Clientes da Light são acusados de "gato" e recebem cobrança de R$ 8.300
Moradores do Rio têm reclamado que a Light, concessionária de energia, tem distribuído cobranças aos consumidores acusando-os de furto de energia elétrica, conhecido como "gato". As cobranças passam de R$ 8.000, de acordo com os clientes.
O caso foi denunciado nas redes sociais por uma bancária, cujos sogros foram surpreendidos com uma carta de processo administrativo e o aviso de cobrança de R$ 8.300 devido a irregularidades no relógio.
Procurada pelo UOL, a Light afirmou que não multa seus clientes. O que faz, ao constatar irregularidades, por meio de vistorias feitas por equipes técnicas, é calcular as perdas e apresentar o valor devido ao cliente conforme orienta a resolução 414 da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica). A empresa não fez comentários especificamente sobre as cobranças de mais de R$ 8.000.
Rosana De Biase contou ao UOL que seus sogros, um casal de idosos moradores do bairro do Maracanã, na zona norte do Rio, tiveram o relógio da casa trocado pela empresa, há dois anos. Desde então, passaram a receber visitas frequentes de técnicos da Light, que alegavam pouco gasto de energia pelo casal.
"O consumo deles já era baixo e, com a troca do relógio, caiu mais ainda. Na última visita, dia 10 de outubro, vistoriaram novamente o medidor e pediram que a minha sogra assinasse um relatório de visita. Alguns dias depois, veio a surpresa, uma carta cobrando o valor de R$ 8.308,91, pelo período de maio até outubro", disse Rosana.
De acordo com ela, os funcionários da empresa alegaram que os aposentados, que recebem um salário mínimo cada um, tinham em casa duas geladeiras expositoras, normalmente usadas em bar, além de outros eletrodomésticos.
"Eles não entraram na residência em momento algum. Somente a constrangeram dizendo que é muito estranho gastar tão pouco e perguntando se ela não tinha um secador de cabelo, uma chapinha... São pessoas simples, que possuem uma televisão, dois ventiladores de teto, um chuveiro elétrico e, há um ano, trocaram a geladeira super antiga por uma mais moderna e econômica", afirmou.
De acordo com a bancária, a idosa não tem dormido e tem se alimentado mal, preocupada com a dívida. "Ela acha que vai ter que pegar um empréstimo para pagar isso", contou a nora.
Na carta recebida, a orientação em caso de discordância é que o cliente procure uma agência da Light. "O INSS libera o idoso de ir até o banco realizar a prova de vida para evitar aglomeração, mas a Light [não libera]", disse Rosana.
História se repete com outros clientes
Caso semelhante ocorreu com a aposentada Katia Cristina Aquino, 55, moradora de Campo Grande, na zona oeste da cidade. Ela contou ao UOL que os funcionários da Light levaram o relógio da casa dela e posteriormente comunicaram-na sobre fraude no aparelho. A multa recebida foi de R$ 8.000. O caso ocorreu em dezembro do ano passado.
"Procurei um advogado. Ele me orientou a continuar pagando os boletos de consumo mensal e a não pagar a multa. A Light enviava todo mês uma fatura extra com o valor da multa parcelado em 60 vezes, alegando que o relógio não havia computado o consumo. Quando completei três meses sem pagar o valor da multa, eles cortaram minha luz. Fiquei dez dias sem energia e precisamos entrar na Justiça para que a luz fosse religada. Somente com o processo na Justiça consegui cancelar a cobrança", disse a aposentada, que pagava, na época, R$ 300 de conta de energia.
De acordo com ela, o processo foi julgado recentemente, e a Light foi condenada a pagar indenização por danos morais. "No período em que fiquei sem luz, precisei guardar as minhas coisas de geladeira na casa da vizinha. Foi um transtorno", disse a moradora. acusada de "gato", na ocasião.
Katia mora em Campo Grande há 12 anos e foi a primeira vez que teve problemas com a concessionária. Ela informou que cerca de dez vizinhos do bairro enfrentaram os mesmos problemas.
Assim como no caso dos idosos e da aposentada, vários clientes reclamam da companhia de energia e procuram ajuda de advogados. Uma página "Vítimas da Light" foi criada no Facebook, na qual os consumidores compartilham suas experiências.
Light diz que cliente pode contestar cobrança
A Light afirmou que faz cobranças ao constatar irregularidades e que os clientes que desejarem contestá-las devem registrar reclamações "pelo call center, nas agências físicas ou nas redes sociais da concessionária. Todas as solicitações são analisadas pela Light em até 15 dias úteis, prazo estabelecido pela Aneel. O cliente pode ainda recorrer à Ouvidoria da Light, em segunda instância, caso discorde do resultado da análise feita em primeira instância".
A Light disse ainda que "a Aneel permitiu que as concessionárias de todo o Brasil voltem a efetuar cortes de energia por inadimplência desde o início de agosto".
Especialista vê irregularidades da companhia
Para o professor da Faculdade de Direito da Uerj (Universidade Estadual do Rio de Janeiro) Carlos José de Souza Guimarães, a Light pode estar cometendo uma generalização indevida contra os consumidores que não possuem uma instalação padronizada e que atenda as expectativas da empresa.
"Grande parte das instalações que a gente tem no Rio não é padronizada, e isso não é qualquer irregularidade, que se traduz em furto. A Light, de certo modo, interpreta problemas como instalações suspeitas. Mas, para o consumidor ser acusado de furto, é necessário que a energia seja diretamente desviada. Tem que haver intenção de prejudicar a companhia".
O professor destaca ainda que a perícia da Light feita nos relógios configura uma situação irregular.
"O relógio pode dar defeito, a qualidade do relógio pode ser duvidosa. Se o aparelho não marcou direito, os consumidores têm que arcar com isso? O consumidor não pode ser punido, e a Light é parte interessada no processo, não pode haver uma perícia unilateral".
O especialista em direito do consumidor diz ainda que o corte de energia é a última coisa que deve ser feita pela empresa.
"Cortar o fornecimento de energia é uma medida radical. O código de Defesa do Consumidor diz que o fornecimento de energia é serviço essencial, como água, por exemplo. Não pode cortar. Somente se houver irregularidades, como risco de incêndio. Para cortar em caso de inadimplência, a empresa tem que entrar em contato três vezes para o consumidor regularizar a situação. Não pode cortar sem observância das regras. Neste caso, o consumidor tem direito a dano moral. Não podemos sacrificar a dignidade humana".
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.