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Aposentar aos 65, contribuir 40 anos: especialistas dizem se é bom ou ruim

Thâmara Kaoru

Do UOL, em São Paulo

12/02/2019 04h00

Resumo da notícia

  • Proposta de reforma da Previdência prevê mais tempo para se aposentar
  • Idade seria igual para homens e mulheres, mas elas têm dupla jornada. Como resolver?
  • Seria difícil alcançar 40 anos de contribuição para quem está na transição
  • Aumento de 5 anos na contribuição mínima parece pouco, mas muitos não conseguiriam

A proposta de reforma da Previdência vazada na semana passada traz mudanças na idade mínima para aposentadorias, aumenta o tempo mínimo de contribuição, cria um sistema de capitalização e propõe mais de uma regra de transição para os segurados que ainda estão no mercado de trabalho. Mas o que especialistas acham da proposta? Alguns consideram negativa, outros entendem que é necessária para o sistema de aposentadoria ser sustentável.

O UOL conversou com  analistas de diferentes visões para mostrar o que consideram positivo e negativo: a presidente do IBDP (Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário), Adriane Bramante, com o presidente do Ieprev (Instituto de Estudos Previdenciários), Roberto de Carvalho Santos, com o especialista em direito previdenciário e consultor jurídico da Cobap (confederação brasileira de aposentados) Guilherme Portanova e com o professor da FGV Ebape (Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas) Kaizô Beltrão para comentar pontos da proposta. Leia mais abaixo.

Idade igual para homens e mulheres

A proposta prevê uma idade mínima igual para homens e mulheres de 65 anos. Hoje, na aposentadoria por idade, as mulheres se aposentam com 60 anos e os homens com 65 anos.

Positivo: Para Beltrão, a Previdência não deveria ser responsável por compensar as diferenças. "Sinalizar que homens e mulheres devem ter as mesmas regras é positivo. Há um discurso de que a aposentadoria diferenciada seria para compensar o mercado de trabalho, em que mulheres ganham menos e têm dupla jornada. Mas não há por que diferenciar na aposentadoria. Deve haver compensação no mercado de trabalho."

Negativo: Para Santos, a responsabilidade é da Previdência. "Muitos dizem que a Previdência não deveria compensar as mulheres por elas terem uma jornada maior ou por ganharem menos e que isso é uma questão de políticas públicas que deveria ser resolvida em outros cenários. Eu discordo. Eu acho que somos um sistema de previdência social e que esse tipo de diferenciação precisa persistir."

Regra de transição

Para os trabalhadores que já estão no mercado de trabalho, uma das regras de transição é parecida com a fórmula 86/96 em vigor. A diferença é que a partir de 2020, essa pontuação sobe um ponto a cada ano até atingir o limite de 105.

Positivo: Para Beltrão, a reforma precisa dar chance de planejamento para quem está próximo da aposentadoria. "Se você está em uma regra de transição que você nunca consegue alcançar, não faz sentido. Mas se aumentar um pouco a cada ano, é um algo que consigo. Só vai levar mais tempo, mas consigo chegar lá."

Negativo: Na prática, quando atingir esse limite, será preciso ter 65 anos de idade e 40 anos de contribuição. "Imagina no Brasil de hoje, em que a reforma trabalhista legalizou o trabalho intermitente. Todo mundo indo para o mercado informal. Quem é que vai conseguir pagar 40 anos de contribuição?", afirmou Portanova.

Aumento do tempo de contribuição

A proposta prevê que o tempo mínimo de contribuição seja de 20 anos para quem entrar no mercado de trabalho após a publicação das mudanças. Hoje, na aposentadoria por idade, o tempo mínimo de pagamentos ao INSS é de 15 anos.

Positivo: Para Beltrão, o problema não são os 20 anos mínimos de contribuição, mas a falta de formalidade no mercado de trabalho, que dificulta conseguir chegar ao tempo necessário.

Negativo: "Na CPI da Previdência no Senado mostramos um estudo em que se a carência de 20 anos fosse aplicada nas aposentadorias por idade hoje, de cada dez, oito seriam cortadas. O governo não diz que vai aplicar em quem está aposentado, mas isso mostra que de cada dez que poderiam estar se aposentando, oito não vão conseguir. Podem pensar 'só vai aumentar cinco anos, isso é pouco', mas não é", afirmou Portanova.

Sistema de capitalização

Haveria um sistema de capitalização para aposentadorias. Cada trabalhador contribui para sua aposentadoria em uma conta individual. No sistema atual de repartição, os trabalhadores da ativa bancam a aposentadoria dos mais velhos. A gestão dessas contas seria feita por entidades públicas e privadas habilitadas pelo governo.

Positivo: Para Beltrão, é bom que as pessoas possam optar por outro tipo de sistema. Ele afirma, porém, que será preciso fiscalizar administradores para que não vendam a ideia de que os fundos vão render mais do que de fato renderão. "Acho que qualquer propaganda vai ter que ter uma regulação para que pessoas com menos educação econômica não sejam fisgadas indevidamente."

Em dúvida: Para Adriane, falta explicar melhor como seria esse sistema. "Não há um estudo de qual será o custo de um sistema de capitalização. No momento em que se faz a capitalização, você desvia contribuição que iria para um fundo único, então, como você vai pagar o inativo? Como vai ser essa transição? Qual vai ser o custo disso? Não está claro na proposta."

Aposentadoria para militares

O texto preliminar propõe equiparar as regras dos políciais às das Forças Armadas. Especialistas concordam que militares deveriam estar na reforma.

Positivo: "É uma proposta mais dura do que a proposta que está parada na Câmara. Por outro lado, é mais abrangente já que inclui a questão dos militares, o que eu acho correto. Se for fazer reforma, tem que abranger todos os regimes", disse Santos.

"Em termos de incluir todo mundo na proposta, achei importante, é o caminho mesmo", afirmou Adriane.

Lei complementar para definir regras

Em diversos pontos da proposta fica estabelecido que uma lei complementar irá definir melhor as regras. É o caso da idade mínima para aposentadorias, sistema de capitalização, contribuição do trabalhador rural e limites máximos de contribuição ao INSS, por exemplo. 

Negativo: Para Adriane, essa estratégia pode fazer com que a PEC passe mais facilmente no Congresso. "A PEC joga muita coisa para ser definida depois. Ele desconstitucionaliza muitos temas e coloca em lei complementar, que é mais fácil de ser aprovada."

"O grande mote dessa proposta é a desconstitucionalização das regras previdenciárias. Estaria tudo delegado a uma lei complementar. A partir do momento que você insere isso em lei complementar, fica muito mais fácil alterar no futuro. A gente percebe que é uma reforma feita visando outras reformas", diz Santos.

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