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Venezuelano deixa de consumir carne em meio à grave crise econômica

16/03/2021 23h57

Ron González.

Caracas, 16 mar (EFE).- A desilusão ficou estampada no rosto da operária María Ponte, ao deixar um açougue da maior favela da Venezuela, localizada na cidade de Petare, na região metropolitana de Caracas. Ela entrara no local com a esperança de que um fenômeno tivesse derrubado o preço da carne, algo que não consumiu neste ano.

Na saída do estabelecimento, onde o produto abarrota os refrigeradores e geladeiras, a mulher carrega vários quilos de pele de galinha, com que ela fabricará o próprio óleo que utilizará para fritar ovos e preparar 'arepas', um pão à base de farinha de milho que é muito popular no país.

"Tem mais de três meses que não como um pedacinho de carne", lamentou Ponte, em conversa com equipe da Agência Efe.

"Foi um bife que o meu filho e eu comemos. E somos só duas pessoas em casa, ninguém mais", completou.

Em outro ponto de Petare, a aposentada Encarnación Almarza tem melhor sorte e compra vários quilos de carne. Logo depois, contudo, explica que não são para consumir em casa, mas sim para preparar pastéis recheados que vende diariamente, como forma de tentar completar a renda mensal.

PODER DE COMPRA.

O caso das duas mulheres encontradas pela Agência Efe se repete cada dia mais na Venezuela, país que atravessa a pior crise econômica de sua história moderna.

Segundo o presidente da Federação Nacional de Produtores de Gado (Fedenaga), Armando Chacín, o problema no consumo não é a escassez ou até mesmo o preço da carne, mas sim a queda no poder aquisitivo da população local.

"A carne da Venezuela é a mais barata da América Latina e de muitos países do mundo", disse a liderança do setor, em entrevista por telefone concedida à Efe.

"Há um debate sobre o escasso poder aquisitivo, que fez cair o consumo proteico dos venezuelanos" completou.

Atualmente, o salário mínimo no país é de 1,8 milhão de bolívares, o que equivale a R$ 5,40, de acordo com cotação verificada nesta terça-feira no site do Banco Central do Brasil.

Ao todo, cerca de sete milhões de pessoas, entre funcionários públicos e aposentados, recebem esse valor, embora o governo do presidente Nicolás Maduro afirme que alguns grupos têm renda elevada por meio de programas sociais.

Apuração da Agência Efe, no entanto, indicou que servidores e pensionistas recebem, no máximo, o equivalente a R$ 56,29, enquanto o quilo de carne varia entre R$ 22,51 e R$ 33,77.

CONSUMO DESPENCA.

Segundo Chacín, o consumo de carne na Venezuela, que era de 55 quilos por pessoa em 1999, ano em que o ex-presidente Hugo Chávez chegou ao poder, despencou para apenas três quilos, em 2020.

"Entendemos que hoje em dia não há capacidade para consumir o abate que estamos produzindo no país, embora seja baixa", explicou o presidente da Federação Nacional de Produtores de Gado.

O dirigente aponta que a produção na Venezuela cobre apenas 40% das necessidades de acordo com o tamanho da população, estimada em 30 milhões de pessoas.

No entanto, ao invés de escassear, a carne sobra nos supermercados do país.

"O grande drama do cidadão venezuelano é que ele tem a carne mais barata da América Latina, mas não pode comê-la. Não tem poder de compra para comprá-la", afirmou Chacín.

Este cenário fez com que os produtores da Venezuela fizessem um pedido ao governo pela aprovação de licenças de exportação de gado pronto para ser abatido.

Chacín, contudo, lembra que além da autorização do governo de Nicolás Maduro, falta ao país a certificação da vacinação contra febre aftosa.

"Se começarmos a imunizar o gado hoje mesmo, em quatro anos, poderíamos estar exportando. Como se vê, na comparação com países da região, estamos em desvantagem", afirmou o representante do setor produtivo.