Para economistas, auxílio permanente de R$ 400 desrespeita lei de gastos
Resumo da notícia
- Economistas dizem que PEC dos Precatórios desrespeita ou dribla Lei de Responsabilidade Fiscal
- Tornar permanente Auxílio Brasil de R$ 400 sem ter fonte de recursos constante é ilegal, aponta economista
- Mesmo entre especialistas que não consideram proposta ilegal, avaliação é a de que PEC dos precatórios enfraquece teto de gastos
O líder do governo e relator da PEC dos Precatórios no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), propôs tornar permanente o Auxílio Brasil, no valor de R$ 400. Segundo economistas ouvidos pelo UOL, isso desrespeita a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) ou pelo menos enfraquece as regras de gastos públicos, furando o teto de gastos. As manobras podem ser questionadas na Justiça.
Para quem considera ilegal o texto da PEC dos Precatórios apresentado na quarta-feira (24) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, o problema é que o Auxílio Brasil de R$ 400 cria uma nova despesa permanente sem apresentar a fonte de recursos que vai bancar esse novo gasto.
"A PEC dos Precatórios fere o artigo 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal, segundo a qual uma despesa permanente precisa ter receita também permanente", afirma Juliana Damasceno, economista sênior da Tendências Consultoria e pesquisadora associada do Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getulio Vargas (FGV/Ibre).
Segundo Juliana, especialista em finanças públicas, tributação, federalismo fiscal e gasto público, a PEC dos Precatórios abre espaço no Orçamento do governo apenas em 2022 e, ainda assim, por meio de artifícios —como rolar para frente o pagamento de precatórios que deveriam ser quitados ano que vem, e mudar a forma de correção do teto de gastos.
Abrir espaço no Orçamento com PEC de Precatórios para uma despesa que será permanente não significa que haverá recursos depois de 2022. Para mim, essa PEC desrespeita a LRF".
Juliana Damasceno
Manobra para driblar o teto
Mesmo para economistas que não consideram a PEC dos Precatórios um caso concreto de desrespeito à Lei de Responsabilidade Fiscal, a proposta representa uma "manobra" questionável, que cria insegurança jurídica e dúvidas sobre o compromisso desse governo com as regras de gastos públicos.
Para o economista e professor da Universidade Federal de Pernambuco, Rafael da Silva Vasconcelos, o texto apresentado pelo senador Fernando Bezerra não demonstra qual será o aumento de receitas tributárias ou cortes de gastos do governo para bancar a nova despesa do Auxílio Brasil permanente de R$ 400. Em vez disso, diz, a PEC segue dependendo da rolagem dos precatórios e da elevação do teto de gastos graças à correção do limite determinada pela inflação.
Segundo Vasconcelos, doutor em Economia pela FGV, a lei não está sendo ferida porque o Orçamento federal será definido mais adiante, antes de cada ano fiscal, quando então o governo terá - aí sim - que apresentar as fontes de receitas para bancar o auxílio.
Quando a inflação diminuir, o espaço fiscal criado para pagar o auxílio deve se extinguir. É uma manobra, verdade, mas que a meu ver não fere neste momento a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Rafael da Silva Vasconcelos
A economista Vilma da Conceição Pinto, diretora da IFI (Instituição Fiscal Independente), órgão de análise de contas públicas vinculado ao Senado, concorda que o texto apresentado no Senado se apoia em mecanismos que buscam fugir da aplicação das regras da LRF.
Mas é preciso aguardar os próximos passos para avaliar o texto depois de eventuais emendas, dado que hoje foi pedida vista coletiva na CCJ.
Vilma da Conceição Pinto
Judicialização
A manobra do governo é usar a limitação no pagamento dos precatórios para criar a sobra no Orçamento e assim bancar o Auxílio Brasil, concorda a advogada Tatiana Chiaradia, sócia do escritório Candido Martins Advogados. "Com relação à LRF, desde que tenha essa sobra no Orçamento a cada ano para fazer frente às novas despesas, acredito que não haveria afronta à lei", afirma Tatiana.
Mas ela diz que o texto apresentado pelo senador Bezerra, se aprovado, vai criar judicialização quase imediatamente porque a proposta atinge os precatórios já emitidos neste ano com pagamento previsto para 2022.
Quem teve o precatório emitido antes da publicação da lei vai questionar o direito adquirido. Isso vai parar no STF (Supremo Tribunal Federal).
Tatiana Chiaradia
Bolsonaro nega que PEC desrespeite lei
Questionado por jornalistas em Brasília, após visita ao Congresso, o presidente Bolsonaro negou que o texto apresentado por Bezerra descumpra a Lei de Responsabilidade Fiscal, por não indicar a fonte dos recursos do auxílio permanente de R$ 400.
"Quem está acusando é aquele que falou que é inadmissível o povo estar pegando osso para comer. Quando a gente quer buscar uma maneira de atender, acusam disso [de desrespeitar a lei]. Não está fora de responsabilidade nenhuma, zero", disse Bolsonaro.
Votação no Senado
O relator da PEC dos Precatórios no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), deu parecer favorável pela constitucionalidade, juridicidade e regimentalidade da proposta que chegou ao Senado após ser aprovada na Câmara dos Deputados, mas propôs mudanças ao texto original.
Foram mantidos o limite para o pagamento de precatórios e a nova regra de cálculo do teto de gastos a partir do próximo ano. Mas o Auxílio Brasil, programa anunciado pelo governo do presidente Jair Bolsonaro para substituir o Bolsa Família, passa a ser permanente e não transitório - uma das mudanças propostas por Bezerra.
O texto aprovado na Câmara dos Deputados e mantido pelo senador abre espaço no teto de gastos em R$ 106,1 bilhões para aumento de despesas, mas apenas em 2022, ano de eleição para presidente.
Os senadores vão ter até terça-feira da semana que vem (30) para analisar a versão da PEC dos Precatórios apresentada pelo relator, quando então o texto será votado.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.