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Candidatos atacam preços e põem retomada da Petrobras em dúvida

Vinícius Andrade e Sabrina Valle

20/06/2018 14h14

(Bloomberg) -- As reações políticas ao aumento dos preços dos combustíveis no Brasil eliminaram quase metade do valor de mercado da Petrobras e lembraram os investidores dos perigos enfrentados por petroleiras estatais em ano eleitoral.

Até mesmo candidatos com visões conservadoras da economia estão prometendo ajudar a proteger os consumidores dos aumentos de preços, colocando em risco a política de ajustes diários pelas cotações internacionais que foi elogiada pelos investidores e contribuiu para o melhor resultado da Petrobras em cinco anos no primeiro trimestre. A petroleira com sede no Rio de Janeiro já congelou temporariamente os preços do diesel no atacado em um acordo que prevê reembolsos dos prejuízos pelo governo.

A Petrobras registra até agora o segundo pior desempenho do Ibovespa no mês de junho, mesmo após deixar as mínimas nesta semana. Apesar de reconhecerem a melhora dos fundamentos da empresa, recentemente o UBS Group e o Banco Santander rebaixaram as recomendações para as ações da Petrobras, de compra para manutenção, porque os riscos mais altos começaram a ter mais peso do que as boas notícias. É crescente o ceticismo entre os investidores em relação à possibilidade de manutenção da política de preços dos combustíveis na configuração atual.

"A visibilidade diminuiu bastante, ninguém sabe o que acontecerá com a política de preços de 2019 em diante", disse Gustavo Allevato, analista do Santander, em nota enviada por e-mail.

O presidente da Petrobras, Ivan Monteiro, enfrenta a difícil tarefa de recuperar a credibilidade da empresa após a renúncia do antecessor, Pedro Parente, em resposta à greve nacional dos caminhoneiros, que colocou a independência da empresa em dúvida. A crescente percepção de risco poderia ampliar os custos financeiros da petroleira mais endividada do mundo, disseram os analistas do UBS Luiz Carvalho e Gabriel Barra em relatório.

O mercado já precificou a volta do risco político no preço das ações, que caíram fortemente no último mês, disse Muhammed Ghulam, analista da Raymond James, que elevou a recomendação para a ação de underperform (equivalente a venda) para market perform (desempenho em linha com a média do mercado) em 11 de junho.

"Agora que a ilusão da autonomia da Petrobras para fixação do preço do combustível foi abalada, os políticos terão mais facilidade para intervir novamente no futuro", disse Ghulam, em entrevista por telefone, de Houston, nos EUA. "Quando saiu o primeiro anúncio de que a empresa baixaria os preços dos combustíveis, foi aí que investidores começaram a ficar preocupados. A Petrobras agora está em um nível de preço razoável."

A falta de clareza em relação às perspectivas para as eleições de outubro dificulta ainda mais o trabalho de Monteiro.

Socialmente conservador, Jair Bolsonaro afirmou que a Petrobras não deveria poder usar o poder de fixação de preços para compensar a corrupção. Ciro Gomes, um candidato de esquerda que vem ganhando força nas pesquisas, tem afirmado que a estatal não deveria acompanhar os preços internacionais porque tem produção doméstica e criticou as margens de lucro atuais da empresa, que considera elevadas.

A ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva, outra candidata de destaque, disse que a Petrobras deveria absorver as flutuações do petróleo e do câmbio ao definir os preços. Até mesmo o ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles, que é pró-mercado, tem defendido o uso de impostos para a criação de um colchão de estabilização para proteger os consumidores das oscilações de preços.

"A avaliação atual reflete um governo que pode interferir um pouco mais, mas não de forma drástica", disse James Gulbrandsen, gerente de recursos da NHC Capital no Rio, que ajuda a administrar US$ 3,5 bilhões em ativos. "Se um governo de esquerda for eleito, a Petrobras será, como já foi, uma das maiores vendas a descoberto do mundo."

Repórteres da matéria original: Vinícius Andrade em Sao Paulo, vandrade3@bloomberg.net;Sabrina Valle em Rio De Janeiro, svalle@bloomberg.net