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Mercado de bitcoin quer regulação, mas criação de 2 associações racha setor

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Imagem: Getty Images

Téo Takar

Do UOL, em São Paulo

18/09/2018 04h00

O sucesso alcançado pelo bitcoin no ano passado atraiu mais de 1 milhão de investidores e despertou o interesse de diversas empresas para o mercado de moedas virtuais, até então incipiente no Brasil. O problema é que, embora recente, o segmento já enfrenta um "racha" no país.

As “exchanges”, como são conhecidas as corretoras que oferecem moedas virtuais, e outras companhias que utilizam a tecnologia blockchain estão se organizando para criar regras para o setor e tornar o ambiente de negócios mais seguro, de olho no potencial das chamadas criptomoedas.

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Em menos de seis meses, duas associações foram criadas com objetivos aparentemente semelhantes, mas com participantes bem distintos. De um lado estão as grandes corretoras do setor. Do outro, empresas novatas que buscam oportunidades com a nova tecnologia. Saiba quais são as entidades e o que defendem.

A associação dos grandes

No início deste mês, foi oficializada a criação da Abcripto (Associação Brasileira de Criptoeconomia). Ela reúne as principais corretoras de criptomoedas do país: Mercado Bitcoin, Foxbit e Braziliex. Também participam algumas fintechs e a unidade brasileira do Blockchain Research Institute (BRI), um centro de pesquisas sobre a tecnologia Blockchain criado no Canadá.

A presidência da Abcripto é ocupada por Luiz Roberto Calado, economista-chefe do Mercado Bitcoin. A vice-presidente é Natália Garcia, diretora jurídica da Foxbit. Carl Amorim, do BRI Brasil, ocupa a diretoria executiva da associação.

A associação dos pequenos

Criada em abril deste ano, a ABCB (Associação Brasileira de Criptomoedas e Blockchain) é formada por pouco mais de uma dezena de pequenas companhias de tecnologia financeira (fintechs).

O grupo é liderado pela Atlas Quantum, uma fintech de investimento em criptomoedas. A ABCB nomeou como seu presidente Fernando Furlan, que já comandou o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica).

Interesses semelhantes, estratégias diferentes

Boa parte dos membros da Abcripto e da ABCB se conhecem, mas as duas entidades alegam que não sabiam dos planos de criação da outra, apesar da diferença de poucos meses entre suas fundações.

“Estamos trabalhando na criação da associação desde outubro do ano passado, quando a alta no preço do bitcoin despertou uma maior atenção sobre o setor”, disse Natália, da Abcripto.

“Não sabíamos dessas conversas [de criação da Abcripto] lá atrás. Mas não vejo essa divisão como algo ruim. Faz parte da democracia. É positivo para todo o setor que ele seja mais organizado”, disse Furlan, da ABCB.

“A Abcripto representa as grandes empresas do setor, enquanto a ABCB reúne as pequenas e médias. Se houver convergência de interesses, estamos abertos a reunir as grandes também”, afirmou Furlan.

Apesar da divisão do setor entre as duas entidades, Amorim defende que não haja enfrentamento entre elas, pois isso prejudicaria todo o mercado. “Queremos construir e democratizar a nova economia de forma inclusiva e distribuída. A soma de ideias vai construir um mercado muito mais esclarecido e justo”, disse o diretor da Abcripto.

Entidades querem definir regras para o setor

A ausência de regulação tornou-se a principal característica do bitcoin e de outras criptomoedas. Como não são emitidas por nenhum governo, os bancos centrais e outros órgãos de fiscalização como a CVM (Comissão de Valores Mobiliários), em tese, não têm poder para controlar as transações com moedas virtuais.

O que deveria ser uma vantagem das criptomoedas, acabou virando um problema. Os riscos de manipulação de preços e de uso para lavagem de dinheiro se tornaram uma preocupação constante para as empresas que atuam de forma séria no mercado.

Para piorar a situação, o mercado sofreu com a proliferação de “clubes” e outras entidades que prometiam ganho fácil, mas na verdade eram uma versão repaginada do velho golpe da pirâmide financeira.

Por isso, tanto a ABCB como a Abcripto estão preocupadas em definir regras para o setor de criptomoedas, de formar a organizar e selecionar os participantes desse mercado, além de dar maior segurança para quem negocia criptomoedas ou utiliza a tecnologia blockchain.

Abcripto aposta na autorregulação

A Abcripto acredita que os próprios participantes do mercado podem definir regras para o bom funcionamento do setor. “Nossa proposta é criar um ambiente mais seguro, com autorregulação e com certificação profissional”, afirmou Luiz Calado, presidente da Abcripto.

A entidade também tem se aproximado do Banco Central e da CVM para entender quais são as demandas dos órgãos reguladores. Tanto o Banco Central como a CVM emitiram comunicados a respeito de criptomoedas no ano passado, recomendando cautela aos investidores.

“Precisamos entender o outro lado e construir propostas juntos. Organizamos um grupo de trabalho que vai sugerir à CVM uma legislação para o setor", disse Amorim. “O mais importante é que a regulação do setor não freie a inovação”, declarou Luiz Calado.

ABCB busca apoio no Congresso

A ABCB tem promovido intensa campanha nos corredores do Congresso Nacional para defender o interesse de seus associados e propor uma regulação para o setor de criptomoedas.

A entidade estimulou a formação da Frente Parlamentar Mista de Blockchain e Ativos Digitais, que já conta com apoio dos deputados Antonio Goulart (PSD-SP), atual presidente da Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara, Daniel Coelho (PPS-PE) e Mariana Carvalho (PSDB-RO).

“Caberá à frente parlamentar traduzir e equilibrar os anseios da sociedade sobre criptomoedas e as exigências de regulação”, disse Furlan.

Saia justa com os bancos

As corretoras de criptomoedas têm travado uma guerra com os bancos nos últimos meses. Com medo de que as corretoras se tornem um caminho fácil para a lavagem de dinheiro no país, algumas instituições financeiras têm optado por encerrar unilateralmente as contas correntes das corretoras, o que pode inviabilizar o negócio.

A ABCB entrou com pedido no Cade para proibir os bancos de fecharem ou se negarem a abrir contas para instituições ligadas ao mercado de criptomoedas, alegando cerceamento da concorrência.

Caso o Cade não aceite o pedido, o setor pode enfrentar mais dificuldades “Vamos depender de decisões isoladas na Justiça, o que não é bom, já que os juízes não são especialistas em concorrência e muito menos em economia digital”, declarou Furlan.

A Abcripto quer evitar um desgaste ainda maior com os bancos. A entidade vai procurar a Febraban (Federação Brasileira de Bancos) para mostrar que as corretoras e outras empresas participantes do mercado de criptomoedas já adotam cuidados para evitar a lavagem de dinheiro e outros riscos financeiros.

“Temos um sistema de compliance [conformidade legal] semelhante ao que os bancos fazem. Com a autorregulação, vamos padronizar regras de custódia de recursos e de combate à lavagem de dinheiro para todo o setor”, disse Calado.

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Errata: este conteúdo foi atualizado
O nome da empresa Braziliex foi grafado indevidamente com S. O correto é com Z.