principal aliado diplomático e parceiro de negócios de Pyongyang, insiste que seu vizinho siga seu modelo econômico.

Em Sinuiju, perto da fronteira com a China, o contraste entre os dois países é evidente. Do outro lado do rio Yalu, a fronteira natural entre a China e a Coreia do Norte, é possível ver as luzes e as torres da cidade chinesa de Dandong. A alguns quilômetros de distância, na Coreia do Norte, podem-se ver bois puxando carroças.

Devido a sua localização geográfica, a economia norte-coreana estará sempre intimamente ligada à da China. O gigante asiático representa mais de 90% de suas trocas comerciais. Mas na capital norte-coreana há diplomatas que explicam que Pyongyang não quer depender muito de Pequim, mas também não aprovam a mesma coisa por parte dos Estados Unidos, quaisquer que sejam as promessas de Donald Trump.

Pyongyang é profundamente nacionalista e a ideologia do regime, o Juche, repousa na auto-suficiência econômica.

O Norte está mais interessado no modelo vietnamita, um país comunista menor do que a China, onde o governo mantém controle total ao mesmo tempo em que se beneficia de uma economia de mercado.

- Inverstimentos arriscados -No ano passado, Kim Jong Un explicou que o arsenal nuclear estava pronto e que "a construção econômica socialista" era agora a prioridade. Seu discurso de Ano Novo foi dedicado quase inteiramente à economia, embora os analistas observem que nos últimos meses houve menos reformas.

"Kim não está apenas convencido a manter o controle, ele também está realmente preocupado com o estado da economia norte-coreana", diz Andray Abrahamian, pesquisador da Universidade de Stanford. "No fundo ele é um pragmático".

Com ou sem sanções, os investimentos no norte são arriscados.

As infraestruturas são deficientes, a corrupção é generalizada e não há segurança jurídica, dizem os especialistas.

A empresa egípcia de telecomunicações Orascom, por exemplo, investiu centenas de milhões de dólares para desenvolver a primeira rede de telefonia móvel no norte, a Koryolink.

Mas Pyongyang criou um operador paralelo e a empresa egípcia não conseguiu seu dinheiro de volta.

Os analistas também alertam sobre um acordo segundo o qual o Norte renunciaria a mísseis intercontinentais em troca do reconhecimento de seu status como estado nuclear.

"Mesmo que as sanções sejam levantadas, uma Coreia do Norte nuclear não conseguirá atrair grandes investimentos por causa da vulnerabilidade de suas relações pacíficas com seus vizinhos", disse Paul Choi, analista da CLSA.

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