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Euforia com Bolsonaro perde força com reforma emperrada

Jair Bolsonaro -
Jair Bolsonaro

Raymond Colitt e Simone Iglesias

27/03/2019 06h00

(Bloomberg) -- Após três meses de governo do presidente Jair Bolsonaro, investidores e políticos começam a duvidar de sua capacidade de cumprir promessas de campanha e de dar um pontapé inicial nas reformas econômicas e no combate ao crime, dois de seus principais apelos eleitorais. Já houve momentos neste curto período em que o governo pareceu que iria desmoronar.

Bolsonaro teve perda de apoio popular e antagonizou com um importante aliado, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), ao mesmo tempo em que auxiliares palacianos se veem em meio a intrigas e brigas pelo poder. Enquanto isso, a reforma da Previdência está parada no Congresso e sua aprovação é incerta.

"O governo não tem base nenhuma para aprovar reforma da Previdência. A preços de hoje, ela não existe, a não ser que o governo mude radicalmente sua postura com o Congresso", disse Thomas Traumann, consultor de comunicação do Rio de Janeiro, que assessorou ex-presidentes e ex-ministros.

Otimismo desvanecido

Em um sinal de redução do otimismo, o dólar acumula alta mensal de mais de 3%, enquanto o Ibovespa caiu 4,6% em relação a níveis recordes históricos atingidos recentemente. De acordo com uma pesquisa com 122 investidores institucionais publicada pela XP Investimentos no início deste mês, o mercado acionário pode cair mais 20% se a reforma emperrar. Pesquisa Ibope divulgada na semana passada mostrou uma queda de 16% no apoio a Bolsonaro.

Após anos de recessão, escândalos de corrupção e tumultos políticos, o mero pensamento de reformas econômicas fracassadas desencadeia ataques de pânico entre líderes empresariais.

"Se nós não conseguirmos colocar essa nova Previdência no ar, não vai ter investimento, o Brasil quebra, volta o desemprego", disse o empresário Luciano Hang, dono de uma loja de departamentos e um dos maiores entusiastas do governo Bolsonaro.

Para frustração dos investidores que acreditavam na autoridade do ministro da Economia, Paulo Guedes, muitos dos problemas do governo não provêm da oposição, que está enfraquecida, mas de suas próprias fileiras. A autonomia de Guedes é relativa e sua pauta liberal acaba contaminada por problemas políticos.

Auxiliares presidenciais brigam abertamente pelo poder; ideólogos de extrema-direita hostilizam ala mais moderada; e o próprio presidente continua a agir como se ainda estivesse em campanha, mobilizando sua base de apoio e provocando opositores nas redes sociais.

Uma fonte permanente de atrito são os filhos de Bolsonaro, que propõem políticas, nomeiam funcionários e circulam com amigos pelos corredores do Palácio do Planalto, apesar de não terem nenhum papel oficial no governo.

Carlos, o segundo dos quatro filhos homens, responsável pela campanha de mídia social de Bolsonaro no período eleitoral, colocou "observadores" dentro das assessorias especial e de imprensa do presidente para ficar de olho na cobertura da mídia e nas ações de servidores públicos que trabalham no palácio. Esta situação levou a mudanças nas secretarias de Comunicação e de Imprensa da Presidência, segundo uma fonte com conhecimento direto das negociações.

Foi também um tuíte crítico de Carlos que levou Rodrigo Maia a declarar que o presidente "precisa gastar mais tempo na reforma previdenciária e menos no Twitter". Do jeito que as coisas estão, a reforma da Previdência não seria aprovada hoje, complementou Maia.

Apoiadores de Bolsonaro dizem que esta é uma nova maneira de fazer política, mas os críticos argumentam que há falta de liderança e de habilidade, e que os políticos, independentemente de serem novos ou antigos, ainda precisam negociar para fazer as coisas acontecerem.

