Imposto vai encarecer comércio eletrônico no Rio na hora mais necessária
Resumo da notícia
- Assembleia Legislativa cria lei que responsabiliza fintechs e sites de comércio eletrônico pelo pagamento de ICMS devido por clientes
- Medida pode emperrar e-commerce bem no momento em que internet é opção para quem não pode vender nem comprar no comércio físico
- Advogados dizem que a medida vai ser questionada porque é inconstitucional
A Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro aprovou na noite da última terça-feira o Projeto de Lei 2023/2020 que, na prática, passa a responsabilizar as fintechs e sites de comércio eletrônico pelo pagamento de ICMS devido por seus clientes em transações pela internet. O texto ainda abre a possibilidade de novas obrigações acessórias relacionadas à emissão de documentos fiscais resultantes destas operações.
Ou seja, se o lojista deixar de pagar o tributo de uma venda, ou não preencher corretamente toda a papelada para o governo, as empresas financeiras e sites de comércio eletrônico por meio dos quais a operação foi realizada é que terão que arcar com as responsabilidades de pagamento e até de multas.
O projeto ainda será submetido à sanção do governador, autor do PL, mas já preocupa os comerciantes. Segundo empresas e entidades do setor ouvidas pelo UOL, essa medida pode simplesmente inviabilizar o comércio eletrônico no Rio de Janeiro, justo no momento em que esse canal virou salvação - seja para o lojista, que não consegue vender porque teve que fechar suas lojas físicas; seja para o consumidor, que precisa da Internet para adquirir produtos porque está em quarentena.
Prova disso é o crescimento das vendas online apenas entre os dias 25 de fevereiro e 20 de março. Segundo dados da Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (ABComm), em parceria com o Movimento Compre & Confie, as vendas na categoria saúde, subiram 111%. Na área de beleza, perfumaria e higiene pessoal, o incremento foi de 83%, enquanto em supermercados, o e-commerce apresenta avanço de 80% nas compras.
E esse crescimento se dá sobre uma tendência que já era forte antes mesmo da pandemia do novo coronavírus. Em 2019, o comércio eletrônico cresceu 13,5% em comparação a 2018, de acordo com o Mastercard SpendingPulse.
"Essa lei, se sancionada, cria uma série de dificuldades operacionais. É uma lei que vai apenas aumentar o contencioso", disse uma pessoa que responde pela área jurídica de uma grande empresa que atua no segmento do comércio eletrônico.
Lei é inconstitucional, dizem advogados
Para especialistas, o projeto de lei aprovado no Rio de Janeiro é inconstitucional.
O sócio da Velloza Advogados, Fabrício Parzanese, disse que a lógica por trás dessa lei é a busca dos estados e municípios por formas mais eficientes de arrecadação. "A lógica desse tipo de medida é concentrar em determinados polos a responsabilidade para declarar e recolher imposto para facilitar a arrecadação", afirma.
O problema, diz Parzanese, é que há limites legais para determinar qual agente na cadeia de negócios pode ser incluído com o contribuinte ou responsável pelos tributos. "Os governos tentam jogar no colo do setor financeiro o papel do fiscalizador. Mas o meio de pagamento não deve ser entendido como parte da venda", disse. Segundo ele, compete ao Congresso determinar esse tipo de legislação do ICMS.
O sócio da área tributária do escritório Pinheiro Neto-Advogados, Luiz Roberto Peroba, vai na mesma linha. Para ele, o texto aprovado no Rio não tem respaldo no artigo 146 da Constituição, inciso 3º, que estabelece as normas gerais em matéria de legislação tributária, incluindo a definição de tributos e de suas espécies, fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes.
"Uma mudança dessas teria que passar pelo Congresso Nacional. Cada estado não pode estipular a própria regra", afirmou. Segundo Peroba, por esse motivo, a lei pode e deve gerar contenciosos, ou seja, discussão na Justiça.
Lei vai no sentido contrário ao desejo do governo federal
Executivos do comércio eletrônico ouvidos pelo UOL apontam que a medida também vai na direção oposta ao desejo manifestado por integrantes da equipe econômica do governo federal, que já deixaram expressa a intenção de fazer das fintechs agentes financeiros mais atuantes.
Por exemplo, o Banco Central anunciou regra que permite a uma parte das fintechs ser agentes repassadores de recursos do BNDES - o que antes era exclusivo dos bancos.
E o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou que as empresas de meios de pagamento, as chamadas maquininhas, serão incluídas entre os agentes financeiros que poderão oferecer a seus clientes linhas de crédito do governo criadas para financiar o pagamento de salários de funcionários na atual crise.
Posição do governo do Rio
Por nota, a secretaria da Fazenda do governo estadual do Rio de Janeiro informou que a lei vai reduzir em até 30% a burocracia em ICMS e redução de sonegação fiscal. Segundo a Fazenda do Rio, a fiscalização e arrecadação não são delegadas.
"A Sefaz-RJ fiscaliza e verifica que determinado contribuinte de forma recorrente não emite nota, ou seja, é um potencial sonegador. A Fazenda então oferece a oportunidade de a empresa notificada se regularizar e, caso a mesma não se regularize, informa à organização online que se trata de uma empresa irregular. A partir daí, a empresa online passa as ser responsável pelas operações futuras e precisa somente conferir a emissão de nota fiscal dos contribuintes participantes, assim como já ocorre com tabelião (no caso de imóveis transferidos), transportadores, leiloeiros e tantos outros", afirma o governo do Rio.
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