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Tese de Piketty em "O Capital no Século XXI" está errada, aponta estudo de brasileiro no FMI

15/08/2016 17h18

SÃO PAULO - Desde que o seu livro mais famoso e emblemático foi lançado, em 2014, o economista Thomas Piketty vem sendo contestado sobre a sua tese do "O Capital no Século XXI". Porém, se em 2014 foi o jornal britânico Financial Times que encontrou erros em suas planilhas, desta vez foi um economista brasileiro que contestou as conclusões do livro. 

O economista Carlos Goés destacou, em um recente trabalho para discussão publicado pelo FMI (Fundo Monetário Internacional), que não há "nenhuma evidência empírica de que as previsões catastróficas de Piketty em relação à desigualdade devem se materializar". Vale destacar que o artigo não reflete necessariamente a posição oficial do FMI. As conclusões de Góes, que também é pesquisador-chefe do Instituto Mercado Popular, foram destacadas no site da publicação e também recentemente pela revista Exame. 

A tese central do livro é de que, quando o retorno do capital é superior ao crescimento econômico e, com isso, a riqueza tende a ficar mais concentrada. E faz uma previsão um tanto aterradora: as desigualdades na concentração de riqueza estão voltando a níveis vistos pela última vez antes da Primeira Guerra Mundial. 

"Resumidamente, Piketty diz que, quando a diferença entre os retornos (rendimentos) ao investimento de capital (r) e a taxa de crescimento econômico (g) aumenta, a participação do capital na renda nacional deve aumentar. Isso significa que capitalistas se apropriariam de uma parte maior da renda nacional, enquanto trabalhadores ficariam com uma parcela menor. Além disso, como a renda do capital (aluguéis, juros, dividendos etc.) é distribuída de forma mais desigual do que a renda do trabalho (salários), ele diz que o aumento da participação do capital na renda nacional deve levar a um aumento da desigualdade total de renda – e, ao longo do tempo, essa desigualdade de renda resultaria numa desigualdade de riqueza", afirma Goés. 

Contudo, o economista brasileiro ressalta que, embora a tese do francês traga muitos dados, o livro não tem nenhuma tese formal para as hipóteses, apenas algumas correlações aparentes que pode ser visualizada em alguns gráficos de linha. 

Góes ressalta que, se as hipóteses fossem corretas,  seria de se esperar uma relação positiva entre a diferença  r-g  e as participações do capital e dos mais ricos na renda nacional. Porém, analisando os dados de 19 países ricos numa amostra que se estende por mais de 30 anos, a correlação simplesmente não existe, sendo próxima a zero.

Contudo, ele destaca que a ausência de correlação não é a ausência de causalidade, podendo ser necessário algum tempo para que a relação seja observada. Por isso, o estudo de Góes utilizou também uma técnica estatística que concluiu que,  mesmo depois de controlar por outros fatores, quando há um aumento em  r-g , não se observa uma resposta positiva na participação do capital na renda nacional.  

Para o economista brasileiro, Piketty pode ter subestimado a importância da taxa de poupança ao supor que ela se mantém ao longo do tempo, quando ela costuma flutuar com o crescimento. "Como a taxa de poupança cai – ou seja, os capitalistas investem menos – quando r-g sobe, não se observa o aumento da participação do capital na renda nacional previsto pelo francês", avalia Goés. 

Esse estudo leva a duas implicações, afirma o economista. A primeira é de que o o aumento na desigualdade de renda observada nos países ricos não tem muito a ver com essa dinâmica que Piketty descreve, diz Goés, e sim a outros fatores. Como por exemplo inovação tecnológica, aumento do salário de pessoas com maior qualificação. Já a segunda implicação  dos resultados é que não existe uma “lei de ferro” das economias de mercado que as faz tender à desigualdade extrema.

" Temos de corrigir as desigualdades ruins que existem no mundo — e elas existem em demasia. Mas, para isso, precisamos saber quais as causas fundamentais dessa desigualdade. E o que as evidências empíricas mostram é que elas não são causadas pelos fenômenos que Piketty relata", conclui o economista brasileiro.