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Rússia conta com China, mas asiáticos mantêm cautela, dizem analistas

Em fevereiro, Putin disse que a relação entre Rússia e China é "digna", com cada um apoiando o outro "em seu desenvolvimento" - Alexei Druzhinin/AFP
Em fevereiro, Putin disse que a relação entre Rússia e China é 'digna', com cada um apoiando o outro 'em seu desenvolvimento' Imagem: Alexei Druzhinin/AFP

Em Pequim (China)

04/03/2022 07h45Atualizada em 04/03/2022 07h47

A Rússia conta com a China para mitigar o efeito das sanções internacionais pela invasão da Ucrânia, mas Pequim não está disposta a fazer muito em nome da amizade, alertam analistas.

Os países ocidentais promulgaram sanções contra Moscou mirando o setor bancário e a moeda do país eurasiático. Vários bancos foram excluídos da plataforma bancária Swift, ferramenta essencial das finanças globais para facilitar as transferências.

A China, que se abstém de condenar a intervenção russa e rejeita o termo "invasão", se opõe a quaisquer sanções contra Moscou.

Desde a invasão russa da Crimeia em 2014, e as sanções anteriores contra Moscou, as relações econômicas e políticas China-Rússia foram fortalecidas.

O gigante asiático, um dos líderes mundiais do comércio, tem de longe as maiores reservas cambiais em euros e dólares.

A China "tem os meios financeiros para ajudar a Rússia" e é o único país que pode fazê-lo, diz a economista Paola Subacchi, da Universidade de Londres.

'Relação digna'

A amizade sino-russa é "um exemplo de relação digna, onde cada um ajuda e apoia o outro em seu desenvolvimento", estimou no mês passado o presidente russo Vladimir Putin, recebido com grande pompa em Pequim durante os Jogos Olímpicos de Inverno.

Os dois países, que se distanciaram de Washington, tendem a reduzir as próprias trocas em dólares por medo de possíveis sanções graças à extraterritorialidade da moeda americana.

"Quando o rublo caiu devido às sanções" ligadas à Crimeia, a China concordou em ser paga em yuan para compensar o aumento das importações em dólares, lembra Subacchi.

Mas Pequim não está disposta a fazer de tudo para ajudar a Rússia a aliviar ou contornar as sanções ocidentais.

O gigante asiático tem o próprio sistema de pagamentos interbancários transfronteiriços, o Cips, que funciona exclusivamente em yuan.

"O Cips pode, em teoria, substituir parcialmente o Swfit", diz Juuso Kaaresvirta, especialista em relações China-Rússia do Banco da Finlândia.

Mas os bancos chineses "não vão correr o risco" de fazê-lo por medo de se exporem a sanções que os privariam do acesso ao dólar, assegura Kaaresvirta.

Vários bancos públicos estariam, de fato, relutantes em financiar compras de matérias-primas na Rússia, segundo a agência Bloomberg.

Com sede em Pequim, o BAII (Banco Asiático de Investimento em Infraestruturas) - que é a resposta da China ao Banco Mundial - suspendeu ontem as atividades com a Rússia e Belarus.

'Salva-vidas'

Grande parte das exportações russas é de hidrocarbonetos, que a China adquiriu de forma crescente nos últimos anos.

No entanto, as importações chinesas de gás representam apenas uma pequena parte das importações da UE (União Europeia)

No mês passado, Pequim e Moscou fecharam um novo acordo para fornecer 10 bilhões de metros cúbicos de gás natural à China do Extremo Oriente russo. Os pagamentos seriam em euros.

A China e a Rússia têm vários projetos de gasodutos. O primeiro entrou em serviço em 2019. O gigante asiático, sem dúvida, medirá o apoio à Rússia com "grande prudência", já que a Ucrânia é um dos celeiros de trigo de Pequim, diz Jie Yu, do think tank Chatham House, em Londres.

A China quer evitar as sanções ocidentais, sem "virar as costas" para a Rússia, observa Gary Hufbauer, pesquisador do PIIE (Peterson Institute for International Economics), em Washington.

Logo após a invasão da Ucrânia, a Austrália acusou a China de ser o "salva-vidas" de Moscou por ter suspendido as restrições às importações de trigo russo.

Isso foi o produto de um acordo, conhecido desde o início de fevereiro, mas anunciado no dia da invasão, e que permite importações de todas as regiões russas, contra apenas sete antes.

"As coisas vão voltar ao normal", afirma à AFP o analista Chen Long, do gabinete Plenum, dando a entender que Pequim não irá além de outros países.

O analista lembra que "a Alemanha continua comprando gás russo" e se pergunta: "por essa razão, é o salva-vidas da Rússia?".