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Investiu R$ 26 mil com promessa de ganhar 15% ao mês; dinheiro está preso

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Imagem: Reprodução

Lucas Gabriel Marins

Colaboração para o UOL, em Curitiba

18/12/2019 04h00

Um negócio seguro, confiável e "de Deus". Assim representantes apresentavam a GenBit, corretora de criptomoedas com sede em Campinas (SP), que oferecia pacotes de investimentos prometendo lucro de até 15% ao mês. As informações foram passadas ao UOL por investidores, entre eles duas mulheres que colocaram no negócio R$ 26.250 cada e, agora, não conseguem reaver o dinheiro. Elas pediram para não serem identificadas.

Eles gritavam, se vangloriavam e falavam muito de Deus. Parecia uma seita religiosa.
Investidora de São Paulo

Ela participou de um megaevento da empresa, em São Paulo. Entrou no negócio com R$ 26.250 e convenceu a irmã a fazer o mesmo. Isso aconteceu em setembro, sete meses depois de a CVM (Comissão de Valores Mobiliários), reguladora do mercado financeiro, ter emitido um alerta contra a atuação da empresa.

Assim como ela, outros investidores estão com os recursos retidos pela GenBit, sem conseguir sacar desde setembro. A empresa citou diversos motivos para justificar isso: o sistema bancário que não aceitava as movimentações, problema na própria plataforma etc. Em novembro, lançou uma criptomoeda própria, chamada Treep Token (TPK), com a qual diz que irá pagar seus investidores.

É como se seu devesse para você um dinheiro, mas, em vez de te pagar em reais, dólar ou mesmo bitcoins, te pagasse com estalecas [moeda fictícia usada por participantes do Big Brother Brasil].
Investidora de Maringá (PR)

Ela também tem R$ 26.250 presos na plataforma.

A empresa tem 45 mil clientes, segundo informativo ao qual o UOL teve acesso, mas não tem autorização da CVM para oferecer investimento coletivo. Desde setembro, quando começou a atrasar os pagamentos aos clientes, passou a ser alvo de uma enxurrada de processos. Só na Justiça de São Paulo, até 12 de dezembro, havia 150 ações. Somadas, passam de R$ 10 milhões.

O que a empresa diz

A GenBit, que é controlada pela holding Tree Part e Gensa Serviços Digitais, disse que os atrasos são decorrentes da "maxidesvalorização dos ativos digitais" e das "crescentes orientações da CVM".

Afirmou, ainda, que os saques estão sendo regularizados gradativamente e que o fluxo será normalizado totalmente nos próximos 90 dias.

Sobre as ações, informou que não comenta questões que estão na Justiça.

Sobre a moeda própria TPK, a empresa informou que, ao oferecê-la aos clientes, está cumprindo o que havia prometido, que era "investimento em ativos digitais".

Investigada por CVM, MP e Polícia Civil

A CVM abriu, no início do ano, processo para investigar o grupo. Em março, o órgão proibiu o conglomerado de fazer oferta pública de investimentos. Na época, os rendimentos elevados eram prometidos por meio de outra empresa da holding, chamada Zero10 Club, que foi fechada em julho.

Segundo alguns investidores, a Genbit é, na verdade, a Zero10 Club. A empresa não confirma.

Diversas denúncias sobre o grupo também chegaram ao Ministério Público do Estado de São Paulo, que incluiu a Genbit em um grande inquérito, aberto no final de 2017, para investigar empresas suspeitas de pirâmide financeira. O órgão não revela detalhes sobre a apuração.

A Polícia Civil de Campinas, segundo apurou a reportagem, investiga o negócio desde julho.

A GenBit afirmou ao UOL que está lidando com "muita naturalidade" com as investigações, "pois tudo que é novo gera certas incompreensões", e disse que respeita todos os órgãos e instituições do país e que colabora com tudo o que lhe é solicitado.

Como funcionava o negócio

Além de atuar como plataforma para negociação de criptomoedas, a empresa vende pacotes de investimentos com promessa de rendimentos mensais de até 15%, conforme depoimentos de clientes. Esses ganhos seriam obtidos por meio da arbitragem de criptomoedas, ou seja, compra e venda de bens em diferentes corretoras para lucrar com a diferença de preços.

O contrato é de 36 meses. Os valores dos pacotes variam de US$ 100 a US$ 75 mil. A empresa usava um valor fixo de câmbio, em que o dólar sempre valia R$ 3,50. Ou seja: se um investidor adquirisse o pacote de US$ 7.500, por exemplo, pagaria R$ 26.250, com a promessa de receber quase R$ 4.000 por mês ao longo de três anos, em bitcoins.

A empresa afirmou que não oferece investimentos coletivos desde o alerta da CVM. Entretanto, o próprio órgão regulador do mercado de capitais divulgou parecer, em novembro, dizendo que a empresa continuava atuando sem autorização.

"Muito embora os proponentes afirmem o encerramento da atividade ilícita, tendo inclusive publicado informação em seu site oficial com aviso aos investidores, fato é que a empresa, mesmo após o alerta da CVM, continuou a praticar atos de distribuição pública. Há ainda registro de denúncia de investidor informando ter recebido proposta de contrato de investimento em cotas empresariais (datada de 17 de junho de 2019)", diz trecho do parecer da CVM.

Rentabilidade alta é arapuca, diz especialista

Para Josilmar Cordenonssi Cia, professor de Finanças da Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo, nenhuma empresa séria pode prometer rentabilidades fixas em um mercado tão instável como o de criptomoedas.

Promessas de rentabilidades muita altas, como essas de 15% ao mês ou até mais, que aparecem no mercado, são arapucas para pegar os desavisados. Minha dica é não investir em nada parecido, pois com certeza é uma cilada.
Josilmar Cordenonssi Cia, professor de Finanças do Mackenzie