Fiscais faziam vista grossa a irregularidades com carnes no PR, aponta CGU
Fiscais da Superintendência do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento fizeram "vista grossa" a irregularidades em frigoríficos no Estado do Paraná em 2014. Os agentes públicos deixaram de aplicar R$ 453.807,08 em multas, referentes a 29 irregularidades encontradas em oito frigoríficos naquele ano.
A conclusão é de um relatório da CGU (Ministério da Transparência, Fiscalização e Controladoria Geral da União). O documento foi apresentado em dezembro de 2016, após dois anos de auditoria. A investigação da CGU aponta diversos problemas na fiscalização do Ministério da Agricultura em relação à produção de carne bovina no Paraná.
Os frigoríficos do Estado estão entre os principais alvos da Operação Carne Fraca, desencadeada pela Polícia Federal na sexta-feira (17) com a prisão de 37 pessoas --entre funcionários de frigoríficos e servidores públicos. A operação da PF investiga irregularidades e fraudes na fiscalização da produção de carne no Brasil. Das 21 empresas investigadas, 18 ficam no Paraná.
Segundo o relatório da CGU, fiscais do Paraná deixaram de autuar empresas em casos como:
- presença da bactéria salmonella, sem medidas para acabar com a contaminação;
- falta de data de produção e validade em produtos inspecionados;
- transporte de produtos desrespeitando a temperatura máxima permitida;
- descumprimento de medidas relacionadas à saúde física e mental dos animais;
- falta de iluminação e pavimentação em alguns frigoríficos;
- resíduos de sabão em mesa de manipulação de miúdos;
- e problemas de higiene (como funcionários trabalhando sem uniforme, restos de sangue e carne secos nas paredes e funcionários lavando os uniformes de trabalho em casa).
O que dizem os fiscais
Questionado pelo UOL na noite de quarta-feira sobre os problemas na fiscalização, por meio de sua assessoria de imprensa, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento não respondeu até a publicação desta reportagem.
No processo administrativo da CGU, os fiscais respondem aos questionamentos negando irregularidades e alegam, por exemplo, que não há estrutura adequada para as fiscalizações. Sobre o fato de não terem aplicado as multas, os responsáveis afirmam que os prazos para manifestação das empresas e correção dos problemas foram respeitados, e que não deixaram de fazer nenhuma autuação obrigatória.
Apenas metade das inspeções foi feita
A auditoria da CGU também constatou que, em 2014, a equipe de fiscalização de bovinos fez apenas metade das inspeções in loco nos frigoríficos que estavam programadas para aquele ano. Dos 16 estabelecimentos que produzem carne bovina no Paraná, só oito tiveram o local de produção inspecionado como deveriam.
As constatações da auditoria apontam também que, em alguns casos, os fiscais que atuavam nas empresas não possuíam a independência necessária para fazer o trabalho. Um deles estava havia 17 anos fiscalizando a mesma empresa, o que, na visão dos auditores da CGU, pode ter criado proximidade entre o agente público e a empresa que ele deveria fiscalizar.
Planejamento de inspeções falho, auditoria deficiente em rótulos, falta de fiscalização permanente onde ela é obrigatória e a não apuração de denúncias feitas ao órgão completam o panorama da fiscalização de bovinos do Ministério da Agricultura no Paraná, de acordo com o parecer da CGU.
Operação Carne Fraca investiga 21 empresas
A Polícia Federal produziu apenas um laudo técnico em uma das 21 empresas investigadas para embasar a Operação Carne Fraca, e usou informações de outro laudo de 2015, que faz parte de um processo administrativo do Ministério da Agricultura. O governo tinha conhecimento das suspeitas de fraude pelo menos desde outubro de 2015.
A Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais (APCF) divulgou nota afirmando que as conclusões da operação sobre os danos à saúde pública não têm embasamento científico. Segundo a entidade, os peritos federais foram acionados pela PF apenas uma vez durante as investigações e o laudo resultante desse trabalho não comprovou tais danos.
A equipe da PF que atua no caso defendeu a operação e disse que ainda há muito material sob sigilo. Apesar das críticas sobre a falta de laudos técnicos, o delegado defendeu a operação com base em outras provas da investigação, como escutas, depoimentos e quebras de sigilo bancário.
A Fenapef (Federação Nacional dos Policiais Federais) defendeu a atuação dos agentes federais, mas criticou a forma como as investigações foram divulgadas.
Membros do governo e representantes do setor produtivo criticaram a atuação da Polícia Federal no caso. O ministro da Agricultura, Blairo Maggi, afirmou que a "narrativa" da PF está cheia de "fantasias" e "idiotices". Nesta quarta-feira (22), o ministro disse que os prejuízos para o setor são estratosféricos.
Diversos países já anunciaram restrições temporárias à carne brasileira desde que a Operação Carne Fraca foi deflagrada.
As empresas envolvidas, dentre elas algumas das maiores do ramo no país, como a BRF (dona das marcas Perdigão e Sadia) e a JBS (dona das marca Friboi, Seara e Swift), negam envolvimento nas irregularidades.
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