'Nova política'

"O que está faltando para Bolsonaro é descer do palanque e colocar em prática o que sabe, ele precisa dizer quem manda, mostrar isso dentro de casa e dentro do governo", disse a senadora Simone Tebet (MDB-MS), presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, em entrevista à Bloomberg por telefone.

Os investidores ainda estão dando um desconto aos desacertos, atribuindo as turbulências ao fato de ser o começo de um novo governo. A maioria acredita que a reforma da Previdência será aprovada, embora mais tarde e mais diluída do que se esperava antes.

"Estávamos antecipando a volatilidade no processo de negociação", disse Shamaila Khan, diretora de dívida de mercados emergentes da AllianceBernstein. "O processo de reforma será apoiado pela opinião pública e as taxas de aprovação de Bolsonaro continuam altas."

Para a base de apoio apaixonada pelo presidente, o ambiente ruim é em grande parte uma invenção da mídia. A imprensa é um alvo sistemático da ira de Bolsonaro.

"Nosso presidente está sofrendo por causa da mídia, mas eu ainda confio nele", disse Sibelli Marcolina, advogada do Paraná. "Ele tem uma grande responsabilidade de mudar esse país, o que ele certamente não será capaz de fazer em apenas um dia."

Embate com Sergio Moro

Desde que o presidente, o ministro da Justiça, Sergio Moro, e Carlos Bolsonaro confrontaram publicamente Rodrigo Maia na semana passada sobre as prioridades legislativas e uma aparente falta de compromisso com a reforma da Previdência e o pacote anticrime, integrantes do governo correram para apagar o incêndio e tranquilizar os investidores. Moro disse que o impasse foi superado e o vice-presidente, general Hamilton Mourão, tem clamado por maior diálogo entre Executivo e Legislativo.

"Os pontos focais são clareza nos objetivos, determinação para conquistá-los e paciência para obter o melhor diálogo", disse Mourão à Bloomberg por meio de mensagem de texto.

No entanto e apesar de buscar ser um moderador no meio de constantes crises, ele é alvo de retaliação do guru da família Bolsonaro, o filósofo Olavo de Carvalho. Com isso, o vice não consegue aderência entre a base de eleitores do presidente e é visto com desconfiança por setores do governo.

Bolsonaro fala em pacificação

Bolsonaro tenta conter a crise que pode colocar em xeque o sucesso de seu governo. Em reuniões com ministros, pediu pacificação. No entanto, não é a primeira vez que o governo promete mais coesão e harmonia. A não ser que Bolsonaro passe a ter e a estabelecer prioridades claras e impor ordem em seu gabinete, é provável que a confusão continue.

Ainda à procura de sinais claros de que o governo e o Congresso concordam com a reforma previdenciária, os investidores ficaram preocupados, nesta terça-feira, quando o ministro Paulo Guedes cancelou audiência na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara em que deveria acalmar os ânimos e avalizar a votação da reforma. Horas antes, Bolsonaro driblou a agenda e foi com sua esposa à pré-estreia do filme "Superação, o Milagre da Fé", num shopping de Brasília.

Em seus editoriais, os três principais jornais do país, Folha, Estado, e Globo criticaram Bolsonaro pelas turbulências políticas e questionaram sua capacidade de exercer as funções presidenciais.

"O que ele mostrou até aqui é que teremos mais três anos e nove meses de turbulência. Economicamente, o Brasil vai continuar sendo um país instável com um governo que cria suas próprias crises", afirmou Thomas Traumann.

Para o analista político Creomar de Souza, da Universidade Católica de Brasília, o problema central de Bolsonaro é que ele quer jogar sob novas regras, mas não sabe quais, sendo que prometeu um governo reformista e de resolução de todos os problemas enfrentados pelos brasileiros.

"Ao ganhar a eleição, Bolsonaro demoliu a casa, mas ele não tem um projeto para construir a casa nova. Daí nasce a crise que atravessa."

--Com a colaboração de Flavia Said e Vinícius Andrade.

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