Gasolina formulada pode ser um problema para o consumidor e seu carro?
Você sabe o que é gasolina formulada? Há muitas dúvidas se esse combustível causa ou não problemas para o usuário e seu carro. É uma gasolina vendida legalmente, e a ANP (Agência Nacional do Petróleo) afirma que não há diferença entre a formulada e a gasolina tradicional, mas técnicos divergem sobre seus efeitos e dizem que consome mais.
Órgãos de defesa do consumidor também defendem que os clientes sejam informados sobre qual produto está comprando, o que não ocorre na prática. No ano passado, 4,5% da gasolina vendida no país foi formulada.
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A diferença está no processo de produção
As diferenças básicas entre os dois tipos são onde e como são produzidos. A gasolina tradicional é feita nas refinarias. A formulada é produzida em centrais petroquímicas ou formuladores.
As refinarias separam o petróleo em diversas partes. Essas partes são misturadas até chegar a produtos finais como diesel, gás de cozinha ou gasolina.
As centrais e formuladores não fazem essa primeira etapa de separar o petróleo cru. Elas compram as partes já separadas pelas refinarias e só as transformam em outros produtos.
A diferença entre centrais e formuladores é o grau de complexidade. As centrais conseguem realizar transformações adicionais nas partes recebidas, gerando produtos mais especializados e complexos, enquanto as formuladoras se limitam à mistura mecânica.
Petroquímicas e formuladores
No caso das petroquímicas, o foco comercial são produtos como plásticos, borrachas ou adesivos. Durante o processo de conversão das partes de petróleo, sobram alguns subprodutos que acabam formulados e revendidos no mercado na forma de gasolina. No ano passado, 4,1% da gasolina brasileira teve origem em centrais petroquímicas.
Os formuladores têm autorização da ANP para comprar partes petroquímicas e simplesmente misturá-las gerando combustíveis líquidos. Representam cerca de 0,4% da oferta total do mercado.
Nada disso quer dizer que esses produtos tenham qualidade inferior. “Não há qualquer diferença real entre as chamadas gasolina refinada e a formulada”, afirmou Adriana Garcia, pesquisadora do Laboratório de Combustíveis e Lubrificantes do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT). De acordo com a engenheira química, mesmo em condições laboratoriais não é possível diferenciar um da outra. “São tão similares que as amostras são indistinguíveis”, disse.
Consumo pode ser 5% maior
Apesar de a ANP e alguns especialistas dizerem que não há diferença prática entre as gasolinas, outros dizem que, no mínimo, pode haver um consumo 5% maior de combustível.
É possível fazer produtos que atendam à especificação, mas que tenham uma densidade relativamente baixa. Isso, segundo o diretor de combustíveis da Associação Brasileira de Engenharia Automotiva (AEA), Rogério Gonçalves, pode resultar em um aumento do consumo.
“Você pode ter um produto com menos energia”, afirmou. Embora não haja estudos a respeito, o representante da AEA disse estimar que o aumento do consumo seria algo de 4% a 5%. No entanto, isso é menor do que os 10% causados por ligar o ar-condicionado do carro ou os 20% motivados por rodar com pneus descalibrados.
Para resolver o problema, a AEA já solicitou à ANP que, na próxima revisão da norma, seja incluído um limite mínimo para a densidade da gasolina.
Há danos aos motores?
Há suspeitas de que o produto formulado possa provocar danos aos motores ou a partes emborrachadas. Rogério Gonçalves não vê riscos. Para ele o produto formulado é seguro. “O problema é que [os consumidores] confundem com ocorrências de combustível adulterado e acabam culpando o formulado”, afirmou.
O engenheiro químico e coordenador do Laboratório de Combustíveis Automotivos (Lacaut) da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Carlos Yamamoto, disse que é preciso avaliar as especificações.
Segundo ele, o importante é que o combustível, qualquer que seja sua origem, atenda ao determinado na resolução 40/2013 da ANP. "Se o combustível atender a especificação, [o automóvel] não vai ter nenhum problema". Ele disse que os critérios de qualidade usados na regra brasileira acompanham os adotados mundialmente.
Placas deveriam identificar, mas postos não querem
A Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Proteste) disse que os postos de gasolina deveriam exibir cartazes informando se a gasolina é formulada ou não, com base nos princípios de direito à informação e de liberdade de escolha, consagrados no Código de Defesa do Consumidor.
“Independentemente de a gasolina formulada ser prejudicial ou não, esses são direitos básicos. É fundamental saber o que se está comprando”, declarou a advogada da Proteste Livia Coelho.
Tramita na Câmara dos Deputados um projeto de lei (PL 8283/2017) que pretende obrigar os postos a fixar cartazes informando a origem da gasolina vendida.
A medida é criticada por Helvio Redeschini, diretor de Planejamento Estratégico e Mercado da Plural – organização que representa as maiores distribuidoras de combustíveis do país.
Segundo ele, para atender à determinação, seria necessário criar estruturas segregadas ao longo de toda a cadeia de distribuição e revenda. “Isso geraria um custo operacional absurdo”, afirmou. “Imagine um posto que tenha um único tanque para armazenar toda a gasolina, como faria?”
ANP diz que toda gasolina é igual
A posição oficial da ANP é que nem sequer existe mais de um tipo de gasolina à venda no mercado brasileiro. "Toda a gasolina produzida no Brasil, assim como em outros países, é formulada", declarou a agência, por meio de sua assessoria de imprensa.
"Você não coloca petróleo de um lado da refinaria e pega gasolina pronta do outro. Você primeiro quebra o óleo em diversas frações que precisam ser misturadas", disse Yamamoto, da UFPR.
A segunda etapa do processo é uma formulação. É isso o que leva a ANP a cravar que, independentemente de sua origem, todo combustível é formulado.
(Reportagem: Fábio Rodrigues; edição: Armando Pereira Filho)
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