Análise: Impeachment vai ser bom ou ruim para o mercado?
(Bloomberg) -- As derrotas políticas sequenciais da presidente Dilma Rousseff provocaram até agora no mercado menos dano do que se poderia esperar. O dólar ensaiou alta na abertura, mas recuou, puxando os juros futuros para baixo, e o Ibovespa opera "de lado". Alguns operadores já falam até mesmo em uma reação positiva a um eventual impeachment da presidente, embora, em linhas gerais, o mercado ainda mostre cautela.
O fato de a presidente Dilma não conseguir nem sequer formar quorum no Congresso para manter seus vetos contra aumentos de gastos leva parte do mercado a questionar se o impeachment não seria positivo para a economia. Afinal, a entrada de um novo presidente geraria a perspectiva de maior eficácia tanto na política quanto na economia.
Situação atual é diferente da que levou Itamar ao poder
É sempre lembrado nessas horas o exemplo de Itamar Franco, que lançou o Plano Real, acabando com a hiperinflação, apenas dois anos após substituir o primeiro presidente destituído em processo de impeachment no Brasil.
Um eventual processo de impeachment hoje, contudo, traz mais incertezas do que no processo que tirou Fernando Collor do poder em 1992, diz Rafael Cortez, analista político da Tendências Consultoria.
Para começar, há diferentes cenários no caso de Dilma sair: por desdobramentos da ação do TCU, que levaria o vice Michel Temer à Presidência, ou do TSE, que poderia levar a novas eleições. Em 1992, Itamar era o único sucessor possível.
Outra diferença entre 2015 e 1992 é que Collor era um "outsider", pertencia a um pequeno partido, o PRN. Hoje, Dilma é do PT, ainda o segundo maior partido do país, apesar do desgaste causado pela crise e pela operação Lava Jato.
Cortez considera que há um risco considerável de reação dos movimentos sociais contra um impeachment, embora, segundo ele, a maioria da população seja favorável à saída da presidente.
Nota do Fiat Elba X pedaladas fiscais
A questão legal também torna o impeachment hoje mais complexo, ainda que as decisões do Congresso sejam políticas, e não jurídicas. Em 1992, a evidência definitiva contra Collor foi a nota do Fiat Elba, uma prova prosaica, mas clara.
No caso do TCU, o fato em julgamento, as pedaladas fiscais, é muito mais complexo. Além disso, juristas se dividem sobre se fatos de uma administração anterior podem ou não embasar a perda de mandato.
Temer e Aécio: nada de baixa ambição
A Tendências calcula em 30% as chances de impeachment.
Ainda que o processo se torne inevitável, restará ainda ao novo presidente os mesmos desafios enfrentados por Dilma, de cortar gastos e aumentar impostos para desviar o país do desastre fiscal. E isso em um cenário de disputa política que vai se acirrar com eleições municipais no ano que vem e gerais em 2018.
A formação de um "governo de união nacional", como fez Itamar, certamente será tentada. Mas, aqui, o ex-vice de Collor também levou vantagem. Ele era visto como um político pouco ambicioso e não pertencia a um partido forte, o que ajudou a desarmar os rivais.
Baixa ambição, hoje, não é o que se poderia atribuir a nomes como Michel Temer ou Aécio Neves, dois entre os políticos que eventualmente poderiam herdar a Presidência.
Desafios continuarão com novo líder
Mike Moran, chefe de pesquisa econômica do Standard Chartered em Nova York, diz que continua cauteloso em relação à possibilidade de um impeachment, ainda que a situação política esteja evoluindo contra o governo.
Se houver o impeachment de Dilma, que não é o cenário-base de Moran, o mercado poderá ter algum alívio momentâneo, mas o novo governo terá que fazer escolhas difíceis.
Dilma pode até sair, mas os desafios fiscais não sairão junto com ela.
(Com a colaboração de Paula Sambo em São Paulo)
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