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Presidente da Volkswagen vê empresa em 'situação diferente da concorrência'

Fábrica da Volkswagen em São José dos Pinhais (PR) - Divulgação
Fábrica da Volkswagen em São José dos Pinhais (PR) Imagem: Divulgação

Cleide Silva

São Paulo

17/03/2019 07h52

Enquanto a Ford está com operações paradas em protesto de trabalhadores contra o anúncio de fechamento da fábrica no ABC paulista, a vizinha Volkswagen suspenderá parte da produção por 12 dias, a partir do dia 25, por razões diferentes. O grupo dará férias coletivas a 4,5 mil funcionários para preparar a fábrica para produzir um novo carro, um modelo inédito desenvolvido no país.

O presidente da empresa na América Latina, Pablo Di Si, não dá detalhes sobre o novo carro, que está na lista dos 20 lançamentos prometidos até 2020. Ainda faltam oito.

Segundo sindicalistas, trata-se de um carro compacto, com características de utilitário-esportivo. "O que posso dizer é que, daqui para frente, vamos focar nos SUVs, que é a tendência do mercado global e também do brasileiro, e modelos de segmento superior", afirma Di Si. "Os populares não vão desaparecer, mas o segmento vai encolher."

Como está a Volkswagen nesse contexto de anúncio de fechamento da fábrica da Ford e de ameaçadas por parte da GM?

Estamos numa situação diferente, de investimento, de crescimento, de uso de novas tecnologias. Seguimos com o plano anunciado em 2016 de investir R$ 7 bilhões até 2020 e lançar 20 produtos. Já lançamos 12. Faltam quatro para este ano e quatro para 2020. E espero nos próximos meses anunciar novo ciclo para 2021 a 2025.

Do que depende esse anúncio?

Estamos desenhando os carros, com base em um mapeamento de mercado futuro. Precisamos negociar com sindicatos, revendas, governos. Estou feliz com os avanços até agora. Com os sindicatos está bem encaminhado, com acordos de flexibilização de jornada e produtividade. Com os concessionários discutimos margens de lucro e novos formatos de vendas, como as lojas digitais. Com fornecedores há um trabalho para melhorar qualidade e reduzir custos.

E com os governos?

Estamos conversando com o governo de São Paulo há um ano e meio, principalmente, sobre créditos do ICMS. O governador (João Doria) publicou um decreto que é ótimo. Envolve investimentos, empregos e redução de até 25% do ICMS. Mas, para a Volkswagen, e acho que para a maioria das indústrias, não resolve o problema principal, que são os créditos das exportações. Ninguém está falando de subsídio. Quero o dinheiro que pertence à Volkswagen. Somos a maior exportadora da indústria automobilística. Exportamos entre 130 mil e 160 mil carros ao ano. Quando compramos as peças pagamos em média 14% de ICMS, mas exportamos o carro com ICMS zero. Isso gera um dinheiro que o governo nos deve e que tenho de colocar no balanço financeiro. Alguns Estados, como o Paraná, resolveram isso e não geram créditos.

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O crédito retido influencia na escolha do local para investir?

Queremos exportar mais e temos fábricas em São Paulo, no Paraná e na Argentina e podemos escolher qual delas é melhor. O T-Cross, nosso primeiro SUV nacional feito no Paraná, será exportado para 50 países, inclusive de fora da América Latina, como Egito e Tunísia. Nosso portfólio futuro vai ganhar mais SUVs, que são veículos de maior valor agregado. Quanto maior o valor do carro mais ICMS acumula. Estamos acumulando de R$ 3 mil a R$ 4 mil por carro exportado, dependendo do modelo. Quando a indústria investe no Brasil não é só para o mercado interno. Precisamos concorrer com o mundo e essa questão é uma das várias ineficiências que temos.

Segundo analistas, a Volks teve prejuízo de R$ 4 bilhões no Brasil desde 2013. Está correto?

Não reportamos resultados por país. Temos um objetivo arrojado, mas possível, de encerrar o ano no break-even (equilíbrio) em nossas finanças. Temos prejuízos, mas mais importante do que olhar o passado é olhar o futuro e virar essa chave. Os acionistas não vão continuar investindo aqui pelo resto da vida. Acreditamos no Brasil no curto e médio prazos, mas há um plano que precisa ser executado. Se peço dinheiro para investir e prometo um retorno, preciso cumprir.

Como estão as vendas?

A América do Sul é a região que mais cresce em vendas da marca, resultado que se deve, principalmente, ao Brasil. Em 2018 crescemos 13,1%, enquanto nossas vendas globais aumentaram 0,2%, com a Europa crescendo 3,6%, a América do Norte caindo 3% e a China, 2,1%.

Que novo modelo será produzido no ABC?

Dentro dos 20 lançamentos vamos ter mais um em São Bernardo, mas ainda não posso revelar qual. Estamos em plena preparação. O lançamento será em 2020. O que posso falar é que nossos novos carros vão para o segmento superior, seja um SUV ou um CUV (intermediário entre sedã e SUV).

Não vai ter mais carro popular?

O popular não vai desaparecer, mas o segmento vai encolher. É o mesmo que está acontecendo com os sedãs - é um ótimo carro, mas está sendo comido pelos CUVs e SUVs. Esses segmentos são os que mais crescem no Brasil e no mundo e a Volkswagen também vai entrar nessa ofensiva.

Carros de entrada representam 15% das vendas. Esse segmento vai para segundo plano?

Em 2020 a 2025, com o programa Rota 2030, haverá mudanças para atender a níveis de emissão e de segurança, o que é positivo para o consumidor. Em 2002, 2003, os carros não tinham a segurança que têm hoje e que será maior em 2025. Alguns modelos morreram porque não conseguiram passar no crivo da segurança atual. Um exemplo é a Kombi. Muitos dos populares de hoje não vão passar nos novos testes. Não significa que não vai ter mais carro pequeno. Vai continuar existindo, mas ao colocar maior segurança, mais conectividade, o preço vai mais para cima. Não tem como fazer diferente. É um processo e estamos vivenciando isso na Europa, nos EUA. Se tivéssemos volume maior de produção para vendas internas e exportação conseguiríamos reduzir o custo. Para isso, reformas são fundamentais. Já foi um ótimo passo a reforma trabalhista. Mas são necessárias outras, como a da Previdência e a tributária.

Como o sr. vai conseguir exportar T-Cross para 50 países?

Não vamos ter a melhor rentabilidade nos negócios. Não vamos perder dinheiro, mas o retorno sobre o investimento será pequeno. Mas se ficarmos só na América Latina vamos perder no longo prazo.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.