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Empresas se calam sobre ameaças de Bolsonaro

Bolsonaro em cerimônia da Aeronáutica, em janeiro - Alan Santos/PR
Bolsonaro em cerimônia da Aeronáutica, em janeiro Imagem: Alan Santos/PR

Giulia Fontes

Do UOL, em São Paulo

13/05/2021 04h00

Nos últimos meses, declarações e atos do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) trouxeram discussões sobre risco de ruptura institucional. No fim, as declarações foram vistas mais como tentativas de mobilizar seu público radical e foram descartadas na prática.

Alguns exemplos: um projeto, rejeitado, daria poderes adicionais ao presidente. No final de março, a troca simultânea no comando do Exército, da Marinha e da Aeronáutica alimentou a percepção de que o presidente estaria buscando politizar as Forças Militares. Integrantes do governo negaram essa intenção.

De qualquer modo, para avaliar como essas falas presidenciais afetam a economia, o UOL perguntou a 60 empresas, gigantes de vários segmentos, o que seus dirigentes achavam da situação.

Foram incluídos setores como bancos, alimentos, bebidas, carros e comércio (veja a lista completa ao final deste texto). A pergunta exata foi: "O senhor [ou a senhora] vê algum risco de o presidente Jair Bolsonaro tentar dar um golpe militar? E o que acha disso?".

Apenas duas empresas comentaram. O Bradesco respondeu que "entende que a democracia no Brasil é consolidada". A Alpargatas, dona de Havaianas e Osklen, disse: "Somos uma empresa centenária, e nosso foco sempre foi construir um legado sólido nos negócios e atuar com responsabilidade social. Queremos o melhor para o país e acreditamos ser fundamental o respeito à democracia e ao Estado de Direito".

Por que as empresas não querem se posicionar?

Diante das 58 negativas, o UOL buscou especialistas para tentar entender por que as empresas não querem se posicionar sobre o assunto. Segundo os pesquisadores, não há uma resposta simples ou única, já que o setor empresarial não é homogêneo, e reúne interesses e posicionamentos distintos.

Para Vinicius Müller, doutor em história econômica e professor do Insper, a explicação mais intuitiva é relacionada à imagem das empresas.

[A pergunta feita às empresas] não é fácil. É algo muito delicado porque qualquer fala pode ser entendida como sendo uma opinião favorável [ao golpe], mesmo que não esteja fazendo isso diretamente. Isso pode dar a entender que aquele líder [empresarial] está de fato apoiando esse tipo de solução [autoritária] - que no passado já foi entendida por muita gente como sendo uma boa solução.
Vinicius Müller

Ele diz que, durante as ditaduras militar e de Getúlio Vargas, setores do empresariado manifestaram "apoio muito claro" aos regimes autoritários e a "práticas que passaram à história como negativas".

Isso não significa que todos os setores e empresários apoiaram esses governos, mas que existe essa mácula. Essas relações [do passado] ainda servem de parâmetro para entender o comportamento das elites. Isso tudo faz com que o nosso empresariado, conhecedor dessa história, fique muito receoso em assumir qualquer tipo de posicionamento que possa ser vinculado a qualquer um desses episódios.
Vinicius Müller

Possibilidade de golpe não é tida como real

Marco Antonio Rocha, professor do Instituto de Economia da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), acrescenta que a recusa em se posicionar pode estar relacionada a uma percepção de fragilidade do governo Bolsonaro.

O Bolsonaro está passando por uma crise de governabiidade, por uma CPI [a da covid-19]. A possibilidade de golpe, hoje, é muito remota, dado o grau de fragilidade do próprio governo. (...) No final das contas, esse episódio [da troca do comando das Forças] mostrou que o presidente está um tanto isolado nessas tentativas mais autoritárias, ou pelo menos que não tem mais força para ganhar essa queda de braço.
Marco Antonio Rocha

Simpatia ideológica e eleições próximas

De acordo com Rocha, há uma "dimensão mais sutil", que envolve o apoio do empresariado à agenda econômica que é representada pelo governo Bolsonaro, personificada na figura do ministro da Economia, Paulo Guedes.

Existe um movimento meio hesitante de criticar esse governo e colocar em xeque a agenda econômica que ele representa. Isso vai ficar mais claro quanto mais se aproximar a eleição. Aparentemente, nenhum outro candidato que tenha chance em 2022 incorpora a agenda econômica defendida pelo empresariado brasileiro. Boa parte do empresariado fica um tanto refém do próprio governo Bolsonaro.
Marco Antonio Rocha

Possíveis represálias

Para Luiz Peres-Neto, professor de Comunicação e Ética na ESPM, o silêncio pode estar relacionado ao receio de retaliações.

Todos sabem que, no Brasil, as empresas têm uma dependência elevada de qualquer governo, municipal, estadual ou federal. Mais do que retaliação, pode haver um receio de que haja algum tipo de vingança [caso a empresa se posicione].
Luiz Peres-Neto

Planalto não comenta

O UOL entrou em contato com a Secretaria de Comunicação do governo sobre comentários de haver risco de golpe de estado, mas não houve resposta até a publicação deste texto.

Em abril, o presidente Jair Bolsonaro havia afirmado que vai jogar "dentro das quatro linhas da Constituição". "A nossa democracia e a nossa liberdade não têm preço", afirmou.

O vice-presidente Hamilton Mourão disse que é "difícil" que as Forças Armadas sejam acionadas contra decretos de estados e municípios. Na semana passada, o ministro da Defesa, Walter Braga Netto, afirmou que não há risco de haver uma politização do Exército, da Marinha e da Aeronáutica no Brasil.

Veja a seguir as empresas que foram consultadas e como responderam.