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As três grandes dívidas que estão asfixiando os americanos

21/09/2019 16h11

O endividamento dos consumidores americanos atingiu um novo patamar: $ 4 bilhões (ou R$ 16,6 bilhões), o maior nível na história do país.

Um adulto gasta em média $ 4 mil (R$ 16,6 mil) apenas em despesas de cartão de crédito, o que vem complicando a vida das famílias mais vulneráveis, que não têm como honrar suas dívidas.

"Isso tem sido um martírio", disse Dean Ledbetter, um veterano militar que afirma que as dívidas arruinaram sua saúde e o levaram à falência.

Ele começou a usar cartões de crédito e, quando viu que não podia pagá-los, pediu mais empréstimos aos credores (com taxas de juros gigantescas) e dinheiro a seus amigos.

"Fui à Guerra do Golfo Pérsico. Quebrei as costas e fiquei parcialmente cego", disse Ledbetter.

Quando voltou, ele sobreviveu com uma pensão e, após o fim de seu casamento, passou a morar em um carro na rua e com pouca comida.

E assim, pouco a pouco, ele foi quebrando financeiramente. "Eu tive que pedir dinheiro emprestado para sobreviver."

Ele devia mais de $ 100 mil (R$ 416 mil), uma quantia impagável para um aposentado que vive com uma pensão básica. "É como estar em um naufrágio. Tive que decidir afundar ou nadar, porque os juros continuavam subindo", afirmou.

"É uma humilhação. Eu sou um homem de honra e não poder cumprir com minhas obrigações afeta minha saúde".

Ledbetter não é o único que está lutando para que sejam colocados limites aos juros cobrados pelas instituições financeiras.

Nos EUA, 32 estados permitem qualquer forma de empréstimo fora do sistema bancário tradicional, que geralmente é a forma mais cara para se obter crédito.

É assim que as pessoas acabam presas em três grandes dívidas que gradualmente sufocam os devedores: crédito pessoal, empréstimos para compras de automóveis e empréstimo estudantil.

"Existe uma ideia errada"

Mary Jackson, diretora-executiva da associação de credores da Lenders Alliance Online, defende os termos sob os quais são concedidos os empréstimos às pessoas com alto risco de inadimplência.

"A taxa de inadimplência é de cerca de 25%. Isso aumenta os custos do setor porque as pessoas não estão em condições de cumprir suas obrigações."

Mas como esses juros estratosféricos são justificados?

"Os empréstimos por duas semanas têm juros de 15%. Não é verdade que você pagar juros de 300% porque não se solicita um empréstimo que tivesse validade de um ano", afirmou Jackson.

Mas há casos de empresas que cobram juros de até 80% em duas semanas, por conta de empréstimos anteriores contratados pelo mesmo cliente, segundo apurou a BBC.

Então o devedor acaba pagando juros sobre juros.

"Em alguns casos, isso pode ser verdade. Mas a maioria dos estados adotou certas práticas para impedir que os clientes busquem um empréstimo para cobrir o outro", disse Jackson.

Pobreza rural na economia mais rica do mundo

Em escala nacional, se muitas pessoas não conseguem pagar suas dívidas, as coisas podem se complicar, como aconteceu na grande crise financeira de 2008, quando muitas famílias não foram capazes de pagar suas hipotecas.

Muitos especialistas argumentam que a dívida do consumidor não é uma ameaça iminente para a economia do país. Menos ainda quando as taxas de juros estão em níveis historicamente baixos.

Mas alguns economistas, como Kenneth Rogoff, professor da Universidade de Harvard, reconhecem que uma "estagflação" crônica (estagnação econômica mais inflação) dificulta a situação das pessoas de baixa renda.

"Acho que existem regiões do país, especialmente fora das áreas urbanas, onde há menos trabalho, e o valor das casas caiu. São áreas mais precárias, onde a dívida do consumidor é um problema."

A crise da dívida estudantil

Em quais setores as dívidas dos consumidores estão crescendo mais rapidamente?

"Crédito pessoal, financiamento de veículos e, mais dramaticamente, dívidas educacionais", disse Rogoff. "A dívida estudantil afeta as pessoas que também estão procurando trabalho".

O economista explica que as leis foram modificadas há cerca de 15 anos, deixando os estudantes em uma situação "injusta", como ele define.

Aos 24 anos, Melissa Haggerty conta que, apesar de ter um emprego bem remunerado e fazer parte da classe média do país, ela não consegue pagar sua dívida estudantil, com juros de 11% ao ano.

"É difícil pensar no futuro quando você tem uma dívida devastadora", afirmou. "Não sei se algum dia poderei pagar essa dívida. É muito difícil olhar para além deste mês. Tenho um salário relativamente bom, mas os bancos me pedem para pagar mais do que ganho."

"Há taxas de juros que chegam a 1.000%"

Martha Wunderli representa uma organização sem fins lucrativos chamada AAA Fair Credit Foundation, que tenta ajudar os devedores no Estado de Utah.

"O custo da moradia representa metade ou mais da metade do salário médio de uma pessoa, e os salários não seguem a mesma tendência da economia", disse. "Embora o desemprego seja baixo, as pessoas não ganham o suficiente para cobrir suas despesas."

Wunderli explica que quando as pessoas entram nesse círculo de dívidas, elas não conseguem mais sair. "Há taxas de juros que podem chegar a 1.000%", disse a especialista, com base nas experiências da fundação que ajuda devedores.

*Este artigo é uma adaptação de um episódio do programa de rádio da BBC Business Daily, conduzido por Ed Butler.