Quem são e como atuam parlamentares que defendem o garimpo e a mineração
Discreta, a Frente Parlamentar Mista da Mineração comanda as discussões sobre mudanças nas leis que tratam da mineração no Brasil.
Lançada em junho de 2019, é composta hoje por cerca de 240 deputados e senadores. É esse grupo que tem atuado em Brasília e ao redor do país para favorecer os interesses sobretudo do garimpo e da média mineração, empresas que faturam até R$ 100 milhões por ano.
Para presidi-la, foi escolhido Ricardo Izar (PP-SP), deputado federal desde 2011 e que já passou por quatro partidos na sua trajetória política (PP, PTB, PV e PSD).
A composição heterogênea da frente inclui figuras de partidos diversos e diferentes perfis, de apoiadores de Jair Bolsonaro (sem partido) até deputados da oposição.
Os nomes incluem ruralistas como Neri Geller (PP-MT), Alceu Moreira (MDB-RS), Flávia Arruda (PL-DF, ministra da Secretaria de governo Bolsonaro) e mais 23 deputados do PL, partido ao qual Bolsonaro quase se filiou recentemente.
Também estão lá Kim Kataguiri (DEM-SP, ex-relator do PL do Licenciamento Ambiental) e mais 13 representantes do DEM, a tropa de choque bolsonarista de partidos como PP (24 deputados), Republicanos (19 deputados), PSL (oito deputados) e PSC (cinco deputados) e 23 deputados do PT.
Senadores
Entre os senadores da frente, estão parlamentares de Mato Grosso, Roraima, Santa Catarina e Pará. Todos os 27 estados da federação têm representantes.
Apesar de algumas divergências pontuais, Bolsonaro, o Ministério de Minas e Energia (MME) e a Agência Nacional de Mineração (ANM) ouvem com frequência a FPM.
Procurado pela reportagem, Izar afirmou que não iria comentar a sua atuação na liderança dos deputados que defendem a mineração por "estar sofrendo pressão dos grupos em defesa dos animais", tema com o qual tem maior proximidade.
O Observatório da Mineração também procurou diversos outros deputados e senadores signatários da FPM. Nenhum quis comentar a sua participação na coalizão nem dizer o pensa sobre temas chave para o setor. Mas é possível entender esse último ponto analisando as pautas que a frente defende.
Lobby envolve grandes empresas e a CNI
Também está na FPM o deputado Alexis Fonteyne (Novo-SP), presidente da Frente Parlamentar pelo Brasil Competitivo.
Recém-criada, ela é apoiada por lobistas de dezenas de empresas de grande porte, representadas pelo Movimento Brasil Competitivo. O grupo já pediu uma série de medidas controversas ao Ibama, via o ministro Paulo Guedes, criticadas por mais de 30 organizações da sociedade civil.
Em nota enviada ao Observatório da Mineração, o MBC diz que não participou da "elaboração ou debate das proposições citadas em ofício do Ministério da Economia".
A Frente Parlamentar pelo Brasil Competitivo é apoiada pela CNI (Confederação Nacional da Indústria). Ricardo Izar e Joaquim Passarinho (PSD-PA), outro membro da FPM, participaram de reunião no Conselho de Mineração da CNI em que estiveram também representantes do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) do governo federal e da ANM.
Izar ressaltou, na ocasião, o quanto a mineração é um setor estratégico para o Brasil, destacando a fabricação de fertilizantes. A ligação entre mineração e agronegócio é direta. Grandes multinacionais que atuam no Brasil, como a americana Mosaic Fertilizantes, vão "da mina ao campo". No caminho, há conflitos com agricultores em Minas Gerais e em Goiás.
"Temos, na mineração, uma imagem muito ruim, como algo que degrada o meio ambiente. Mas a gente sabe que não é isso. Temos que mostrar que a mineração pode ser feita de maneira sustentável", disse Izar na ocasião.
Joaquim Passarinho, segundo dados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), recebeu R$ 100 mil da Vale Manganês, subsidiária da Vale, nas eleições de 2014. A empresa foi a maior doadora individual da campanha do deputado, que se elegeu pela primeira vez naquela oportunidade. A doação foi legal.
Passarinho tem trabalhado para defender os interesses de garimpeiros, inclusive propondo um projeto de lei que autoriza empresas a comprar ouro diretamente de áreas de garimpo.
O deputado paraense é um dos líderes das discussões em comissões da Câmara que têm o objetivo de transformar os garimpos em empresas legalizadas. Procurado, Passarinho não respondeu aos pedidos de entrevista para esta reportagem.
