Lei que instituiu autonomia do Banco Central é inconstitucional, diz PGR
O procurador-geral da República, Augusto Aras, enviou ao STF (Supremo Tribunal Federal) um parecer favorável à parte de uma ação ajuizada pelo PSOL e pelo PT que questiona a lei complementar que instituiu a autonomia do Banco Central (LC 179/2021). Segundo Aras, o projeto que originou a lei tem um "vício formal" na tramitação no Congresso Nacional e, por isso, é inconstitucional.
No ofício, o PGR lembra que o texto originário da lei — PLP 19/2019 — foi proposto por um senador e, após sua aprovação, encaminhado à Câmara dos Deputados. Lá, foi apensado a um outro projeto, o PLP 112/2019, de iniciativa do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Após análise das duas matérias pelos deputados, a primeira foi aprovada e encaminhada à sanção presidencial, enquanto a proposta por Bolsonaro foi rejeitada.
A inconstitucionalidade, diz Aras, não está na combinação entre os dois projetos, mas sim no fato de o Senado nunca ter discutido o texto apresentado pelo presidente, o PLP 112. "Toda a tramitação da matéria no Senado Federal deu-se unicamente nos autos do PLP 19/2019, de autoria parlamentar", argumenta.
De acordo com o procurador-geral, a votação do projeto de Bolsonaro não foi concluída, uma vez que não passou pelo Senado — e só a discussão do texto anterior, o PLP 19, não é suficiente para validar a apreciação da matéria. "Se fosse assim, a tramitação do projeto de iniciativa do presidente ter-se-ia iniciado no Senado, em flagrante contrariedade ao artigo 64 da Constituição", comenta.
Aras também discorda do argumento de que o Senado "adaptou" seu projeto àquele de Bolsonaro, que tramitava na Câmara. Ele destaca que, embora os representantes do Executivo tenham se reunido com senadores e sugestões dadas tenham sido adotadas, "o projeto em votação no Senado Federal era aquele de autoria parlamentar".
Competência é do presidente
Em seu parecer, o PGR destaca que o PLP 112 é de iniciativa privativa do presidente porque trata de agentes públicos da União e de requisitos para provimento dos cargos, hipóteses de exoneração, vedações no exercício da função pública. Segundo Aras, Bolsonaro e os diretores do BC são servidores públicos, ainda que não sejam titulares de cargo efetivo.
Quanto à organização administrativa, o procurador-geral lembra que a lei dispõe sobre os objetivos fundamentais da autarquia — ou seja, o propósito de sua existência —, remodela seus órgãos diretivos, transforma a natureza do cargo do dirigente máximo e posiciona o BC ao lado dos ministérios como órgão setorial da administração pública federal.
Tudo isso, diz Aras, evidencia que o caso atende às hipóteses da Constituição para a competência privativa do presidente.
"Embora editado sob a forma de lei complementar, dada a reserva constitucional dessa espécie legislativa para regular o sistema financeiro nacional, o diploma questionado disciplina, pelo que revela seu conteúdo, matérias reservadas à iniciativa privativa do presidente da República para deflagrar o pertinente processo legislativo", avalia.
Sanção com afago a Guedes
O projeto de autonomia do BC foi sancionado por Bolsonaro em 24 de fevereiro, duas semanas depois de ser aprovado pelo Congresso. À época, ele aproveitou a solenidade — que também marcou a posse de João Roma e Onyx Lorenzoni como novos ministros da Cidadania e da Secretaria-Geral — para elogiar o ministro Paulo Guedes (Economia), a quem se referiu como "âncora do governo".
"A gente diz que não sabe [de economia], não entende, mas acho que pelo menos as quatro operações a gente faz. Assim eu sou perto do Paulo Guedes. Não ouso falar em integral ou qualquer outra equação matemática, mas o Paulo Guedes é uma âncora para nosso governo. Aos poucos, nós vamos nos adequando, nós precisamos um do outro", disse Bolsonaro.
Segundo Bolsonaro, o projeto de autonomia do BC só não foi aprovado antes porque outras pautas mais importantes passaram à frente, além da questão da pandemia de covid-19. Ele afirmou, contudo, que só sancionou a matéria porque confia na capacidade e na honestidade de Roberto Campos Neto, presidente do banco, que participou da cerimônia.
A autonomia do Banco Central veio lá de trás, não foi durante o governo, e só não aprovamos há mais tempo porque outras pautas mais importantes apareceram, bem como a questão do vírus. Nós estamos, juntamente com os irmãos da Câmara e do Senado, vencendo esse obstáculo.
Jair Bolsonaro, em evento no Palácio do Planalto
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