Nordeste enfrenta crise maior, e PIB local cresce metade da média do país
A economia do Nordeste passa por uma crise pior que a do Brasil. O Produto Interno Bruto (PIB) da região cresceu no ano passado praticamente a metade da média do Brasil. Em 2018, o PIB nordestino cresceu apenas 0,6%, enquanto o do Brasil subiu 1,1%. Em 2017, a região também ficou abaixo: 0,8% (no país todo, também foi de 1,1%). Especialistas esperam que isso tenha uma pequena melhora neste ano, mas uma evolução maior só a partir de 2023.
A crise afastou investimentos, que ficaram concentrados no centro-sul. "O comportamento do PIB da região se assemelha ao do que ocorreu na crise econômica de 2009, sob reflexos da crise financeira mundial. Os principais atores econômicos buscaram maior segurança para seus investimentos, privilegiando mercados consolidados, como os do centro-sul do país", disse Guilherme Muchale, gerente de Economia e Estratégia do Sistema Fiec (Federação das Indústrias do Estado do Ceará).
Aeroportos e energia do vento podem ajudar região
Analistas dizem que o Nordeste deve retomar neste ano pequena parte do dinamismo do início da década e crescer 1,9%, patamar próximo à expansão de 2% estimada para o PIB do país. As projeções são da Tendências Consultoria.
Para que essa recuperação ocorra, no entanto, a concretização de investimentos em infraestrutura (aeroportos, energia eólica, saneamento básico e ferrovias, entre outros) será determinante, segundo Camila Saito, economista da área de Análise Setorial Tendências.
Alguns fatores que fizeram o Nordeste perder fôlego em 2017 e 2018:
- Exposição reduzida da economia regional ao mercado externo
- Cancelamento ou adiamento de grandes projetos de investimentos previstos para entrarem em operação no curto prazo
- Forte dependência de programas de transferência de renda (Bolsa Família e aposentadoria)
Nordeste depende de dinheiro do setor público
Para a economista da Tendências, a retomada da atividade econômica no Nordeste vem sendo mais desfavorável do que na média no Brasil por conta do peso relativamente modesto de setores mais sensíveis ao ciclo econômico. Entre eles, o automotivo, o de máquinas e equipamentos e o de materiais de construção.
"O Nordeste ainda conta com um peso significativo do setor público federal na massa de renda, o que faz com que sofra mais do que o restante do país com restrições fiscais impostas por Brasília", disse Camila.
Massa de renda é a transferência de renda que inclui aposentadorias e benefícios assistenciais. São recursos importantes para sustentar o consumo das famílias em tempos de crise, mas mostram o grau de dependência em relação ao dinheiro bancado pelo governo.
Menos obras de infraestrutura na região
Camila afirmou ainda que, entre 2015 e 2016, período em que houve forte ressaca do programa desenvolvimentista dos governos do PT, com cancelamento de investimentos em estaleiros, refinarias e ferrovias, a economia do Nordeste sofreu consideravelmente. Ainda somou-se a isso uma quebra na safra agrícola.
"A crise fiscal do país tem dificultado investimentos na região, sobretudo pela maior participação dos estados mais ricos da federação nas concessões públicas realizadas, elevando a disparidade entre as regiões no que se refere à qualidade da infraestrutura", disse Muchale.
Segundo ele, isso ocorre também em outras áreas, como o de capital humano, em que o Nordeste conta com menos de 19% dos cursos de graduação e pós-graduação em áreas estratégicas, como tecnologia, ciências e engenharia, mesmo com a região respondendo por mais de 27% da população brasileira.
Evolução deve vir a partir de 2023
Camila, da Tendência, avalia que a partir de 2023 o Nordeste deve mostrar melhor evolução por conta de investimentos importantes previstos para a região, como exploração de gás natural no Maranhão e petróleo em Sergipe. Não citou números.
Ela disse também que melhorias importantes em capital humano (escolaridade e qualidade do ensino) serão fundamentais para diminuir o "gap" (algo como ruptura na continuidade) do desenvolvimento da região com o Brasil. Para ela, a redução desse "gap" ainda não foi possível em razão de:
- Baixos ganhos de produtividade, justificado pelo nível de qualificação da mão de obra ainda precário
- Disponibilidade e qualidade de infraestruturas ainda deficitárias
- Ambiente de negócios (segurança pública, educação, saúde e eficiência da máquina pública) ainda deficientes
"Nos últimos anos, se observaram avanços relevantes nesses três condicionantes fundamentais para o crescimento de longo prazo na região, mas que ficaram obscurecidos pelos efeitos da crise econômica", declarou Camila.
Informalidade: problema ainda persistente
A informalidade -presente nos estados mais pobres, uma vez que a população menos escolarizada e setores menos produtivos impedem uma maior formalização da mão de obra- é outro problema no Nordeste, que gera não só o aumento de taxas de inadimplência como retração no consumo.
De acordo um levantamento da Tendências, coordenado pelo economista Thiago Xavier, o Nordeste tinha no ano passado 11,37 milhões de trabalhadores na informalidade, de um total de 21,3 milhões de ocupados, o que corresponde a 53,4% do total. No caso do Brasil, nesse mesmo ano eram 37,45 milhões de trabalhadores na informalidade, de um total de 91,8 milhões de ocupados (40,8%).
Dados econômicos da região em 2018
- PIB: R$ 910,7 bilhões
- PIB per capita: R$ 16.043 (R$ 16.258 projetado para 2019)
- Participação no PIB nacional: 14,3% em 2016 (último dado disponível)
- Rendimento médio mensal real dos trabalhadores: R$ 1.546 (pessoas ocupadas de 14 anos ou mais)
- Taxa de desemprego: 14,9%
- Índice de Gini (grau de concentração de renda)*: 0,559 em 2017 (último dado disponível)
*Aponta a diferença entre os rendimentos dos mais pobres e dos mais ricos. Ou seja, quanto maior o índice, maior a desigualdade social
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