A frente parlamentar mantém interlocução frequente com Sandro Mabel, presidente da Fieg (Federação das Indústrias do Estado de Goiás), e com diversas associações do setor mineral. Elas foram consultadas pelo governo Bolsonaro para a definição das metas do Programa Mineração e Desenvolvimento (PMD), que está no centro da política mineral do Brasil hoje, conforme revelou o Observatório da Mineração.
Instituto representa a frente em todas as instâncias
A FPM é representada pelo Instituto do Desenvolvimento da Mineração —IDM Brasil, fundado em 2017. O IDM afirma que tem um acordo de cooperação para apoiar a FPM em todas as pautas no Congresso e se apresenta como "um dos principais interlocutores entre mineradoras e parlamentares do Brasil".
Wagner Pinheiro, presidente do IDM e principal porta-voz do grupo, foi diretor de Planejamento e Desenvolvimento da Mineração do antigo DNPM (Departamento Nacional de Produção Mineração), atual ANM, de 2015 a 2018.
Pinheiro também foi chefe de gabinete parlamentar por 20 anos em Brasília, atuando como assessor principalmente de José Janene (PP-PR), líder do PP na época do mensalão. Pinheiro foi ainda chefe de gabinete de André Vargas (PT-PR), primeiro político condenado na Lava Jato, e de Ibrahim Abi-Ackel (PP-MG). Jair Bolsonaro passou dez anos no PP, que tem 24 deputados na FPM.
Em entrevista, Pinheiro afirma que não existe um critério claro nos leilões de novas áreas feitos pela ANM e que a política mineral do governo Bolsonaro é confusa. Segundo o presidente do IDM, a mineração está muito concentrada na mão de grandes mineradoras, e as pequenas e médias empresas "não tem incentivo".
No caso do garimpo, por exemplo, Pinheiro defende que o processo minerário, o registro de cada exploração mineral feito junto à ANM, possa correr paralelamente ao licenciamento ambiental. E esta já foi uma das mudanças recentes feitas pela ANM, a partir de uma parceria em curso com a OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico). Isso, diz acreditar, deve acontecer de forma independente.
"O processo ambiental derruba o direito minerário, que não tem nada a ver com isso. O certo é o processo minerário correr, mas não pode ser uma ferramenta de negociação. É o cara derrubar o teu direito minerário para o outro chegar e pegar", diz Pinheiro.
O presidente do IDM diz que os grandes mineradores já são fortes e consolidados, mas a realidade é diferente para os outros, que não conseguem competir. "O médio minerador não consegue chegar a Brasília, não tem recursos, não tem apoio de nada. Ele sofre no modelo de exploração atual. A ANM deveria ser o principal braço de orientação, e não uma espécie de feitor", diz Pinheiro.
A campanha pelos mineradores de porte inferior às grandes empresas é uma pauta cara à frente parlamentar e encontra eco no discurso do recém-nomeado diretor da ANM, Ronaldo da Silva Lima, ex-secretário de Meio Ambiente do Pará.
Além das pautas nacionais, cada deputado líder da FPM tem defendido os interesses dos próprios estados na mineração, em especial Paraná, Santa Catarina, Minas Gerais, Espírito Santo, Pará e Rio Grande do Sul.
Novo Código de Mineração está nas mãos de deputados da FPM
Em 2019, um dos primeiros movimentos do IDM foi realizar uma reunião em Belo Horizonte "para debater a mineração no Estado e no Brasil antes da criação do novo Código de Mineração" e para empossar o seu diretor em Minas, Pablito Cesar, que ocupou o cargo de superintendente do DNPM, atual ANM, em Minas Gerais.
Participaram do encontro cerca de 60 empresários do setor mineral de todas as regiões do Estado, incluindo mineradores de ouro, diamante, bauxita e minério de ferro. Também estiveram na reunião a deputada federal Greyce Elias (Avante-MG), da FPM, e o ex-deputado federal Leonardo Quintão.
Como relator, Quintão liderou as tratativas para a reforma do Código de Mineração durante os governos Dilma Rousseff e Michel Temer. A maior parte da campanha de Quintão em 2014 foi financiada por mineradoras. Este também foi o caso da maioria dos deputados que participaram das discussões do novo código, que não foi adiante.
Atualmente, Greyce Elias é a relatora do Grupo de Trabalho que está definindo as regras para a mudança do Código de Mineração do Brasil. Elias também não respondeu aos pedidos de entrevista.
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